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quarta-feira, maio 22, 2013

Histórias do Futebol em Portugal (13)... Nau de Belém chega à terra prometida

Depois de em 1926 ter estado muito perto de lá atracar, a nau de Belém alcançou um ano mais tarde a terra prometida do futebol português. Fundado precisamente oito anos antes (1919) por Artur José Pereira o Belenenses conquistava em 1927 o primeiro grande título de uma história que nas décadas seguintes haveria de ter (outros) inúmeros momentos de glória, os quais haveriam de fazer deste um dos mais populares e laureados emblemas de Portugal. Clube de Futebol "Os Belenenses" que levou então para casa o título de campeão de Portugal num ano (1927) em que aquela que já era a mais importante e querida competição lusitana conheceu profundas remodelações. O certame foi avolumado, isto é, alargado a mais clubes que não os campeões regionais. Inspirados no sucesso da FA Cup inglesa um trio de ilustres figuras do futebol (e do jornalismo desportivo) português daquele tempo, nomeadamente Ribeiro dos Reis, Ricardo Ornelas, e Cândido de Oliveira, propuseram então que mais clubes pudessem competir no Campeonato de Portugal, constituindo para isso uma comissão que traçou o novo regulamento da prova. Regulamento esse que propunha a edificação de um Torneio de Classificação a anteceder o campeonato, torneio esse dividido em 14 grupos espalhados um pouco por todo o país, sendo que os vencedores desses grupos iriam juntar-se a 15 clubes isentos - isenção que era concedida em face da classificação obtida por esses clubes no seio das respetivas associações distritais - e com lugar desde logo garantido na 6ª edição do Campeonato de Portugal. Nestes moldes um dado estava desde logo garantido: a prova nacional iria ter mais jogos, mais cidades envolvidas, e desde logo mais emoção. E assim foi.
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) - que assim passou a chamar-se desde 28 de maio de 1926, deixando para trás a designação de União Portuguesa de Futebol - deu luz verde à ideia dos três jornalistas/dirigentes desportivos e o campeonato arrancou a 6 de março de 1927.
Porém, falar do certame ganho pelo Belenenses obriga também a evocar a palavra polémica. Mais uma vez assistiu-se a uma dura batalha da guerra norte-sul... como iremos recordar lá mais para a frente desta viagem ao passado.

Sob a arbitragem de José Simões, os lisboetas do Império - estreantes na competição, fruto de terem sido um dos 14 vencedores dos grupos do Torneio de Classificação - esmagaram diante do seu público os alentejanos do Luso Beja, por 4-0. Este encontro foi disputado no Campo da Palhavã, recinto que neste mesmo dia assistiu a uma segunda partida da 1ª eliminatória do Campeonato de Portugal de 1927, entre o estreante Barreirense e o campeão de Portugal de 1924, o Olhanense. Barreirenses que foram uma das grandes surpresas do certame, ao apresentarem um futebol alegre e vistoso ministrado por um mestre da tática que havia feito furor num passado recente nos então retângulos lusos de terra batida. Augusto Sabbo, engenheiro luso-alemão profundo entendido dos meandros do belo jogo que em 1923 havia conduzido o Sporting à vitória final do Campeonato de Portugal, mas que problemas financeiros leoninos desviaram em meados de 1926 para o Barreiro, onde reunindo um grupo de operários construiu uma das mais belas equipas da história do emblema da margem sul do Tejo.

Voltando ao duelo entre Barreirense e Olhanense o que se assistiu na Palhavã foi um verdadeiro espetáculo de futebol ofensivo, de parte a parte, com os pupilos de Sabbo a levarem a melhor por 9-4! No plano individual deste hino de ataque às balizas destaque para o olhanense José Belo - um dos artistas do título nacional de 24 - que à sua conta apontou os quatro tentos da sua equipa, e para os operários do Barreiro José Correia, e João Pireza, respetivamente autores de quatro e três dos nove tentos barreirenses.
Mais a norte, em Viana do Castelo, o Campo de Monserrate chorou ao ver os portuenses do Progresso saírem da Princesa do Lima com um magro triunfo de 1-0 no bolso sobre o combinado local, o experiente - nestas andanças - Vianense.
Em Braga, no Campo do Raio, dois estreantes mediram forças, o Boavista e o Clube Galitos (de Aveiro). Fizeram a festa os portuenses graças a um triunfo por três golos sem resposta, com José Rodrigues Chelas a vestir o fato de herói após apontar dois tentos.
Outro histórico emblema da cidade do Porto participou pela primeira vez na mais popular competição nacional, de seu nome Sport Comércio e Salgueiros. A jogar em casa (Campo do Covelo) os salgueiristas golearam o representante da Associação de Vila Real, o Sport Clube Vila Real, por 4-0. Arbitrado pelo guarda-redes do Boavista (!), Manuel Sousa, conhecido no planeta da bola por Casoto, o Salgueiros entrou praticamente a vencer no encontro, quando à passagem do minuto três Fontes deu colorido ao marcador. Na segunda parte brilhou a grande altura Reis, autor dos restantes três golos da tarde (aos 55, 60, e 90m).
No Campo da Quinta Agrícola, em Coimbra, a Briosa - popular alcunha pela qual é conhecida a Académica coimbrã - despachou o Sporting de Espinho por 3-1, com a particularidade de dois dos três tentos academistas terem sido apontados por Albano Paulo, o homem que em 1939 iria conduzir - na condição de treinador - a Académica à vitória na edição de estreia da prova sucessora deste Campeonato de Portugal, a Taça de Portugal.

Pior sorte teve a outra equipa de Coimbra, o União, que em Lisboa saiu da prova vergado a uma pesada derrota aos pés do Casa Pia, por 5-0, tendo Gustavo Teixeira apontado quatro golos! E no Porto o popular Leixões também dava os primeiros passos no Campeonato de Portugal. No (campo do) Covelo os matosinhenses enfrentavam o Sporting de Braga, um habitual combatente nestas frentes, conjunto que levaria para a capital minhota um saboroso triunfo por 3-0, construido durante a etapa inicial, com golos de Cruz (aos cinco minutos) e Gumercindo (aos 20 e aos 42m). E por falar nas cidades de Braga e do Porto dois outros combinados oriundos destas urbes mediram forças entre si nesta ronda inicial. FC Porto e Estrela de Braga, assim se chamavam, tendo os portistas vencido com naturalidade os bracarenses por 11-0! Naturalidade porque a diferença - a diversos níveis - entre ambos os conjuntos era abismal.

No entanto a goleada mais dilatada desta 1ª eliminatória foi alcançada por outra das equipas sensação da prova, o Vitória de Setúbal, o surpreendente campeão regional de Lisboa (!) deste ano de 1927. No Campo dos Arcos (em Setúbal) os sadinos afastaram o Despertar Sport Clube de Beja por expressivos 12-0 (!), sim, uma dúzia de golos, cinco deles apontados por uma das estrelas do combinado orientado pelo inglês Arthur John, de sua graça Octávio Cambalacho.
E em Portalegre entrava em campo um leão financeiramente... moribundo. O gigante Sporting Clube de Portugal passava por uma crise financeira aguda, que - entre outros aspetos - levou à saída do treinador campeão Augusto Sabbo rumo ao Barreirense. A razão desta surpreendente dispensa alude ao elevado ordenado que Sabbo usufruia em Lisboa, 12 contos, que segundo a Direção leonina era incompatível com as finanças de um clube cujo orçamento era de 29 contos. Mesmo debilitado financeiramente o leão - agora treinado pelo seu carismático capitão Jorge Vieira - era ainda aguerrido no plano desportivo, conforme explica o resultado de 7-1 a seu favor sobre o SC Portalegre.
No derradeiro encontro desta eliminatória o futuro campeão entrou em campo. E fê-lo em Santarém, diante dos Leões locais, que por sua vez não tiveram armas para contrariar a superioridade da equipa-maravilha criada por Artur José Pereira, o fundador do clube e agora seu treinador, e onde pontificavam lendas como Eduardo Azevedo, César Matos, Augusto Silva, e um tal de Pepe. No Campo de São Lázaro um festival de futebol de ataque originou um triunfo merecido dos rapazes de Belém, por 9-1. Estava dado o primeiro passo de uma caminhada que iria ser triunfal.

Estreia do Benfica

Concluída a 1ª eliminatória a prova rumou aos oitavos-de-final, que tiveram a sua entrada em cena a 3 de abril. Dia em que entrou em ação o popular Benfica, um dos clubes mais afamados da capital, que fazia a sua estreia na competição. Treinados pelo lendário Ribeiro dos Reis - homem dos 7 ofícios dentro do futebol - os benfiquistas reuniram um bom grupo para atacar o campeonato, e levar o troféu de campeão para o... Montepio Geral! É verdade. Não tendo ainda um espaço para guardar os troféus conquistados os benfiquistas guardavam as suas relíquias no banco Montepio Geral! Outros tempos. No que concerne a nomes sonantes o Benfica de 1927 tinha vários, desde Mário Carvalho, passando por Ralph Bailão, até Raul Tamanqueiro, a grande estrela do Olhanense campeão de Portugal em 1924. No Campo do Raio, em Braga, o Benfica de Tamanqueiro e companhia sofreu a bom sofrer para vencer o Sporting local por 4-3, com os tentos benfiquistas a pertencerem a Pereira Nunes, António Gonçalves, Vítor Hugo, e José Simões.

E foi precisamente nos oitavos-de-final que a polémica vistou o Campeonato de Portugal, envolvendo, curiosamente, dois clubes da cidade do Porto. O primeiro caso aconteceu no Covelo, onde o Salgueiros bateu com a porta após graves erros do árbitro Ramon Folch (de Viana do Castelo) no encontro diante do Vitória de Setúbal. O duelo terminou com o triunfo sadino por 2-0 - golos de Octávio Cambalacho e Soares - mas iria ser mandado repetir após ter-se concluído que o árbitro prejudicou seriamente os salgueiristas. Estes, em forma de protesto, decidiram não comparecer no segundo encontro, pelo que a FPF não teve outro remédio senão atribuir a passagem de eliminatória ao Vitória. A guerra norte-sul, que havia despoletado logo na primeira edição da prova, conhecia aqui mais uma ardente batalha, com os nortenhos a queixarem-se de descriminação em relação aos sulistas.
Mas os combates entre o norte e o sul não se resumiram ao Salgueiros - Vitória de Setúbal. Muito longe disso. A grande polémica do campeonato envolveu o FC Porto e o Belenenses, equipas que se defrontaram no Campo da Palhavã nesta eliminatória, um jogo que para muitos era digno de uma final antecipada. Arbitrado pelo juíz da Associação de Futebol de Beja Doroteo Flecha Rodrigues, o jogo começou de feição aos portistas, que sem se deixarem impressionar pelo ambiente - mais uma vez - hostil que encontraram na capital rapidamente chegaram ao 2-0, com golos de Acácio Mesquita e de um tal de Fridolf Resberg. Último jogador este de nacionalidade norueguesa, e que viera para Portugal para abraçar a carreira de diplomata no Consulado da Noruega no Porto. Reza a lenda que Resberg certo dia passou pelo Campo da Constituição, apresentou-se ao treinador Akos Teszler e pediu para treinar com o clube. Pedido aceite Resberg convenceu os responsáveis azuis-e-brancos, que rapidamente o colocaram na frente de ataque da sua equipa principal, onde fez furor durante algum tempo, até ser chamado de volta para a sua longínqua e gélida Noruega.


Mas voltando aos (tristes) acontecimentos da Palhavã o diabólico Pepe pôs a cabeça em água aos defesas portistas, ao fazer dois golos. Um deles deu mesmo o triunfo ao Belenenses (3-2), uma vitória muito protestada pelos portistas que se queixaram da atuação tendenciosa do árbitro alentejano. Triunfo belenense que só foi alcançado no prolongamento depois de um 2-2 no final do tempo regulamentar. Tento do empate dos rapazes de Belém que surgiu em cima do minuto 90... em claro fora de jogo. Assim evocaram os responsáveis do FC Porto. O árbitro fez vista grossa e surgiu a necessidade de mais 30 minutos de batalha. Não satisfeito com esta pequena ajuda - na voz dos portistas - o árbitro decidiu aplicar o mesmo critério no golo da vitória lisboeta, apontado por Pepe... mais uma vez em nítido fora de jogo. Doroteo Flecha Rodrigues admitiu no final da partida ter errado a favor dos azuis de Belém no que diz respeito a este último tento!
Porém, em resposta às críticas do Porto as gentes de Lisboa - com FPF à cabeça - acusaram o clube nortenho de não cumprir os regulamentos, já que se havia apresentado em campo com três atletas estrangeiros (Mihaly Siska, Norman Hall, e Fridolf Resberg) quando a lei dizia que apenas podiam ser utilizados dois.

Os portistas não calaram a sua revolta e logo após a eliminação tornavam pública carta feroz, a qual dizia o seguinte: «Este campeonato serviu apenas para demonstrar as competências tacanhas a quem o futebol português está entregue. Segundo o seu regulamento nenhum grupo pode alinhar com mais de dois jogadores estrangeiros, mas como entendêssemos que o senhor Norman Hall é moralmente um jogador português, fizemos por intermédio da nossa associação uma exposição à FPF, citando que Norman Hall há 15 anos vem disputando pelo nosso clube os campeonatos do norte e tem sido incluído no grupo representativo da cidade desde 1918, isto é, muito antes da formação da FPF, acrescendo ainda a circunstância de residir em Portugal desde a idade de oito anos. Esta exposição, apreciada e discutida numa reunião do Comité Executivo do Campeonato de Portugal, teve resolução favorável, sendo qualificado o referido senhor Norman Hall como jogador português. Depois de termos jogado e vencido o Estrela de Braga, fomos indicados adversários do Belenenses, para os oitavos-de-final, a realizar em Lisboa. Alinhámos com Norman Hall e depois de uma exibição superior ao nosso adversário e em que o resultado deveria ser de dois golos a um, a nosso favor, o árbitro. senhor Flecha, de Beja, conseguiu, no final do tempo regulamentar, um empate a 2-2. Jogada a meia hora do desempate, fomos mais uma vez prejudicados com uma bola "off-side", que deu o resultado de 3-2 a favor do Belenenses. A arbitragem deste desafio levou-nos a um protesto junto da FPF, protesto que foi acompanhado de 500 escudos e sobre o qual a mesma federação até hoje nenhuma resposta deu, parecendo-nos que nenhuma resolução tomou, visto reconhecer que teria de anular o jogo, em face das declarações do árbitro, que involuntariamente nos tinha tirado uma vitória bem justa». 
Da FPF veio resposta a dizer simplesmente que o FC Porto não havia cumprido a lei ao alinhar com três estrangeiros. Sobre os 500 escudos nem uma palavra!!! E ponto final.

Alguns quarteirões mais à frente, isto é, no Campo Grande, o Sporting Clube de Portugal, do jogador/treinador Jorge Vieira, humilhava a Académica de Coimbra por 9-1, com destaque para os cinco golos de Filipe dos Santos. Mais a norte, no Porto, o Barreirense de Augusto Sabbo continuava a sua caminhada triunfal, sendo que desta feita a vítima deu pelo nome de Boavista Futebol Clube, clube este que no seu reduto - Campo do Bessa - perdeu por 0-2.
A 24 de abril disputou-se no Campo Grande o derradeiro desafio destes oitavos-de-final, o qual colocou frente a frente o Carcavelinhos ao Casa Pia, tendo vencido os primeiros por 3-1. Isento desta eliminatória ficou o detentor do título de campeão de Portugal e crónico campeão da Madeira, o Clube Sport Marítimo.

Campeões em título provam do próprio veneno


E por falar em Marítimo quis o destino que a defesa do título tivesse início com uma reedição da final do ano anterior, ante o Belenenses, que recorde-se, havia sido derrotado pelos madeirenses no Campo do Ameal por 0-2. Este reencontro foi digamos que uma vingança dos pupilos de Artur José Pereira, que diante do seu público, que lotou por completo o Campo do Lumiar, esmagou os campeões da Madeira e de Portugal por claros 8-1! Deram cor à goleada azul Silva Marques (3 golos), Pepe (2), Alfredo Ramos (2), e Augusto Silva. Este jogo fez ainda com que o Marítimo provasse do próprio veneno dado ao FC Porto um ano antes, quando nas meias-finais humilhou os portistas por 7-1. Desta feita foram os madeirenses a saborear uma amarga e pesada derrota!
Nas Amoreiras o Vitória de Setúbal ultrapassava mais um duro obstáculo rumo à final que iria alcançar muito justamente. O Sporting foi um osso duro de roer, mas Octávio Cambalacho, mais uma vez, fez estoirar a festa à beira do (rio) Sado graças a um único golo que derrotou os aparentemente falidos mas aguerridos leões.
Quanto ao eterno rival do Sporting, o Benfica, beneficiou de uma tarde verdadeiramente inspirada do seu avançado Jorge Tavares, autor de três dos cinco golos com que os pupilos de Ribeiro dos Reis afastaram os operários do Carcavelinhos. Por último, o Barreirense, que afastou o Império por 3-1.


Nova polémica nas meias-finais!

Como não há duas sem três polémica voltou a gritar-se a viva voz nas meias-finais do campeonato, disputadas no dia 15 de maio. Ambos os jogos realizaram-se no Campo do Lumiar, em Lisboa, sendo que no primeiro confronto o Vitória de Setubal garantiu o passaporte para a final num encontro que só durou 44 minutos! Aníbal José fez o único golo do jogo a favor dos sadinos, que na voz do treinador barreirense, Augusto Sabbo, usaram e abusaram das entradas duras. Comportamento violento a juntar ao aparente golo irregular dos setubalenses ao cair do pano sobre a primeira parte que fez com que Sabbo ao minuto 44 ordenasse que os seus pupilos abandonassem o terreno de jogo em sinal de protesto, pelo que o árbitro lisboeta Ilídio Nogueira não teve outra hipótese senão dar por terminada a partida nomear os sadinos como os primeiros finalistas do campeonato. Horas mais tarde foi a vez do Belenenses assegurar a presença no jogo mais desejado do ano. No entanto, para o conseguir os pupilos de Artur José Pereira tiveram de sofrer a bom sofrer para eliminar um combativo Benfica. Com uma igualdade a zero golos no final dos 90 minutos o árbitro Silvestre Rosmaninho viu-se na necessidade de indicar mais 30 minutos de prolongamento, sendo que aqui, os azuis de Belém levariam a melhor, com golos de Silva Marques (minuto 102) e Pepe (minuto 115). 

Belenenses é o novo rei do futebol português em véspera de Santo António!


E foi precisamente no Lumiar que praticamente um mês depois foi disputada a grande final. Jogo decisivo que foi realizado a 12 de junho, a véspera da mais importante festa popular da capital portuguesa, Santo António, a quem - por certo - ambos os intervenientes terão solicitado ajuda divina na entrada para o retângulo de jogo. Tarde ventosa brindava a capital em dia de festa, e seria precisamente o vento um aliado - e um inimigo também - para os dois conjuntos envolvidos na final. Durante o primeiro tempo foi o Vitória de Setúbal a beneficiar da ajuda do vento, embora sem tirar proveito desse fator. Com um futebol apoiado, de passes curtos e desmarcações rápidas, os sadinos foram uma dor de cabeça para o guarda-redes belenense Francisco Assis na etapa inicial. João Santos foi o principal protagonista dos assaltos à baliza azul, desperdiçando de forma incrível - dizem as crónicas da época - um golo feito aos 27 minutos. E como quem não marca por norma sofre o Belenenses - agora jogando com o vento a seu favor - dominou por completo a segunda parte, domínio esse traduzido em golos. O primeiro surgiu por Augusto Silva, aos 63 minutos, a aproveitar da melhor maneira um cruzamento de César Matos, sendo que a machadada final foi dada na entrada para os derradeiros cinco minutos da contenda, graças a um bis de Silva Marques (aos 86 e aos 89 minutos).
O futebol cintilante do Belenenses era assim premiado com o ambicionado título de campeão de Portugal. Era caso para dizer que essa noite de Santo António iria ser duplamente festejada pelos apaixonados adeptos belenenses que na tarde de 12 de junho de 1927 lotaram por completo o Lumiar.

A figura: Pepe


Se tivessemos de escolher os 10 melhores futebolistas portugueses da primeira metade do século XX o seu nome inevitavelmente estaria lá. José Manuel Soares, eternizado no planeta da bola como Pepe, foi a grande figura do Campeonato de Portugal de 1927. A sua genialidade criativa e técnica ficaram bem patentes na caminhada triunfal do Belenenses. Sobre ele já traçámos noutras viagens ao passado longas linhas, e a sua memória repousa na vitrina das lendas deste Museu Virtual do Futebol. Aproveitando a vitória do Clube de Futebol "Os Belenenses" na principal prova portuguesa repescamos para este texto algumas das linhas biográficas por nós desenhadas aquando dessa visita a um menino que morreu cedo demais!
Ele foi um dos primeiros génios do futebol português como consequência natural da sua veia artística com a bola. Cedo se tornou num ídolo para a massa adepta lusitana que ia tendo o primeiro contacto com o belo jogo. Com dribles diabolicamente desconcertantes, com passes magistrais, ou com golos inimagináveis ele ganhou por direito próprio um lugar no Olimpo dos Deuses do futebol. A 30 de janeiro de 1908 no seio de uma família pobre de Belém (Lisboa) nasce aquele que viria a ser um dos maiores ídolos do futebol português na década de 20 do século passado.

A infância de José Manuel Soares foi pois de profunda miséria, sendo que a única alegria dos meninos daquele tempo era única e simplesmente a bola de futebol. E foi a jogar futebol na rua com uma bola de trapos que Pepe – alcunha que surgiu numa época em que a sua condição no desporto rei era já a de um talento confirmado – descobriu a sua vocação. Como tal ainda com tenra idade ingressa no clube da sua zona, o Belenenses, o emblema gravado no seu coração, sendo que com apenas 15 anos (!) é inscrito no Campeonato de Lisboa.
Não demoraria muito a sua ascensão até à equipa principal, a qual se daria um ano depois (1926) num confronto ante o Benfica no Campo das Amoreiras, duelo que terminaria 5-4 a favor do Belenenses, tendo Pepe apontado o golo do triunfo do seu clube. A sua exímia técnica aliada à sua velocidade estonteante e ao seu poderoso remate patenteados dali em diante fizeram com que fosse aclamado como o rei do futebol português.

De um dia para o outro Pepe tornou-se na alegria do povo. Em Belém, a zona onde continuava a residir numa pobre casa situada na Rua do Embaixador, não havia um único dia em que o seu nome fosse pronunciado com entusismo e vaidade. Mesmo sendo por aquela altura o habitante mais famoso de Belém o menino Pepe continuava humilde e... pobre, sim, porque o futebol não passava de uma brincadeira. Para ajudar a sua família foi trabalhar ainda moço para uma oficina de torneiro, para mais tarde passar a laborar no Centro de Aviação Naval. De aspecto franzino o menino que todos os dias levava para o emprego um triste caldo para retemperar forças fazia magia nos campos de futebol em cada fim-de-semana com as cores do seu Belenenses. Carregou os azuis de Lisboa às costas nas conquistas dos campeonatos de Portugal de 1927 e 1929, bem como noutros tantos campeonatos de Lisboa. Entre 1928 e 1931 sagra-se naturalmente o melhor marcador do campeonato lisboeta, sendo que na temporada de 30/31 estabelece um recorde de 36 golos apontados em 14 encontros disputados! Para a história, nessa mesma época, faz 10 dos 12 golos com que o Belenenses bate o Bom Sucesso.



Ele foi um dos notáveis que integrou o selecionado português na primeira grande aparição deste numa competição à escala mundial: os Jogos Olímpicos. 1928 é o ano que assinala esse feito, ano em que Portugal fica às portas de uma medalha nas Olímpiadas de Amesterdão.
Mas nem só o Belenenses tirou partido do génio de Pepe, a própria seleção nacional também lhe fica a dever muitas vitórias e momentos inolvidáveis. Por 12 ocasiões ele vestiu a camisola das quinas, tendo com ela apontado sete golos.

Consagrado a nível nacional e internacional a estrela de Pepe deixou de brilhar cedo, cedo demais, diria mesmo. Num dia como tantos outros o astro de Belém carrega na fria manhã de 24 de outubro de 1931 o almoço preparado por sua mãe. Almoço é maneira de dizer, pois no bolso levava somente uma triste sande de chouriço que tinha sobrado do jantar da véspera. Chegada a pausa para o repasto Pepe leva o alimento à boca e horas depois é dado como morto no Hospital da Marinha, local para onde foi transportado assim que começou a sentir violentas dores abdominais e a ter hemorragias. Morreria às 10h30 da manhã, com apenas 23 anos... e um futuro – com toda a certeza – risonho ficou por percorrer.

As causas da morte muita tinta fizeram correr nos dias seguintes. Houve quem tivesse apontado ao assassinato... por invejosos do seu valor e popularidade. O envenenamento contudo não ficou senão a dever-se a um lapso – fatal – de sua mãe, a qual em vez de colocar bicarbonato de sódio na refeição colocou potassa, substância que iria destruir por completo o estômago do atleta. Mãe e irmãs de Pepe que também haviam ingerido igual refeição, no entanto conseguiram escapar com vida, aparentemente por terem ingerido uma menor quantidade.
Pepe morreu e o país chorou dias a fio. O seu funeral foi uma prova colossal do carinho que o povo tinha por ele... 30.000 pessoas prestare-lhe uma última homenagem.

Nomes e números do Campeonato de Portugal de 1927

1ª eliminatória

Império - Luso Beja: 4-0

Vianense - Progresso: 0-1

Barreirense - Olhanense: 9-4

Boavista - Galitos: 3-0

Salgueiros - Vila Real: 4-0

Vitória de Setúbal - Despertar: 12-0

Académica - Sp. Espinho: 3-1

SC Portalegre - Sporting: 1-7

Leixões - Braga: 0-3

Casa Pia - União de Coimbra: 5-0

Leões de Santarém - Belenenses: 1-9

Estrela de Braga - FC Porto: 0-11

Oitavos-de-final

Império - Progresso: 7-0

Boavista - Barreirense: 0-2

Salgueiros - Vitória de Setúbal: 0-2

Sporting - Académica: 9-1

Braga - Benfica: 3-4

Carcavelinhos - Casa Pia: 3-1

Belenenses - FC Porto: 3-2

Quartos-de-final

Barreirense - Império: 3-1

Vitória de Setúbal - Sporting: 1-0

Benfica - Carcavelinhos: 5-0

Belenenses - Marítimo: 8-1

Meias-finais

Vitória de Setúbal - Barreirense: 1-0

Belenenses - Benfica: 2-0

Final

Belenenses - Vitória de Setúbal: 3-0

Data: 12 de junho de 1927

Estádio: Campo do Lumiar, em Lisboa

Árbitro: João dos Santos Júnior (lLisboa)

Belenenses: Assis, Eduardo Azevedo, Júlio Marques, Joaquim Almeida, Augusto Silva, César Matos, Fernando António, Alfredo Ramos, Silva Marques, Pepe, e José Luís. Treinador: Artur José Pereira

Vitória de Setúbal: Artur Augusto, Francisco Silva, Isidoro Rufino, Augusto José, Aníbal José, Matias Carlos, Eduardo Augusto, João dos Santos, Octávio Cambalacho, Armando Martins, e Nazaré. Treinador: Arthur John

Golos: 1-0 (Augusto Silva, aos 63m), 2-0 (Silva Marques, aos 86m), 3-0 (Silva Marques, aos 89m)

Legenda das fotografias:
1-Belenenses, o campeão de Portugal em 1927
2-Lance do jogo entre Barreirense e Olhanense
3-João Pireza, uma das estrelas do Barreiro
4-Sporting de Braga
5-Octávio Cambalacho, o goleador do Vitória de Setúbal em 1927
6-Equipa do Benfica, que fez a estreia no Campeonato de Portugal
7-O norueguês do FC Porto, Fridolf Resberg
8-Pepe tenta bater o guarda-redes portista Siska
9-Norman Hall, o seu nome haveria de causar polémica neste campeonato
10-O treinador Augusto Sabbo
11-Fase do jogo entre Vitória de Setúbal e Sporting
12-Artur José Pereira
13-Primeira página do Eco dos Sports a noticiar o triunfo belenense na final
14-Pepe, a estrela de Belém...
15-...em ação...
16... e levado em ombros pela multidão

quarta-feira, janeiro 23, 2013

Histórias do Futebol em Portugal (11)... Bailinho da Madeira

Surpresa foi - indiscutivelmente - a palavra de ordem da 5ª edição do Campeonato de Portugal, ocorrida em 1926, na sequência do glorioso trajeto percorrido pelo Marítimo, o crónico campeão da Associação de Futebol da Madeira que mais do que vencer o título foi o responsável por uma das maiores humilhações da história do gigante FC Porto! Mas já lá iremos.
Esta edição fica ainda vincada pela acesa - e crescente - rivalidade entre as cidades do Porto e de Lisboa, rivalidade essa nem sempre bonita de se ver em espetáculos desportivos...
Campeonato de Portugal de 1926 que teve mais uma estreia em termos de aderentes, digamos assim, mais concretamente a Associação de Futebol de Vila Real, que se fez representar pelo seu campeão, o Sport Clube Vila Real. Equipa esta cuja sorte nada quis consigo, já que na 1ª eliminatória o azar bateu à porta dos vilarealenses ao colocar-lhes no caminho nada mais nada menos do que o campeão de Portugal em título, o poderoso FC Porto. No Campo do Covelo, a 5 de maio desse ano, os portistas esmagaram os transmontanos por 10-0 (!), sendo de destacar a veia goleadora do capitão de equipa Norman Hall, autor de oito tentos! Balbino da Silva encarregou-se de apontar os outros dois.
Nesse mesmo dia, mas em Lisboa, mediram forças no Campo Grande (recinto do Sporting) os campeões das associações de futebol de Aveiro e de Coimbra, respetivamente o Sporting de Espinho e o União de Coimbra, o vencedor surpresa do regional da cidade dos estudantes. Foi um duelo intenso e de vencedor incerto até bem perto do fim, onde os espinhenses estiveram grande parte do tempo em desvantagem no marcador, acabando, no entanto, já perto do fim, por dar a volta e vencer por 4-3.
Quanto ao Sporting de Braga o destino voltou a colocar-lhe no caminho o seu carrasco das duas edições anteriores, ou seja, o Vianense. Campeões de Viana do Castelo que em 1924 e 1925 haviam - curiosamente - então afastado os bracarenses na 1ª ronda da prova, só que há terceira veio a vingança dos homens da Cidade dos Arcebispos.Um golo solitário de Chelas selou a tal vingança bracarense sobre os vizinhos da Princesa do Lima, que desta forma superavam pela primeira vez a barreira da ronda inaugural.

Em Lisboa, e novamente no Campo Grande, assistiu-se a um dérbi alentejano, entre os campeões das associações de Portalegre e de Beja, respetivamente o Estrela e o Luso. Com arbitragem do lisboeta Ilídio Nogueira foi mais forte o conjunto do Baixo Alentejo, que graças a dois golos de Fausto e Martins avançava para os quartos-de-final.
Por último, entrou em campo o Belenenses, que poucas semanas havia angariado o direito de participar no Campeonato de Portugal em virtude da conquista do seu primeiro título de campeão da Associação de Futebol de Lisboa. Orientados tecnicamente pelo fundador do clube da Cruz de Cristo, Artur José Pereira, os jogadores belenenses não sentiram grandes dificuldades para afastar os Leões de Santarém, conforme traduz a expressiva vitória por 7-2, com destaque para os bis (dois golos) das grandes estrelas dos lisboetas daquela altura, Pepe e Rodolfo Faroleiro.

Belenenses que nos quartos-de-final, disputados no dia 16 de maio, voltou a mostrar o porquê de ter vencido com mérito o dificil Campeonato de Lisboa, onde superrou duros obstáculos, como por exemplo Sporting e Benfica! Não é para todos. Mas voltando ao Campeonato de Portugal, os azuis de Belém aplicaram uma nova goleada, desta feita ao Sporting de Espinho, que saiu do Campo Grande vergado a uma derrota de 1-4.
Mais a norte, no Porto, o crónico campeão local despachava o Sporting de Braga por 3-0, com golos de Balbino da Silva (dois) e Hall, o inglês que haveria de se sagrar o melhor marcador desta edição da prova. E por falar em campeões crónicos, em Setúbal (no Campo dos Arcos) entrou em campo o campeão do Algarve, o Olhanense - isento da 1ª eliminatória -, que iria golear por 5-0 o Luso Beja.

Marítimo humilha o FC Porto!

E chegavámos assim às meias-finais. Eliminatória esta onde de acordo com os regulamentos da União Portuguesa de Futebol (UPF) estava já o campeão da Madeira, o Marítimo, que tal como nas edições anteriores havia escapado às primeiras eliminatórias. Estranha foi a decisão do organismo que tutelava o futebol português em fazer com que o campeão da Associação de Futebol do Porto disputasse a sua meia final em Lisboa, e o campeão da associação da capital lutasse pelo acesso à final em terrenos portuenses! Sem se compreender esta caricata decisão da UPF o FC Porto lá teve de viajar para Lisboa para enfrentar o Marítimo... num ambiente para lá de hostil. No Campo Grande os portistas lutaram contra dois adversários, o conjunto oriundo da Madeira, e o público, afeto aos clubes da capital, que não se cansou de apupar e insultar os jogadores azuis-e-brancos ao longo da partida. Era visível o ódio de estimação que começava a crescer entre os adeptos dos clubes das duas maiores cidades do país, sendo que na memória dos lisboetas estava ainda bem fresca a final do Campeonato de Portugal de 1925, entre o FC Porto e o Sporting, último clube este que segundo a imprensa lisboeta - claro está - saíra prejudicado pela atuação do árbitro galego Rafael Nuñez.
Mas voltando ao duelo do Campo Grande - que estava cheio como um ovo - o que se assistiu ao longo de 90 minutos foi um autêntico vendaval madeirense! Quiçá afetados pela hostilidade do público local os portistas viveram uma tarde de pesadelo, um dos piores momentos da sua história, há que dizê-lo. Foram esmagados - a palavra mais simpática que encontramos para descrever os acontecimentos vividos naquela tarde - pelos madeirenses por 7-1! Sim, sete, e mais poderiam ter sido caso o melhor elementos dos desnorteados portistas não tivesse sido o seu lendário guarda-redes Mihaly Siska. Este resultado impensável causou delírio entre o público da capital, que festejou a vitória do Marítimo como se esta tivesse sido alcançada por um dos seus clubes de eleição.

A imprensa lisboeta também não perdeu - mais uma vez - a oportunidade de empolar este histórico acontecimento desportivo, ou melhor, a celébre tragédia portista. O Ecos do Sport - que deu grande destaque à partida - escrevia: «Esta é a verdade: Siska não foi batido só pelo ataque do Marítimo, mas, sobretudo, pela sua própria defesa. Siska foi o único no grupo do Porto que jogou. Ele teve, na realidade, um trabalho extenuante, porque os avançados da Madeira atiraram ao goal (baliza) quase quando e como quiseram. Assim desajudado qualquer guarda-redes sucumbia. A arbitragem de Ilídio Nogueira (de Lisboa) foi, quanto a nós, muito acertada, não se perturbando ante as ruidosas manifestações do público que, a todo o transe, queria fouls (faltas) contra o Porto».
Na cidade do Porto o resultado foi recebido com choque entre os adeptos do emblema azul-e-branco. Com a vergonha - diante de tamanha derrota - dezenas de sócios portistas rasgaram os seus cartões de associados, calcaram emblemas, queimaram bandeiras, e não pouparam críticas aos seus jogadores, dirigentes, e claro, ao treinador. O elo mais fraco acabou mesmo por ser o húngaro Akos Tezler, que um ano antes havia conduzido os portistas ao título de campeão de Portugal, acabando por ser despedido pouco depois desta trágica eliminatória, ao que parece por ter pedido um... aumento de ordenado após ter sido humilhado pelos rapazes da Madeira!
O rescaldo do jogo ante o Marítimo prolongou-se por mais alguns dias mais, tendo o presidente da Direção do clube da Invicta, Domingos Almeida Soares, saido a terreiro para não só lamentar tamanha derrota mas sobretudo para criticar a hostilidade com que o seu clube foi recebido em Lisboa, lamentando profundamente «a antipatia formidável que o sul mantém pelo norte».

Fundado no ano (1910) da implantação da República o Marítimo construía assim o momento mais sublime da sua ainda curta história de vida. Um momento presenciado por um jovem rapaz de 14 anos, que à socapa havia viajado incógnito no paquete Lima, o barco que transportou os madeirenses até ao continente. Vasco Nunes, o nome deste aventureiro de palmo e meio, que posteriormente contou à imprensa a sua recambulesca história. «Comprei um quilo de bolachas e uma garrafa de groga numa venda onde a minha mãe tem confiança, agarrei nos embrulhos e na trouxa, deitei a correr para o cais, meti-me numa lancha e fui para bordo, onde me escondi debaixo de um beliche. Já o barco tinha levantado ferro, senti-me agarrado pela grenha e pus-me a chorar. Era um criado, um malandro, que me bateu e levou ao comandante. Já o barco ia nas laturas de Porto Santo. Depois levaram-me para 3ª classe, onde os rapazes do Marítimo, sabendo do meu caso, me iam levar de comer. Quando chguei a Lisboa é que foi o diabo. Queríam entregar-me à polícia marítima e chegaram a meter-me no porão, onde tive medo de umas vacas muito grandes que lá estavam. Quem me salvou foi o José Ramos e o Domingos, o capitão do Marítimo. Foram ao comandante e pediram a minha liberdade, dizendo que se responsabilizavam por mim...». De pronto Vasco tornou-se na mascote da equipa, acompanhado de perto a caminhada gloriosa dos verde-rubros no campeonato, em cuja final encontraram os rapazes de Belém, que na meia-final haviam derrotado o Olhanense por uns curtos 2-1.

Final só durou 60 minutos!

A comitiva madeirense teve de fazer um esforço financeiro para permanecer no continente por mais duas semanas (!) até ao jogo da final. Jogo decisivo que a UPF agendou para o Porto, mais precisamente para o Campo do Ameal, propriedade do Progresso. Decisão que fez estalar o verniz entre jogadores e dirigentes belenenses. Cientes da intensa rivalidade entre Lisboa e Porto os homens da Cruz de Cristo receavam ser... mal recebidos na Invicta, e como tal protestaram o palco da final. A UPF fez ouvidos moucos e os belenenses lá foram contrariados para o Porto onde - tal como haviam previsto - foram recebidos com uma cruel hostilidade pelo público portuense. Adeptos estes que, esquecendo a humilhação que o Marítimo havia aplicado ao FC Porto semanas antes, tomaram partido do conjunto da Madeira do príncipio ao fim do jogo ocorrido a 6 de junho.
Os jogadores de Belém entraram no Ameal debaixo de um coro ruidoso de assobios e apupos, ambiente que desde logo os enervou, e condicionaria em grande parte do encontro. O portuense José Guimarães foi o árbitro de um jogo que até começou equilibrado, com luta intensa a meio campo. Com o avançar do relógio, e com os gritos de incentivo ao Marítimo como som de fundo, a partida foi endurecendo, o que favorecia os rapazes da ilha da Madeira, mais resistentes do ponto de vista físico. Madeirenses que aos 35 minutos dispuseram de uma oportunidade sublime para chegar à vantagem, na sequência de uma grande penalidade assinalada a castigar uma falta belenense. Oportunidade que seria desperdiçada, e o encontro lá continuou com o nulo no marcador até ao intervalo. Na etapa complementar o Belenenses entrou melhor, mas seria o Marítimo a chegar ao golo à passagem do minuto 55 por intermédio de José Fernandes, na cobrança de um livre direto.

Cinco minutos volvidos Ramos faria o 2-0, e o Campo do Ameal explodiu de alegria, ao mesmo tempo em que os jogadores lisboetas eram provocados e ridicularizados pelo público ali presente. Belenenses que protestaram vincadamente o segundo golo insular, alegando irregularidades. Augusto Silva, um dos melhores jogadores dos azuis, terá mesmo puxado o braço do árbitro, pedindo-lhe satisfações, ao que este sem mais demora deu ordem de expulsão ao belenense. Augusto Silva recusou-se a sair do campo, e a desordem instalou-se no Ameal. O público continuava a insultar os lisboetas, agora mais do que nunca, e só a intervenção pronta da polícia a cavalo terá evitado males maiores. Augusto Silva continuava a recusar sair do campo, e assim sendo, o árbitro, após consultar os dirigentes da UPF ali presentes, decidiu por encerrar o jogo, e consequentemente atribuir o título de campeão ao Marítimo.
A festa estalou de pronto. Era como se os madeirenses estivessem a jogar em casa! Os lisboetas não calaram a sua revolta, e no dia seguinte a imprensa da capital saia mais uma vez em defesa dos seus: «Caído o verniz da compustura, os facciosos portuenses deram largas ao seu despeito e ao seu rancor a Lisboa, os jogadores do Belenenses tiveram de passar por entre alas de público que os cobriu de vaias, dirigindo-lhes  os insultos mais soazes. Estiveram iminentes vários conflitos...», assim escrevia Ribeiro dos Reis no Sport de Lisboa.
No dia 10 de junho, a comitiva do Marítimo chega finalmente a casa. A ilha da Madeira parou por completo nesse dia para receber de forma apoteótica os seus heróis.

A figura: Norman Hall

O FC Porto pode até ter saído humilhado deste Campeonato de Portugal, mas o seu lendário capitão de equipa da época, Normal Hall, foi a figura da competição. Nasceu em Inglaterra, em finais do século XIX (12 de outubro de 1897), tendo aos oito anos de idade vindo com os seus pais para Portugal, onde iniciaria, tempos mais tarde, a sua brilhante carreira de futebolista no clube do seu coração, o FC Porto. Avançado habilidoso e eficaz Hall cedo se tornou num ídolo da fervorosa massa adepta do clube nortenho.
Em finais de 1919 passou a integrar a equipa principal do clube, sendo que para além de um notável jogador era um verdadeiro cavalheiro. Um gentleman, um exemplo de fair-play, sempre amável com os seus companheiros e cordeal com os adversários. Esta tornar-se-ia na sua imagem de marca. A sua estreia com a camisola do Porto foi histórica. Aconteceu a 4 de abril de 1920, em Lisboa, diante do Benfica, um jogo que os portistas venceram por 3-2, sendo esta a primeira vitória azul-e-branca alcançada no reduto do inimigo do sul.
Era um goleador nato, e a prova disso foram os seus 10 golos apontados neste Campeonato de Portugal de 1926, sendo oito deles no jogo diante do Vila Real. Foi capitão do FC Porto durante várias épocas, e no seu palmarés constam 12 títulos de campeão regional e um de campeão de Portugal (24/25). Despediu-se dos campos de futebol no início da década de 30, e dele ficou a memória de um grande desportista, de um homem honesto, um cavalheiro, portador de uma paixão desmedida pelo seu FC Porto.

Nomes e números do Campeonato de Portugal de 1925/26

1ª eliminatória

Sporting de Espinho - União de Coimbra: 4-3

FC Porto - Vila Real: 10-0

Braga - Vianense: 1-0

Luso Beja - Estrela de Portalegre: 2-0

Belenenses - Leões de Santarém: 7-2

Quartos-de-final

Belenenses - Sporting de Espinho: 4-1

FC Porto - Braga: 3-0

Olhanense - Luso Beja: 5-0

Meias-finais

Marítimo - FC Porto: 7-1

Belenenses - Olhanense: 2-1

Final

Marítimo - Belenenses: 2-0 (final dada por terminada aos 60 minutos)

Data: 6 de junho de 1926

Estádio: Campo do Ameal, no Porto

Árbitro: José Guimarães (do Porto)

Marítimo: Ângelo Ortega Fernandes; António Sousa e José Correia; Domingos Vasconcelos cap, Francisco Lopes e José de Sousa; José Ramos, António Alves, António Teixeira “Camarão”, Manuel Ramos e José Fernandes.Treinador: Ekker

Belenenses: Francisco Assis; Eduardo Azevedo e Júlio Marques; José Almeida, Augusto Silva cap e César Matos; Fernando António, Rodolfo Faroleiro, Silva Marques, José Manuel Soares “Pepe” e Alfredo Ramos. Treinador: Artur José Pereira

 Golos: 1-0 (Fernandes, aos 55m), 2-0 (Ramos, aos 60m)


Legenda das fotografias:
1-Equipa do Marítimo campeã de Portugal
2-Belenenses
3-Lance do jogo entre Marítimo e FC Porto
4-Página do jornal Ecos dos Sports, noticiando a tarde negra dos portistas
5-A capa do citado jornal, ilustrando o quinto golo madeirense
6-Lance do primeiro golo madeirense
7-Lance do segundo tento dos campeões de Portugal de 1926
8-Norman Hall
9-A festa madeirense aquando da chegada do Marítimo à ilha

segunda-feira, janeiro 07, 2013

Histórias do Futebol em Portugal (10)... Em memória de Velez Carneiro

Depois de duas temporadas consecutivas a morar no sul do país o título mais importante do futebol português dos anos 20 e 30 do século XX voltou ao norte, na época de 1924/25. E fê-lo pela mão do emblema mais titulado desta região, o Futebol Clube do Porto, que desta forma enriquecia as suas vitrinas com a sua segunda coroa de campeão de Portugal. Tratou-se de uma conquista muito especial, deveras emotiva, já que na cabeça - e sobretudo no coração - dos jogadores portistas estava gravado o nome de um querido e valoroso companheiro de luta, morto dias antes do início da caminhada triunfal naquela que era já a competição mais popular do futebol lusitano. Velez Carneiro, talentoso atleta do FC Porto que viu a morte bater demasiado cedo à sua porta, na sequência de um ajuste de contas fatal ante um marido atraiçoado...Tragédia ocorrida a 18 de maio desse longínquo ano de 1925, quase duas semanas antes da realização (31 de maio) da 1ª ronda de uma prova alargada a 11 associações de futebol, nomeadamente Porto, Lisboa, Viana do Castelo, Braga, Coimbra, Portalegre, Funchal, Algarve, Aveiro, Santarém, e Beja, estas três últimas a fazerem a sua estreia nestas andanças.

No entanto, e em cima do tiro de partida para a corrida ao título os representantes das associações de Santarém e Beja, respetivamente Leões de Santarém e Luso Beja, desistiram da competição, facto que possibilitou ao campeão de Lisboa, o Sporting, avançar imediatamente para as meias-finais, ficando isento das duas primeiras eliminatórias! 
Os restantes campeões regionais - à exceção de FC Porto e Marítimo - entraram então em campo no dia 31, sendo que no Campo do Raio, em Braga, o Sporting local era surpreendido pelos vizinhos minhotos do Vianense por 1-2, com os heróis de Viana do Castelo a darem pelos nomes de Lobo (fez o 0-1), e Gomes (apontou o 1-2).

Em Aveiro, no Campo de S. Domingos, o campeão do distrito, o Sporting de Espinho, sentia algumas dificuldades para derrotar os vice-campeões de Portugal da temporada de 22/23, a Académica de Coimbra. Os estudantes adiantaram-se no marcador por intermédio de Juvenal, tendo a primeira reação dos tigres da Costa Verde surgido dos pés de Simplício, que de grande penalidade repôs a igualdade. O tento da vitória espinhense foi apontado por António Rodrigues.

Massacre foi aquilo que os campeões em título, o Olhanense, fizeram ao Alentejo Football Clube, o campeão regional de Portalegre. No Campo da Padinha, em Olhão, os pupilos de Júlio Costa esmagaram por completo o combinado alentejano por 11-2!!! Destaque para José Gralho, autor de 6 dos 11 tentos dos algarvios.

Futuro campeão entra em ação

A prova conheceu o seu segundo capítulo no dia 7 de junho, com a realização da 2ª eliminatória. No Campo do Covelo, no Porto, a equipa local batia-se com o Vianense para discutir o acesso às meias finais. Portistas que se apresentavam com um novo treinador, o húngaro Akos Tezler, uma aposta pessoal do presidente azul e branco da altura, Domingos Almeida Soares, para substituir o francês Adolphe Cassaigne, o homem que, recorde-se, havia conduzido os rapazes da Invicta ao título de campeão de Portugal três anos antes.

Diga-se que a contratação do treinador húngaro foi bastante controversa, já que o seu ordenado de 1000 escudos por mês era para muitos dirigentes e adeptos uma autêntica heresia (!), pois convém não esquecer que o profissionalismo no futebol era algo de absurdo naquele tempo. Pois bem, o que é certo é que esta se revelaria uma aposta ganha do presidente portista, como mais à frente iremos ver.

E o primeiro obstáculo ultrapassado foi pois o Vianense, que no Covelo perdeu por 1-4, tendo os golos do FC Porto sido apontados por Balbino da Silva e Flávio Laranjeira, com dois golos cada um na sua conta pessoal. 
Em Lisboa, no Campo Grande, o Olhanense deu mais uma prova do seu valor, da genialidade dos seus jogadores, ao vencer o Marítimo por 4-2, com Gralho a apontar mais dois golos, ele que haveria de ser o rei dos goleadores desta edição do Campeonato de Portugal, com 8 remates certeiros.

Meia final polémica

Olhanense que haveria de ser afastado da prova na ronda seguinte, isto é, nas meias-finais, pelo Sporting. Um afastamento inglório, e deveras polémico. No Campo Grande o árbitro Mário Simões, da Associação de Futebol do Funchal, foi a figura do encontro, ao levar o leão ao colo até à final! Quiçá querendo fazer justiça pela eliminação dos seus conterrâneos do Marítimo aos pés dos talentosos jogadores de Olhão Mário Simões inventou uma grande penalidade inexistente a favor do Sporting em cima do minuto 90! Na conversão o treinador-jogador Filipe dos Santos fez o único golo da partida, um golo que ficaria eternamente conhecido como o... "golo sombra". No final do jogo os sportinguistas saíram do campo debaixo de uma chuva de... assobios, tendo posteriormente o capitão leonino, Jorge Vieira, vindo a público pedir desculpas ao Olhanense pelo... erro do árbitro! Outros tempos, tempos em que futebol era tratado com cavalheirismo.

Nesse mesmo dia 21 de junho, e de novo no Covelo (recinto do vizinho Salgueiros), o FC Porto repetia, ante o Espinho, o resultado aplicado ao Vianense na eliminatória anterior, ou seja, 4-1, com Flávio Laranjeira a fazer de novo o gosto ao pé em duas ocasiões, gesto imitado pelo seu companheiro de equipa Norman Hall.
O FC Porto de Tezler era uma equipa que praticava um futebol-espetáculo, algo que começava a encantar os adeptos dos dragões, os quais pareciam cada vez mais esquecerem-se do ordenado milionário que o técnico húngaro auferia na Invicta.

Repetição da final de 1922... com igual desfecho

Assim sendo FC Porto e Sporting voltavam a encontrar-se na final do campeonato, depois de terem medido forças pela primeira vez em 1922, na edição estreia da competição. Mas a disputa do ceptro nacional de 1925 começou muito antes dos jogadores entrarem em campo. Ambos os clubes gladiaram-se pelo local da final, sendo que os lisboetas queriam que o jogo decisivo fosse jogado ou em Santarém, ou em Coimbra, ao que os portistas responderam que só jogariam em Viana do Castelo! Por decisão da União Portuguesa de Futebol (UPF) venceram os azuis e brancos, isto quando faltavam apenas seis dias para o pontapé de saída do grande jogo!

Mas muito ainda havia para fazer, até porque o Campo de Monserrate não reunia as condições necessárias para acolher um duelo daquela importância. Foi então que numa ação relâmpago se fizeram obras de melhoramento do recinto, desde bancadas, passando por tribunas centrais, e até camarotes (!), tudo pelo astronómico valor - para aqueles dias - de 12 contos de réis!
Tudo pronto no dia da final (28 de junho), sendo que dos 5000 lugares disponíveis em Monserrate 3000 eram preenchidos pelos adeptos do FC Porto. Da Cidade Invicta viajaram dezenas de automóveis, e a CP disponibilizou dois comboios especiais que partiram da Estação de S. Bento (no Porto) apinhados de entusiastas portistas. De Lisboa não viajaram mais do que centena e meia de adeptos em auxílio dos leões. Como se não bastasse as opiniões distintas em relação ao local da final, FC Porto e Sporting também discordaram em relação à nomeação do árbitro. Não querendo mais confusões a UPF decidiu nomear um juiz... galego, de seu nome Rafael Nuñez.

E foi pois num autêntico caldeirão azul e branco que se desenrolou o encontro, que teve na equipa nortenha a mais determinada em chegar ao triunfo. Com Velez Carneiro no pensamento os portistas queriam ganhar e dedicar assim o título de campeão ao recém desaparecido companheiro, e nesse sentido partiram com tudo para cima dos lisboetas desde o apito inicial do galego Nuñez. Sem espanto chegariam pois à vantagem aos 14 minutos por intermédio do capitão Hall após uma boa jogada de combinação com João Nunes. Do lado dos portistas destaque igualmente para a exibição do seu guarda-redes, o também húngaro Mihaly Siska, que numa época em que o profissionalismo era proibido chegava ao Porto para desempenhar a função de... mecânico dentista numa empresa de vinhos! Mais uma mentira piedosa do presidente do clube Domingos Almeida Soares, quando confrontado pelos seus pares de Direção dos rumores de que Siska - oriundo do Vasas de Budapeste - vinha para o clube ganhar um ordenado milionário. Soares retorquiu que não, que viera para Portugal para ser mecânico dentista, e que o clube não iria pagar um tostão àquele que mais tarde viria a ser considerado o primeiro grande guarda-redes do futebol português.

Voltando ao jogo da final para dizer que o Sporting ainda reagiu na etapa complementar. Aos 50 minutos Jaime Gonçalves empatou a contenda, mas a tarde era azul e branca. Nove minutos depois Rafael Nuñez assinalou grande penalidade contra os lisboetas, por uma alegada mão na bola de Martinho de Oliveira. Os leões protestaram ferozmente, mas de nada lhes valeu tal manifestação, pois Coelho Costa atirou o esférico para o fundo das redes de Cipriano Nunes. Estava feito o resultado final, 2-1, e tal como em 1922 o FC Porto vencia o Sporting e sagrava-se campeão de Portugal.
Festa rija estalou de imediato em Viana do Castelo, prolongando-se nas horas seguintes ao Porto, enquanto que em Lisboa reinava a... revolta.

O consagrado jornalista Ricardo Ornelas, do jornal Sport de Lisboa, escrevia o seguinte: «A vitória portuense foi merecida porque o FC Porto jogou efetivamente melhor que o representante de Lisboa e porque, a par dessa superioridade técnica, lutou pela vitória com entusiasmo e com alma, e demonstrou, a cada momento da partida, perfeita compenetração do encargo que lhe cabia pela representação da sua cidade. O Sporting, pelo contrário, jogou sem convicção. Saiu do campo vencido por factos que devia desprezar ou esquecer. Inferiorizou-se, deixando-se dominar por factores que lhe deviam dar coragem e ânimo. Preocupou-se com o público, potuense na maioria; influenciou-se com a alma dos adversários e desmoralizou-se com os erros do árbitro...», juiz galego cujo desempenho Ornelas descreveu como «simplesmente bárbaro», numa alusão clara à grande penalidade que originou o golo da vitória portista, castigo máximo que para os leões não teve razão de existir.

Como prémio de vitória os jogadores do FC Porto receberam máquinas Gillete de ouro, oferecidas pela empresa lisboeta (!) João Machado da Conceição e Companhia Lda, representantes da mundialmente afamada fábrica Gillete de Nova Iorque.

A figura: Velez Carneiro

Não jogou um único minuto durante a caminhada triunfal no Campeonato de Portugal de 24/25, é certo, mas foi tão campeão quanto os seus companheiros. Velez Carneiro foi impedido de conquistar o seu segundo título de campeão de Portugal por um marido atraiçoado, que na noite de 18 de maio de 1925 matou o valoroso atleta com um tiro na cabeça.

Velez Carneiro nasceu em 1898, e começou o seu percurso futebolístico ao serviço do Sporting de Espinho, clube pelo qual se fez a sua estreia diante do... FC Porto, o seu futuro clube. Ingressou no emblema portuense em 1920, fazendo parte do conjunto que obteve a primeira vitória da história (3-2) sobre o Benfica. Médio ofensivo de gabadas qualidades técnico-táticas Velez Carneiro atingiu o ponto alto ao serviço dos dragões em 1922, altura em que ajudou a equipa a vencer o primeiro Campeonato de Portugal da história. E quando se preparava para arrecadar o seu segundo ceptro nacional foi... morto a tiro. Naquela trágica noite de 18 de maio o jovem jogador de 27 anos conversava com alguns amigos junto a uma das portas do Café Chave d' Ouro. Dele se abeirou posteriormente um individuo com cara de poucos amigos, que ao ouvido lhe disse qualquer coisa que mais ninguém terá escutado.

Velez avisou os amigos que voltava dali a nada, e partiu pelos Congregados abaixo junto do tal sujeito. Os poucos que testemunharam tal crime terão visto dois homens a discutir vivamente debaixo de um lampião na Travessa dos Congregados, ao que se seguiram alguns empurrões, socos, pontapés, e por fim um tiro, uma bala que atingiu mortalmente - na cabeça - o talentoso futebolista. O assassino era Carmindo Ferreira Duarte, escriturário na empresa Minho e Douro, e ao que parece um marido traído pelos dotes extra futebolísticos de Velez!

O funeral do futebolista (ocorrido no dia 22 de maio) foi imponente, ou não fosse ele um dos ídolos do clube. O Jornal de Notícias desse dia escrevia: «Muito antes da hora marcada para a saída do féretro já o Campo de Jogos da Constituição regurgitava de pessoas. Depois de dar a volta ao campo, o féretro, conduzido pelos jogadores do team de que o finado fazia parte, foi colocado ao centro do campo, mantendo-se o público em silêncio durante cinco minutos, que foram observados religiosamente. Findo este recolhimento que impressionou, a Direcção do F. C. Porto procedeu à colocação da bandeira do seu clube sobre o féretro. O capitão da equipa, Hall, conduzia sobre uma almofada de cetim preto as medalhas oferecidas ao falecido jogador.»

Resultados

1ª Eliminatória

Sp. Braga - Vianense: 1-2

Sp. Espinho - Académica: 2-1

Olhanense - Alentejo FC: 11-2

2ª Eliminatória

FC Porto - Vianense: 4-1

Olhanense - Marítimo: 4-2

Meias-finais

FC Porto - Sp. Espinho: 4-1

Sporting - Olhanense: 1-0

Final

FC Porto - Sporting: 2-1

Data: 28 de junho de 1925

Estádio: Campo de Monserrate, em Viana do Castelo

Árbitro: Rafael Nuñez (Galiza)

FC Porto: Miguel Siska; Júlio Cardoso, Pedro Temudo; Humberto, Coelho da Costa, Floreano Pereira; Augusto Freire, Balbino da Silva, Flávio Laranjeira, Norman Hall, e João Nunes. Treinador: Akos Tezler

Sporting: Cipriano Nunes; Joaquim Ferreira, Jorge Vieira; José Leandro, Filipe dos Santos, Martinho de Oliveira; Torres Pereira, Jaime Gonçalves, Henrique Portela, João Francisco, e Emílio Ramos. Treinador: Filipe dos Santos

Golos: 1-0 (Hall, aos 14m), 1-1 (Jaime Gonçalves, aos 50m); 2-1 (Coelho da Costa, aos 59m)

Legenda das fotografias:
1-Equipa do FC Porto vencedora do Campeonato de Portugal de 24/25
2-Balbino da Silva, autor de dois golos ante o Vianense na 2ª eliminatória
3-Lance do polémico jogo Sporting - Olhanense
4-Outro lance, desta feita da grande final
5-Velez Carneiro

sexta-feira, novembro 23, 2012

Histórias do Futebol em Portugal (9)... David vence Golias

A lendária expressão David contra Golias pairou sobre a 3ª edição do Campeonato de Portugal, disputado na temporada de 1923/24. E tal como na mitológica lenda o pequeno David venceu o gigante Golias, nascendo aqui uma tradição que teria muitos outros capítulos tanto no Campeonato de Portugal como na prova que lhe viria a suceder, a Taça de Portugal, onde as vitórias dos pequenos sobre os grandes clubes eram - e continua a ser - rotuladas de um triunfo de David contra Golias.
E o primeiro David do futebol lusitano veio do Algarve, mais precisamente da cidade de Olhão, o berço do popular Olhanense, que nessa longínqua primavera de 24 alcançou o maior feito dos seus 100 anos de vida - festejados precisamente neste ano de 2012 -, o título de campeão de Portugal.
Na edição de 1923/24 do Campeonato de Portugal ficou bem patente a descentralização do futebol português, isto é, mais associações - Porto e Lisboa eram as associações de maior peso - envolveram-se na luta pela conquista do ceptro futebolístico de maior prestígio do país. Entre as associações que faziam a sua estreia estavam as de Santarém, Portalegre, e Viana do Castelo, cujos campeões regionais, respetivamente, Sporting de Tomar, União Portalegrense, e Vianense, se juntavam aos campeões do Porto (FC Porto), Lisboa (Vitória de Setúbal), Coimbra (Académica), Algarve (Olhanense), Funchal (Marítimo), e Braga (Sporting de Braga). Favorito a alcançar a glória? Talvez o FC Porto, poderoso emblema nortenho, recheado de algumas das maiores vedetas do futebol lusitano da época, casos de Tavares Bastos, Norman Hall, Velez Carneiro, Alexandre Cal, entre outros, que dois anos antes haviam ajudado o clube da Cidade Invicta a inaugurar a lista de campeões da jovem competição nacional.
E os portistas confirmariam logo na 1ª eliminatória o teórico favoritismo que sobre si recaía. No tarde de 18 de maio de 1924 o Campo da Constituição, no Porto, encheu-se para presenciar a vitória curta mas justa dos azuis e brancos sobre os estudantes da Académica de Coimbra, por 3-2. Noram Hall e Floreano Ferreira - este último por duas ocasiões - foram os heróis dessa tarde, ao apontar os golos da equipa do norte, que não ganhou para o susto a meio do duelo, altura em que um auto golo de José Mota colocou os academistas a vencer por 2-1. Contudo, o talento dos portistas acabaria por vir ao cima nos instantes finais.
Mais a norte, em Viana do Castelo, houve dérbi minhoto, entre o Vianense e o Braga. Gama seria a grande figura da tarde, já que da sua autoria seriam os dois únicos golos de um encontro que seria ganho pelos vianenses.
O resultado mais desnivelado desta eliminatória inicial seria protagonizado entre duas equipas estreantes. O Sporting de Tomar esmagava em Portalegre o União local por 9-0!
E no derradeiro duelo desta ronda inicial assistiu-se ao início da caminhada triunfal do campeão do Algarve, o Olhanense, neste Campeonato de Portugal de 1923/24. Reunindo um naipe de talentosos jogadores, onde se destacava - claramente - o centro campista Raul Tamanqueiro, os jogadores de Olhão venceram no seu Campo da Padinha o Vitória de Setúbal, o surpreendente campeão de Lisboa - deixando pelo caminho os gigantes do futebol lisboeta Sporting, Benfica e Belenenses -, por 1-0, graças a um tento do capitão Júlio Costa.

Lisboa rendida a Olhão

De forma estranha a União Portuguesa de Futebol decidiu que o embate das meias finais entre Olhanense e Sporting de Tomar haveria de ser disputado em Lisboa, e não na localidade de origem das duas equipas em questão! Tal decisão parece não ter afetado os rapazes de Olhão, que numa autêntica tarde de glória despachariam os seus homólogos de Tomar por expressivos 6-0 (!), deixando rendido ao seu futebol o muito público lisboeta que se deslocou ao Campo Grande para assistir à partida. Belo e Gralho, com três golos cada um na sua conta pessoal, foram os responsáveis da robusta vitória algarvia.
E em Viana do Castelo o FC Porto não ganhou - novamente - para o susto. José Barbosa fez explodir de alegria o Campo de Monserrate, quando colocou o Sport Clube Vianense em vantagem num jogo arbitrado pelo mestre Cândido de Oliveira, que na altura representava, enquanto jogador as cores do Casa Pia. Augusto Freire, verdadeiramente endiabrado, tratou de remar contra a maré, e por duas ocasiões bateu o guardião local Ramiro Pinto, dando assim a volta a um marcador que ficaria selado com o último golo portista, da autoria do luso-inglês Norman Hall.

Marítimo impotente para travar avalanche olhanense

Por caprichos do sorteio o Futebol Clube do Porto apurou-se automaticamente para a final do campeonato após o suado triunfo de Viana do Castelo, sendo que a outra vaga iria ser disputada numa espécie de play-off entre o Olhanense e o campeão da Madeira, o Marítimo, que ficara isento da 1ª eliminatória e da meia final.
Novamente no Campo Grande de Lisboa os campeões da Associação de Futebol do Algarve deram uma nova lição de futebol, de bem jogar, claro está. A sua equipa homogénea e coesa voltou a encantar a multidão, que começava a ficar rendida ao futebol tecnicamente requintado da estrela maior olhanense, Raul Tamanqueiro. Gralho, em duas ocasiões, Belo, Cassiano, e Falcate foram os marcadores dos tentos dos algarvios, que avançavam assim para a grande final, a qual iria ter novamente lugar no anfiteatro do Campo Grande, fazendo com que desta forma a capital portuguesa recebesse pela primeira vez a decisão de um Campeonato de Portugal.

Olhanense confirma favoritismo no encontro final

E eis que chegavámos à célebre tarde de 8 de junho de 1924. O dia da grande final. Uma partida que teve a particularidade de ser presenciada pelo chefe de Estado, o mesmo é dizer o Presidente da República, na época Teixeira Gomes, um algarvio nascido em Portimão amante do desporto - na sua juventude chegou a ser atleta - que "inaugurava" então uma prática que viria a ser comum nas grandes finais do futebol português dos anos e décadas seguintes: a presença da mais alta individualidade da nação no jogo final.
Com as bancadas do Campo Grande bem compostas não foi de admirar que a esmagadora maioria dos adeptos (lisboetas) tomasse partido das cores algarvias, não só pelo encantador futebol que o emblema de Olhão havia praticado ao longo da caminhada até à final, mas sobretudo porque do outro lado estava o rival - para os clubes da capital - do norte, o todo poderoso FC Porto. Portistas que apesar de todo o seu poderio nem eram considerados favoritos a vencer esta final! Como já dissemos, o futebol olhanense maravilhou os críticos da modalidade, que a julgar pelo que haviam visto não tinham dúvidas de que na teoria a balança (da vitória) pendia para os futebolistas algarvios. Teoria que conformaria a prática, pese embora este tenha sido um triunfo de David sobre Golias, pois não podemos sequer comparar a dimensão - e consequente palmarés - que separava os dois clubes.
Arbitrada por Germano de Vasconcelos, de Braga, a final começou da melhor maneira para o "onze" algarvio, que por intermédio de Delfino Graça - outros dos virtuosos jogadores orientados pelo jogador/treinador Júlio Costa - inauguraria o marcador. Emoção e bom futebol de parte a parte foram ingredientes verificados desde o apito incial, e ao quarto de hora os portistas chegariam à igualdade por um dos seus grandes artistas da época, Norman Hall.
Nem dois minutos volvidos e o árbitro bracarense assinalava grande penalidade a favor do FC Porto, a qual seria convertida em golo por Tavares Bastos.
Contudo, estavamos ainda muito longe do términus do encontro, e muita água ainda havia de rolar debaixo da ponte, ou melhor, a magia dos jogadores de Olhão ainda estava por aparecer. Colocada em campo essa magia havia de dar frutos ainda antes do intervalo quando Raul Tamanqueiro converte uma grande penalidade e coloca novamente tudo em pé de igualdade. Este seria o único golo apontado por Tamanqueiro durante esta campanha vitoriosa, um tento que premiava a fenomenal performance ao longo de toda a prova da estrela de Olhão, que para não variar foi o melhor jogador em campo na final do Campo Grande.
E após o intervalo só deu Olhanense. A superioridade dos algarvios foi por demais evidente, controlando de fio a pavio o encontro. Com naturalidade surgiu o 3-2 (da autoria de Gralho, que desta forma se tornava no melhor marcador da equipa, com seis golos), e o 4-2 (por intermédio de Belo). E mais poderiam ter sido, não fosse a excelente exibição do guarda redes portista Borges Avelar.
Após o apito final de Germano de Vasconcelos a festa estalou, do relvado às bancadas a alegria era imensa, o Olhanense acabava de se sagrar campeão de Portugal, David tinha vencido Golias.
Depois do encontro o Presidente da República mandou chamar ao seu camarote todos os jogadores e os árbitros, a todos apertando a mão, ao mesmo tempo que os felicitava, em especial ao astro Raul Tamanqueiro, a quem dirigiu palavras particulares de felicitação.

A figura: Raul Tamanqueiro

Ele foi um dos primeiros génios do então jovem futebol lusitano. Virtuoso médio, com uma genialidade criativa e uma rapidez fora do comum (dizem que era capaz de fintar a própria sombra) ele foi a figura principal do título olhanense de 1924. Raul Soares Figueiredo, o seu nome de batismo, Tamanqueiro (a alcunha que derivava do facto do seu pai trabalhar o ofício de sapateiro) se imortalizou nos campos de futebol que pisou.
Nasceu em 22 de janeiro de 1903, em Lisboa, no bairro de Campo de Ourique. No entanto, seria em terras setubalenses que daria os primeiros pontapés na bola, chamando de imediato à atenção de diversas figuras ligadas ao futebol daquela época. Uma dessas figuras foi Cândido Ventura, mítico presidente do Olhanense, que não sossegou enquanto não levou aquela "pérola" para o seu clube. Fez a estreia pelo emblema de Olhão a 16 de agosto de 1922, diante do Lusitano de Vila Real de Santo António, num encontro a contar para a Taça Nossa Senhora dos Mártires, em Castro Marim. Diz quem o viu jogar que era um jogador versátil e bastante ágil, e que mesmo sendo de estatura baixa era um excelente cabeceador.
Num tempo em que o futebol não era profissional, pelo menos oficialmente, pois muitos dos jogadores da época recebiam, às escondidas, claro está, ordenados para defender as cores "desde" ou "daquele" clube, Raul Tamanqueiro ganhava a vida como vendedor de peixe nas ruas de Olhão. No Olhanense esteve durante quatro temporadas, e além do Campeonato de Portugal de 1924 venceu ainda dois campeonatos regionais do Algarve, em 23/24, e 25/26.
A sua inolvidável performance no Campeonato de Portugal de 1924 fizeram-no chegar à seleção nacional no ano seguinte, tendo vestido pela primeira vez a camisola das quinas a 17 de maio desse ano, num jogo realizado em Lisboa ante a Espanha (derrota por 0-2).
A sua condição de grande artista da bola em meados dos anos 20 fizeram o Benfica assegurar no verão desse ano de 1925 a sua contratação. Em Lisboa, Tamanqueiro esteve três temporadas, recebendo secretamente dinheiro para jogar, ao mesmo tempo em que era... taxista. E seria no final da terceira temporada - 1927/28 - ao serviço do clube lisboeta que Raul Tamanqueiro iria viver um dos momentos mais importantes e marcantes da sua carreira. O selecionador nacional da altura, o mestre Cândido de Oliveira, chamou-o para representar Portugal no torneio mais importante do Mundo da época, os Jogos Olímpicos. Em Amesterdão, ao lado de lendas como Pepe, Jorge Vieira, Carlos Alves, Vítor Silva, Valdemar Mota, ou António Roquete, seria um dos responsáveis pela magnífica campanha lusitana, que terminou de forma inglória nos quartos de final aos pés do Egito.
Tamanqueiro vestiu por 17 ocasiões a camisola da seleção portuguesa, fazendo-o pela última vez a 23 de fevereiro no Porto, numa vitória (2-0) diante da França.
As saudades do Algarve fizeram-no nesse memorável ano de 1928 voltar para o Olhanense, clube onde jogaria até 1933. Pelo meio ainda deu um salto a Espanha, a Huelva mais precisamente, onde atuou como jogador/treinador do Recreativo. Pendurou as chuteiras em 1933/34, época em que se mudou para o Porto, onde viria a representar o Académico. Depois disso ainda foi treinador de Braga, e de União de Coimbra.
Morreu prematuramente aos 38 anos, de doença incurável, dizem.
O seu filho, Raul Figueiredo, seguiu-lhe as pisadas, chegando a internacional quando defendia as cores do Belenenses, facto que fez com que estes dois homens fossem os primeiros pai e filho a representar a seleção nacional de futebol.

Nomes e números do Campeonato de Portugal de 1923/24:

1ª eliminatória

Vianense - Braga: 2-0

FC Porto - Académica: 3-2

União Portalegrense - Sporting de Tomar: 0-9

Olhanense - Vitória Setúbal: 1-0

Meias finais

Olhanense - Sporting de Tomar: 6-0

Vianense - FC Porto: 1-3

Play-off de apuramento para a final

Olhanense - Marítimo: 5-1

Final

Olhanense - FC Porto: 4-2

Data: 8 de junho de 1924

Estádio: Campo Grande, em Lisboa

Árbitro: Germano de Vasconcelos (Braga)

Olhanense: Carlos Martins; Américo Martins e Falcate; Fausto Peres, Raul Tamanqueiro e Francisco Montenegro; Cassiano, Belo, José Gralho, Delfino Graça e Júlio Costa. Treinador: Júlio Costa

FC Porto: Borges Avelar; Álvaro Coelho e Tavares Bastos; Coelho da Costa, Velez Carneiro e Floreano Pereira; Alexandre Cal, Augusto Freire, Norman Hall, Augusto Ferreira “Simplício” e João Nunes. Treinador: Akos Tezler

Golos: 1-0 (Delfino Graça, aos 3m), 1-1 (Hall, aos 15m), 1-2 (Tavares Bastos, aos 17m), 2-2 (Tamanqueiro, aos 40m), 3-2 (Gralho, aos 67m), 4-2 (Belo, aos 85m)

Legenda das fotografias:
1-Equipa do Olhanense, campeã de Portugal em 1924
2-José Belo em ação, um dos artistas de Olhão
3-Tamanqueiro a cabecear o esférico
4-Noram Hall, um dos grandes jogadores do FC Porto da década de 20
5-A estrela Raul Tamanqueiro
6-A equipa do Sporting de Tomar, que alcançou o resultado mais expressivo da época de 1923/24