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terça-feira, abril 10, 2012

Futebol nos Jogos Olímpicos (2)... Estocolmo 1912

Em 2012 assinalam-se precisamente os 100 anos da ocorrência da 5ª edição das Olimpíadas da Era Moderna. Estocolmo foi então o palco escolhido para levar à cena um evento cujo interesse em seu redor crescia a olhos vistos um pouco por todo o Mundo. Terá sido esta uma das razões para que na “Veneza do Norte” – assim é retratada mundialmente a cidade sueca – pela primeira vez atletas vindos dos cinco continentes do globo tivessem participado nos Jogos Olímpicos. Com uma estrutura organizacional nunca dantes vista estes jogos serão para sempre recordados como os primeiros em que a abertura seria abrilhantada por uma cerimónia coreografada antes da entrada das delegações das 28 nações participantes no estádio olímpico.
Estreia foi também o sistema sonoro de alto-falantes instalado não só no complexo olímpico como também por toda a cidade de Estocolmo com a intenção de transmitir os resultados das 14 modalidades desenvolvidas.
E no futebol a novidade também foi uma característica que se fez notar desde logo. A principal foi o facto de o número de seleções integrantes do torneio olímpico ter duplicado em relação às Olimpíadas de 1908. No total foram 11 os combinados nacionais que em Estocolmo lutaram pelo ouro, sendo que à semelhança do que acontecera quatro anos antes em Londres todos eles eram oriundos da Europa. E já que se fala em novidade há que dar conta de uma segunda competição futebolística dentro do próprio torneio olímpico, denominada de Torneio de Consolação, destinada às seleções eliminadas na 1ª fase e nos quartos-de-final da prova principal.

Surpresa a abrir

A 29 de junho foi dado então o pontapé de saída do torneio de futebol dos jogos de 1912, e logo com uma tremenda surpresa. Em jogo alusivo à 1ª fase a forte Itália liderada pelo lendário treinador Vittorio Pozzo – que na década de 30 haveria de conduzir a Squadra Azzurra à conquista de dois Campeonatos do Mundo consecutivos – sucumbia aos pés da frágil Finlândia (!) por 2-3 após prolongamento e ficava desta forma arredada da possibilidade de lutar pelo título. Nota curiosa o facto deste encontro inaugural ter sido arbitrado por outra lenda das táticas, o austríaco Hugo Meisl.
Célebre treinador que neste mesmo dia iria conduzir a Áustria a um esmagador triunfo sobre a Alemanha por 5-1. O terceiro e último encontro da ronda inicial – também realizado no dia 29 – colocou frente a frente no Estádio Olímpico de Estocolmo a equipa da casa, a Suécia, e a medalha de bronze dos Jogos Olímpicos de 1908, a Holanda. Bem disputada e pautada pelo signo do equilíbrio a partida só seria ganha pelos homens do “país das tulipas” no prolongamento, por 4-3.

Grã-Bretanha não brincou em serviço

Passada a fase pré-eliminar, a qual há que dizê-lo causou grande contestação entre a maioria das seleções, pelo facto de o sorteio ter emparelhado as equipas mais fortes (Itália, Suécia, Holanda, Áustria, ou Alemanha) e deixado de fora os conjuntos mais fracos (como Noruega, ou Rússia), o que significava desde logo que alguns dos teoricamente candidatos ao título iriam sair mais cedo da competição, eis que o torneio olímpico entra na sua fase final propriamente dita.
E quem entrou a todo o gás foram mesmo os campeões olímpicos em título, a Grã-Bretanha, que no Estádio Rasunda, nos arredores de Estocolmo, cilindrava a Hungria por 7-0. Neste duelo o sublinhado maior vai para o avançado inglês Harold Walden que à sua conta apontou 6 dos 7 tentos da armada britânica. Com mais 5 tentos apontados nos restantes dois encontros disputados Walden haveria de se sagrar no artilheiro destes Jogos Olímpicos com um total de 11 remates certeiros.
Quem também continuava a não brincar em serviço era a Finlândia. Depois de afastar a poderosa Itália os finlandeses bateram no Estádio Traneberg os vizinhos da Rússia por 2-1 na sequência de mais uma grande exibição, conforme rezam as raras crónicas da época, continunado desta forma no trilho do sonho em chegar a pelo menos uma medalha.
Sete foi também a “chapa” usada pela Dinamarca – vice campeã olímpica em 1908 – para bater a frágil Noruega com destaque para dois golos de Sophus Nielsen, o melhor marcador do torneio anterior. Por último, a Holanda eclipsava o sonho do mestre Hugo Meisl em levar a Áustria ao topo do Mundo, após uma vitória de 3-1.

Pódio final igual ao de Londres 1908

Depois de dois intensos dias de futebol (29 e 30 de junho) o torneio olímpico fazia uma pausa antes das empolgantes meias finais. Pausa no torneio olímpico mas não no futebol, já que a 1 de julho jogou-se a 1ª fase do recém criado Torneio de Consolação, integrado pelas equipas eliminadas até então. E se Itália e Áustria conseguiram vitórias sofridas (por 1-0) ante, respetivamente, Suécia e Noruega, já a Alemanha tirou a barriga de misérias e esmagou a Rússia por 16-0 (!). Um jogo onde o alemão Gottfried Fuchs teve o seu minuto de fama enquanto futebolista ao apontar nada mais nada menos do que 10 dos 16 tentos da sua equipa. Com esta performance Fuchs igualava o dinamarquês Sophus Nielsen que quatro anos antes havia apontado o mesmo número de golos no jogo da meia final diante da França.
A 2 de julho disputaram-se então as tão esperadas meias finais do torneio olímpico. E tal como o ocorrido em 1908 Grã-Bretanha e Dinamarca qualificaram-se para o jogo decisivo após inquestionáveis vitórias sobre Finlândia (4-0, com quatro golos da autoria de Harold Walden) e Holanda (4-1), respetivamente.
Holandeses que tal como em Londres haveriam de ficar com o bronze, depois de no dia 4 de julho terem goleado em Rasunda a Finlândia por 9-0, um pesado score onde se destacou Jan Vos, autor de cinco golos.
E nesse mesmo dia, no Estádio Olímpico, perante o olhar de 25 000 espetadores, britânicos e dinamarqueses repetiram a final de 1908 em busca do ouro. E tal como então a Grã-Bretanha foi... mais forte. Como se já não bastasse o azar de não poder contar com um dos seus principais jogadores, Poul Nielsen, a Dinamarca viu-se reduzida a 10 elementos à passagem do minuto 15 em virtude do médio Charles Buchwald ter abandonado o relvado lesionado. Ora, como na época não eram permitidas substituições os nórdicos tiveram de enfrentar a forte armada britânica com menos um atleta, complicando ainda mais a missão de chegar ao ouro.
Cinco minutos antes do infortúnio de Buchwald já a Grã-Bretanha se havia adiantado no marcador graças a um remate do goleador Harold Walden. Ainda na etapa inicial Gordon Hoare dilataria a vantagem dos campeões olímpicos à passagem do minuto 22, para 5 minutos volvidos Ole Anthon Olsen reduzir para os nórdicos. O carrossel britânico não iria ficar por aqui, e ainda antes do intervalo Gordon Hoare e Arthur Berry davam mais duas machadadas nos fragilizados dinamarqueses ao ampliarem o marcador para 4-1, e dissipando praticamente as dúvidas quanto ao vencedor do torneio olímpico. Perante o cenário que estava a ser edificado em Estocolmo só mesmo uma catástrofe iria impedir os britânicos – conduzidos pelo seu capitão de equipa, e principal referência, Vivian Woodward – de sucederem a si próprios no trono do futebol olímpico. E assim foi. O melhor que a Dinamarca conseguiu fazer na etapa final foi reduzir as desvantagem para 2-4, graças a um novo golo de Ole Anthon Olsen, insuficiente para impedir a (re)coroação da Grã-Bretanha como a melhor seleção do Mundo.
Já o torneio de consolação seria ganho no dia seguinte à principal final pela Hungria, que no encontro decisivo batia a Áustria por 3-0.
Mas para a história Grã-Bretanha seria o nome que mais iria reluzir na altura de recordar o torneio olímpico de Estocolmo em 1912, o da Grã-Bretanha e dos seguintes artesões de mais um memorável momento do futebol de terras de Sua Majestade: Ronald Brebner, Arthur Berry, Thomas Burn, Joseph Dines, Edward Hanney, Gordon Hoare, Arthur Knight, Henry Littlewort, Douglas McWhirter, Ivan Sharpe, Harold Stamper, Harold Walden, Vivian Woodward, e Edward Wright.

A figura: Gottfried Fuchs

A nível individual o inglês Harold Walden pode ter vencido o prémio de melhor marcador do(s) torneio(s) mas as luzes da ribalta foram direcionadas para o alemão Gottfried Fuchs, o homem que no primeiro jogo da sua seleção no certame dos derrotados, isto é, o Torneio de Consolação, apontou 10 dos 16 golos com que os alemães bateram a Rússia. Este foi mesmo o “minuto de fama” de Fuchs no planeta da bola, um homem que nasceu a 3 de maio de 1889 em Karlsruher e que cujo currículo de futebolista não vai além daquele célebre jogo das Olímpiadas de Estocolmo onde igualou o recorde do dinamarquês Sophus Nielsen. Judeu, Fuchs foi forçado a deixar o seu país pouco depois da façanha obtida diante da Rússia, para fugir ao Holcausto que vitimou milhares de judeus. O Canadá acolheu Gottfried Fuchs, que viria a morrer em Montreal em 1972, com 82 anos de idade.

Futebol português fez-se representar... no atletismo

Por esta altura do século XX Portugal ainda não havia criado o seu combinado nacional, algo que só viria a acontecer em 1921. Porém um ilustre futebolista lusitano daquela época viajou até Estocolmo para representar as cores nacionais. De seu nome Francisco Stromp, nome mítico do futebol do Sporting Clube Portugal da década de 10 do século passado que esteve em Estocolmo como praticante de... atlestismo. A aventura de Stromp foi no entanto curta, já que não foi além das eliminatórias da prova dos 100m, explicando no seu regresso a Portugal que esta eliminação precoce se tinha ficado a dever ao facto da prova em que participou ter decorrido pouco depois da cerimónia de abertura dos jogos, cerimónia essa onde ele havia ficado cerca de uma hora e meia de pé debaixo de um calor insuportável!


Resultados (Torneio Olímpico):

1ª Fase

29 de junho


Itália – Finlândia: 2-3
(Golos: Bontadini, Sardi / Ohman, Soinio, Wiberg)

Alemanha – Áustria: 1-5
(Golos: Jager / Merz (2), Studnicka, Neubauer, Cimera)

Suécia – Holanda: 3-4
(Golos: Swensson (2), Borjesson / Vos (2), Bouvij (2)

Quartos-de-final

30 de junho


Rússia – Finlândia: 1-2
(Golos: Butusov / Wiberg, Ohman)

Grã-Bretanha – Hungria: 7-0
(Golos: Walden (6), Woodward)

Dinamarca – Noruega: 7-0
(Golos: Olsen (3), Nielsen (2), Wolfhagen, Middelboe)
Holanda – Áustria: 3-1
(Golos: Vos, Ten Cate, Bouvij / Mueller)

Meias-finais

2 de julho

Grã-Bretanha – Finlândia: 4-0
(Golos: Wladen (4))
Dinamarca – Holanda: 4-1
(Golos: Jorgensen, Olsen (2), Nielsen / Hansen (p.b.))

Medalha de bronze

4 de julho


Holanda – Finlândia: 9-0
(Golos: Vos (5), Van der Sluis (2), De Groot (2))

Medalha de Ouro (final)

4 de julho

Grã-Bretanha – Dinamarca: 4-2


Estádio: Olímpico de Estocolmo (Suécia)

Árbitro: Christiaan Groothoff (Holanda)

Grã-Bretanha: Ronald brebner, Thomas Burn, Arthur Knight, Douglas McWhirter, Horace Littlewort, James Dines, Arthur Berry, Vivian Woodward, Harold Walden, Gordon Hoare, Ivan Sharpe.

Dinamarca: Sophus Hansen, Nils Middelboe, Harald Hansen, Charles Buchwald, Emil Jorgensen, Paul Berth, Oskar Nielsen, Axel Thufvesson, Ole Anthon Olsen, Sophus Nielsen, Vilhelm Wolfhagen

Golos: 1-0 (Walden, aos 10m), 2-0 (Hoare, aos 22m), 2-1 (Olsen, aos 27m), 3-1 (Hoare, aos 41m), 4-1 (Berry, aos 43m), 4-2 (Olsen, aos 81m)

Vídeo: GRÃ-BRETANHA - DINAMARCA (Final)

Resultados (Torneio de Consolação):

1ª Fase

1 de julho


Áustria – Noruega: 1-0
(Golo: Neubauer)

Suécia – Itália: 0-1
(Golo: Bontadini)

Alemanha – Rússia: 16-0
(Golos: Fuchs (10), Forderer (4), Burger, Oberle)

Meias-finais

3 de julho


Alemanha – Hungria: 1-3
(Golos: Forderer / Schlosser (3))

Itália – Áustria: 1-5
(Golos: Berardo / Grundwald (2), Mueller, Hussak, Studnicka)

Final

5 de julho


Hungria – Áustria: 3-0
(Golos: Bodnar, Schlosser, Pataki)

Legenda das fotografias:
1-Cartaz oficial dos Jogos Olímpicos de 1912
2-A pomposa cerimónia de abertura
3-O inglês Harold Wladen, melhor marcador dos jogos com 11 golos
4-Imagem da final entre Grã-Bretanha e Dinamarca
5-Nova imagem do jogo do título
6-O alemão Fuchs, autor de 10 golos num único jogo
7-Um lance entre italianos e finlandeses
8-Imagem do Áustria - Alemanha
9-Momento do equilibrado duelo entre suecos e holandeses
10-Britânicos não vassilaram ante os magiares
11-Seleção austríaca
12-Duelo entre britânicos e finlandeses
13-A equipa da Holanda
14-Britânicos tentam atacar a baliza dinamrquesa durante a final olímpica
15-Os campeões olímpicos de 1912
16-Seleção russa
17- Hungria, a campeã do Torneio de Consolação

segunda-feira, fevereiro 13, 2012

Futebol nos Jogos Olímpicos (1)... Londres 1908

Inauguramos hoje uma nova vitrina no Museu Virtual do Futebol, um novo recanto que se ergue com a intenção de recordar os factos e histórias de uma competição vista hoje em dia – ou desde sempre na verdade – como menor no reino do futebol internacional. Popular ou não ela foi no entanto a primeira grande prova planetária disputada por seleções, tendo sido olhada por muitos como o embrião daquilo o que viria a ser o Campeonato do Mundo. Sem mais demoras vamos dar início a uma – por certo – encantadora viagem pelo planeta do futebol no seio dos Jogos Olímpicos, onde a bordo da “máquina do tempo” viajaremos até 1908 para vivenciar um pouco daquilo o que foi a primeira edição oficial de um torneio olímpico de futebol.
Londres acolheu a 4ª edição do sonho de Pierre de Coubertin, um idealista francês nascido em Paris a 1 de janeiro de 1863 que em adolescente fazia das escarpas de Étretat (Normandia) o seu esconderijo predileto e de onde a sua mente viajava pelo longo mar azul que dali se deparava ante o seu olhar que o levava até aos feitos ocorridos em Olimpia descobertos por si, enquanto menino, nos livros que guardavam as epopeias dos heróis – ou mitos – da Grécia antiga. Fascinado por essas míticas olímpiadas o jovem Pierre sonhava em ressuscitar os jogos para a Idade Moderna, fazendo renascer um espírito olímpico que unisse o mundo e ao mesmo tempo endeusasse o homem...
1896 é um ano histórico para a humanidade, o ano em que o sonho de Pierre se torna em realidade, cabendo à Grécia – só podia ser – a honra de albergar os primeiros Jogos Olímpicos da era moderna.
Por esta altura o futebol ganhava contornos crescentes de popularidade um pouco por todo o mundo, sendo que em Inglaterra era já profissional desde 1885! Profissionalismo que era encarado por Coubertin como o inimigo da verdadeira essência dos Jogos Olímpicos, os quais, para o barão francês, deveriam assentar, tal como na Grécia antiga, na pureza do amadorismo.
Talvez por isto, ou não (há quem diga que a falta de participantes foi o facto responsável pela ausência daquele que é hoje denominado de “desporto rei” dos primeiros Jogos Olímpicos modernos), o futebol não tenha tido lugar cativo na 1ª edição das Olímpiadas modernas, sendo que a bola apenas começou a saltar pela primeira vez num evento deste género em 1900, nos Jogos realizados em Paris, mas apenas como modalidade de... exibição. Isto é, não oficial... segundo os desígnios da FIFA, pese embora o Comité Olímpico Internacional (COI) tenha reconhecido posteriormente como oficiais as primeiras aparições da modalidade nas Olímpiadas.
Procedimento semelhante foi repetido quatro anos mais tarde, durante as Olimpíadas de Saint Louis, onde tal como em Paris o torneio de futebol foi disputado por clubes amadores ou equipas oriundas de universidades, ao invés de seleções nacionais como mais tarde viria a acontecer. Quer em Paris quer em Saint Louis os torneios de futebol não tiveram mais do que três equipas a participar (!), sendo que na bela capital francesa o certame foi vencido pelo conjunto do Upton Park, que representava a Grã-Bretanha, ao passo que na cidade norte amereicana o título – se é que assim pode ser chamado – ficou na posse do Galt City, combinado oriundo do Canáda.
Coincidência ou não com a criação da FIFA em 1904 o futebol passou a ser um dos atores oficiais das Olíimpadas, cabendo à entidade máxima do futebol global apenas a tarefa de supervisionar o primeiro torneio olímpico de futebol oficial. Tudo sobre o olhar desconfiado do COI, que continuava a repovar a profissionalismo do futebol, afastando-o do nobre e puro amadorismo que deveria cercar – em seu entender – a essência do desporto. Porém, convencidos pela Football Association (Federação Inglesa de Futebol) e pelo presidente de então da FIFA, o inglês Daniel Burley Woolfall, o COI deu permissão para que o futebol entrasse para a família olímpica.

O pontapé de saída...

E foi sob o signo do amadorismo que em 1908 se deu o pontapé de saída do primeiro torneio olímpico de futebol, com a gigante Londres a testemunhar um acontecimento histórico que muitos classificam como o... primeiro Campeonato do Mundo. De facto ainda estávamos a 22 anos de distância do “verdadeiro” Campeonato do Mundo, da primeira edição daquele que com o passar dos anos se tornou no maior evento desportivo do planeta, maior que os próprios Jogos Olímpicos (!), podendo este ser considerado como o embrião do grande certame sonhado anos mais tarde pela FIFA através da mente do seu imortal presidente Jules Rimet.
A Londres chegaram quatro seleções nacionais, ou melhor cinco, pois a França fez-se representar por duas equipas, as quais se juntavam à formação da casa, a Grã-Bretanha (combinado que integrava Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda) e ainda Suécia, Dinamarca, e Holanda. Estes foram os convidados do torneio. Sim, convidados, pois convém sublinhar que não existiu propriamente uma fase de qualificação para o torneio olímpico, mas sim uma série de convites enviados pelo COI às diversas federações europeias (só!) com o intuito de as trazer até Londres. Contudo apenas seis (!) dessas federações responderam afirmativamente ao convite, tendo sido elas a França, Suécia, Dinamarca, Holanda, Hungria e Boêmia (antiga denominação da atual República Checa). Com tão poucas equipas o COI deu permissão então para que a França trouxesse às Olimpíadas de 1908 duas equipas de futebol.
Porém, a poucos dias do início do torneio o rei do império austro-hungaro proibiu – devido a razões de ordem política – as seleções da Hungria e da Boêmia de se deslocarem a Londres, reduzindo ainda mais o lote de participantes do torneio olímpico.
Conclusão, se já havia nascido pobre – face à ausência dos melhores jogadores e seleções da época, profissionais, claro está – mais pobre ficou com a desistência daqueles dois países.
O “circo” estava já montado e como tal havia que dar início ao espetáculo com mais ou menos equipas do que o previsto. Assim a data de 19 de outubro de 1908 entra para a história como o dia em que pela primeira vez duas seleções nacionais disputaram uma partida a contar para uma competição oficial. Os ilustres intervenientes? Dinamarca e a França, ou melhor, a segunda equipa da França. Desde logo ficaria evidente que este torneio olímpico de futebol dificilmente iria arrastar até si os holofotes da fama, ou da atenção dos populares, isto a julgar pelo baixo número de espetadores que marcaram presença nos seis jogos da competição. Estranho, se julgarmos que este torneio olímpico decorreia na pátria do futebol moderno onde cada vez mais pessoas se deixavam enfeitiçar pelo belo jogo. Contudo parace que os ingleses estavam mais interessados nos desenlaces da sua FA Cup (Taça de Inglaterra), a competição mais antiga do Mundo, a qual de ano para ano se tornava mais competitiva e popular entre os súbitos de Sua Majestade.
Não admira pois que no jogo inaugural do torneio olímpico o White City – o estádio onde decorreram os Jogos Olímpicos de 1908 – apresentasse um desolador cenário composto por duas mil pessoas!
Lá em baixo, na relva, os dinamarqueses esmagaram os “b” franceses por concludentes 9-0, sendo quatro desses golos da autoria do avançado Vilhelm Wolfhagen. No outro encontro da 1ª fase a Grã-Bretanha atropelou, como seria de esperar, os suecos por 12-1 com destque para o poker (quatro golos obtidos) de Claude Purnell.

22 golos nas meias finais!!!

Chegados às meias finais algo de invulgar – pelo menos nos dias de hoje – ocorreu em White City. Em dois jogos foram marcados nada mais nada menos do que 22 golos! É verdade, mais de duas dezenas de festejos que levariam a Grã-Bretanha e a Dinamarca para a grande decisão do torneio olímpico de futebol de 1908.
Os dinamarqueses voltaram a medir forças com a armada francesa, desta feita a França “a”, que a julgar pelo resultado era bem inferior aos seus conterrâneos “b”. 17-1 para os escandinavos (!), resultado histórico para o qual muito contribuiu o até então desconhecido – mundialmente – Sophus Nielsen, autor de 10 golos! Um feito presenciado por... 1000 espetadores! Desolador, sem dúvida.
No outro jogo das meias finais o resultado obtido pelo conjunto da casa seria hoje em dia rotulado de goleada, porém pelo que até então se via no relvado do White City a Grã-Bretanha passou à final com uma magra vitória diante da Holanda por... 4-0.

Franceses desistem do bronze antes do esperado ouro britânico

Na corrida para a medalha de bronze a França retirou a sua equipa principal da “linha de partida”, aparentemente pela vergonha da humilhação sofrida na meia final ante a Dinamarca, pelo que em sua substituição avançaram os suecos, repescados da 1ª fase. E na disputa pela medalha de bronze os holandeses levariam a melhor sobre os nórdicos por duas bolas a zero.
A grande final – marcada para 24 de outubro – foi presenciada por oito mil espetadores, a assistência mais numerosa do torneio olímpico até então, na sua grande maioria adeptos da seleção britânica, a grande favorita para a conquista do primeiro ouro olímpico na história do futebol. Da teoria à prática o caminho não foi longo. Porém, foi suado. Pela frente os britânicos encontraram uma equipa forte liderada pela temível dupla goleadora composta por Sophus Nielsen e Vilhelm Wolfhagen, autores de 18 dos 26 golos apontados pelos dinamarqueses nos dois encontros anteriores, e que prometiam fazer frente à turma capitaneada por Vivian Woodward.
No final, e após muito trabalho, a Grâ-Bretanha vencia a Dinamarca por 2-0 graças ao instinto matador de Frederick Chapman e do capitão Woodward, sagrando-se assim a primeira campeã olímpica da história... ou para muitos o primeiro campeão do Mundo de futebol.
O seu a seu dono teriam pensado os inventores do futebol moderno naquele momento, o ouro olímpico ficava em casa, no domicílio dos mestres dos futebol, e para a eternidade ficavam gravados a letras de ouro – doutra forma não podia ser – no Olimpo dos Deuses do desporto os nomes de Horace Bailey, Arthur Berry, Frederick Chapman, Walter Corbett, Harold Hardman, Robert Hawkes, Kenneth Hunt, Clyde Purnell, Herbert Smith, Henry Stapley, e Vivian Woodward, os primeiros campeões olímpicos de futebol. Na sua grande maioria eram estudantes universitários, que viviam o futebol de uma forma amadora, claro está, esperando pelo convite de alguma equipa profissional do futebol inglês. E alguns destes nomes vieram-no a conseguir.

Sophus Nielsen: a figura

O ouro olímpico pode ter ficado em terras britânicas, como muitos anteciparam na entrada para o torneio, mas as luzes da ribalta do modesto torneio de futebol dos Jogos Olímpicos de 1908 recairam todas sobre o dinamarquês Sophus Nielsen, o desconhecido – até então – que entrou para a história da modalidade por ter apontado 10 golos num só jogo de futebol.
A façanha ocorreu a 22 de outubro, com o White City como cenário daquela meia final entre Dinamarca e França “a”.
Sophus Erhard Nielsen nasceu a 15 de março de 1888 em Copenhaga e começou a sua promissora carreira no Concordia quando ainda adolescente. Poderoso avançado logo deu nas vistas, sendo que ainda com a tenra idade de 14 anos aceitou o convite do Frem, clube onde chegou ao escalão de sénior e onde desenvolveu a maior parte da sua carreira. No tempo em que o profissionalismo era coisa apenas de ingleses Nielsen trabalhava como ferreiro juntamente com o seu irmão Carl Nielsen, também ele futebolista nas horas vagas.
Em 1910 os dois irmãos viram-se a braços com o desemprego pelo que tentaram a sua sorte fora de portas. Viajaram pela Europa e chegados à cidade alemã de Kiel o presidente da equipa local ofereceu-lhes emprego na condição de aceitarem jogar pela sua equipa no escalão máximo do futebol germânico. Aceitaram, mas inexplicavelmente ali ficaram apenas uma temporada. E inexplicavelmente porque Sophus apontou uns impressionantes 72 golos em 18 jogos disputados, números mais do que suficientes para jogar por qualquer equipa amadora... ou profissional. Mas Sophus prefreriu voltar a casa e ao seu Frem, onde jogaria até 1921, ano em que pendurou as botas com um impressionante registo de 125 golos em 137 encontros! Defendeu a seleção do seu país por 20 ocasiões, tendo feito 16 golos, 11 deles nos Jogos Olímpicos de 1908. Voltaria a marcar presença nas Olimpíadas de 1912, em Estocolmo, conquistando uma nova medalha de prata após cair na final diante da armada da... Grã-Bretanha, numa reedição daquilo o que se passou em Londres quatro anos antes. Nos Jogos de Estocolmo não foi tão letal como havia sido em Londres, tendo visto o seu recorde de 10 golos num só jogo ter sido igualado pelo alemão Gottfried Fuchs. O melhor marcador do torneio olímpico de 1908 morreria na sua cidade a 6 de agosto de 1963 aos 75 anos.

Resultados:

1ª Fase


19 de outubro

França “b” - Dinamarca: 0-9
(Golos: Nils Middelboe (2), Vilhelm Wolfhagen (4) Harald Bohr (2), Sophus Nielsen

20 de outubro

Grã-Bretanha – Suécia: 12-1
(Golos: Frederick Chapman , Arthur Berry, Vivian Woodward (2), Harold Stapley (2), Claude Purnell (4), Robert Hawkes (2) / Gustaf BergstromMeias finais

22 de outubro

França “a” - Dinamarca: 1-17
(Golos: Sophus Nielsen (10), Vilhelm Wolfhagen (4), August Lindgren (2), Nils Middelboe / Emile Sartorius

Grã-Bretanha – Holanda: 4-0
(Golos: Harold Stapley (4))

Medalha de Bronze

23 de outubro

Holanda – Suécia: 2-0
(Golos: Gerard Reeman, Edu Snethlage

24 de outubro

Medalha de ouro (Final)

Grã-Bretanha – Dinamarca: 2-0

Estádio: White City, em Londres (8000 espetadores)

Árbitro: John Lewis (Inglaterra)

Grá-Bretanha: Horace Bailey, Walter Corbett, Herbert Smith, Kenneth Hunt, Frederick Chapman, Robert Hawkes, Arthur Berry, Vivian Woordward, Harold Staplay, Claude Purnell, Harold Hardman.

Dinamarca: Ludvig Drescher, Charles Buchwald, Harald Hansen, Harald Bohr, Kristian Middelboe, Nils Middelboe, Oskar Nielsen Norland, August Lindgren, Sophus Nielsen , Vilhelm Wolfhagen, Bjorn Rasmussen.

Golos: 1-0 (Frederick Chapman, aos 20m), 2-0 (Vivian Woorward, aos 46m)

Legenda das fotografias:
1-O barão Pierre de Coubertin
2-"Imagem" oficial dos Jogos Olímpicos de Londres em 1908
3-O estádio White City, a casa das Olimpíadas de 1908
4-Uma imagem esbatida da luta pelo ouro olímpico
5-A estrela do torneio: Sophus Nielsen
6-O talentoso capitão britânico Vivian Woordward
7-Seleção da Suécia
8-Grã-Bretanha: os primeiros campeões olímpicos da história do futebol

Nota: Texto redigido ao abrigo do novo Acordo Ortográfico