sexta-feira, outubro 20, 2023

Efemérides do Futebol (48)...

Um ângulo de Vidal Pinheiro ainda pelado

O último golo da 1.ª Divisão Nacional marcado num pelado

A presente época desportiva tem a particularidade de assinalar o 40.º aniversário da última vez que se jogou futebol num campo pelado – ou de terra batida – no escalão maior de Portugal. Este facto leva-nos mais longe ao recordar o último golo marcado num retângulo pelado no escalão maior do futebol nacional. Estávamos na temporada de 83/84 e o Campo Eng. Vidal Pinheiro, casa do popular Salgueiros, era a exceção à regra no panorama da 1.ª Divisão Nacional, isto é, era o único campo pelado dos 16 clubes que competiram nessa temporada naquele escalão. Cerca de dois anos antes a Federação Portuguesa de Futebol havia estipulado que na temporada de 84/85 todos os clubes que disputassem a 1.ª Divisão Nacional teriam de ter os seus campos relvados, caso coso contrário teriam de jogar em casa emprestada sempre que atuassem na condição de visitados. O anúncio era feito com duas épocas de antecedência, de modo a que os clubes com aspirações a pisar os palcos de primeira pudessem planear o arrelvamento dos seus campos. O Salgueiros foi pois o último clube da 1.ª Divisão a competir num pelado e fê-lo até à última, ou seja, até à derradeira jornada do Nacional de 83/84. Jornada decisiva para muitas equipas que lutavam pela permanência entre a elite do futebol luso, entre estas o próprio Salgueiros, que precisava de ganhar obrigatoriamente ao vizinho Boavista para garantir a manutenção. Octávio Machado havia iniciado a temporada ao comando dos encarnados do Norte, fazendo deste modo a sua estreia no papel de treinador principal, depois de uma época antes ter pendurado as chuteiras. O Palmelão, como é conhecido Octávio, não se aguenta até ao fim da linha, é substituído por António Jesus que dali a nada dá o lugar ao guarda-redes António Fidalgo. O antigo guardião de Benfica e Sporting é a opção de risco dos responsáveis salgueiristas para salvar a equipa da descida. De risco porque Fidalgo assumiu o cargo na condição de jogador-treinador, isto é, ele defendia pela primeira vez as redes do emblema de Vidal Pinheiro, onde só permaneceu uma época, e não possuía experiência enquanto treinador. Aliás, após esta curta e vitoriosa, como veremos adiante, experiência, Fidalgo ainda jogou durante mais duas temporadas, abraçando a profissão de treinador em exclusivo só a partir de 87/88. Desde fevereiro de 1984 no comando da equipa Fidalgo chega à derradeira jornada do Nacional da 1.ª Divisão, disputada a 13 de maio, a depender não só de si como de uma série de outras equipas para se salvar. Era preciso um milagre, mas estávamos a 13 de maio… e tudo era possível. 


O Salgueiros de 83/84

Como era seu apanágio sempre que o Salgueiros lá atuava o Campo Eng. Vidal Pinheiro estava à pinha. Repleto. O Boavista surgia em campo tranquilo, sem nada a ganhar ou a perder, já que o comboio da Europa tinha sido perdido poucas jornadas antes. Henrique Calisto era o treinador dos axadrezados que tinham em João Alves, o luvas pretas, a sua maior estrela. No banco boavisteiro estava ainda um tal de Zoran Filipovic, avançado da então Jugoslávia, e que anos mais tarde como treinador haveria de fazer furor curiosamente ali mesmo, em Vidal Pinheiro. Mas voltemos à decisiva e emotiva tarde de 13 de maio. Os adeptos salgueiristas estavam de olhos no pelado de Vidal Pinheiro e de ouvidos nas Antas, em Alvalade, em Guimarães e em Vila do Conde, locais onde jogavam adversários diretos do seu clube na fuga quer à despromoção direta quer à liguilha/play-off pela manutenção. Foi uma tarde de sofrimento mas que começou praticamente de forma eufórica com o tão desejado golo do Salgueiros. Penteado foi o seu autor. Estavam decorridos 16 minutos quando Nelito cruza para a área pelo flanco esquerdo do seu ataque onde aparece Penteado que de cabeça faz um chapéu ao jugoslavo Petar Borota. O Salgueiros aguentou até final estoicamente a magra vantagem, numa jogo que as crónicas rotularam de fraco e em diversos momentos confuso. O Salgueiros de Fidalgo deixou de lado a nota artística optando por vestir o fato macaco para jogar feio quando teve de o fazer em defesa da vitória que viria a alcançar. Após o apito final de Rosa Santos a festa tomou conta de Vidal Pinheiro, não só porque o Salgueiros tinha vencido mas por nas Antas o Estoril tinha perdido por 8-0, em Alvalade o Farense havia sido derrotado por 4-0, em Guimarães o Penafiel perdeu por 1-0, e em Vila do Conde o Águeda foi derrotado por 5-1. Conclusão, o Salgueiral tinha ganho em todos os campos e estava safo. Ia continuar na 1.ª Divisão Nacional.

 

Fidalgo, o jogador/treinador que salvou o Salgueiros
da descida é levado em ombros no final do jogo

Quanto a Penteado a história reserva-lhe assim um lugar de destaque, já que o seu golo foi o último a ser marcado num campo pelado num encontro da 1.ª Divisão. Manuel Penteado que havia precisamente chegado a Vidal Pinheiro em 83/84, vindo do FC Porto, em rota de colisão dom José Maria Pedroto, que lhe tinha prometido mais oportunidades no ataque portista e não cumpriu. Octávio em boa hora o convenceu a abandonar as Antas e a rumar a Vidal Pinheiro.   
Penteado, autor do último golo num jogo da
1.ª Divisão disputado num pelado

Para a história aqui fica a ficha do último jogo da 1.ª Divisão Nacional disputado num pelado: Campo Eng. Vidal Pinheiro, no Porto. Árbitro: Rosa Santos, de Beja, auxiliado por Francisco Lobo e Marcolino Baptista. Salgueiros: Pinto, Carlos Ribeiro, Soares I, Germano, Jorginho, Luís Pereira (Matias, 83), Silva, Carvalho, Joy, Penteado (Armando, 78) e Nelito. Treinador: António Fidalgo. Suplentes não utilizados: Soares II, João, e António Manuel. Boavista: Borota, Queiró, Adão (Figueiredo, 27), Frederico, Teixeira, Barbosa, Almeidinha, João Alves, Palhares, Coelho e Vitorino. Treinador: Henrique Calisto. Suplentes não utlizados: Matos, José Manuel, Bravo e Zoran Filipovic.

Vídeo do último golo marcado num campo pelado na 1.ª Divisão Nacional