Como diria o lendário Gary Lineker «o futebol é um jogo de 11 contra 11... mas no final ganha a Alamenha», um chavão que nem sempre teve contornos de veracidade no rescaldo dos intensos e empolgantes duelos travados pelos dois velhos inimigos... Inglaterra e Alemanha. Duas super-potências do futebol global que pelo seu próprio punho escreveram muitas das mais brilhantes páginas desta nobre modalidade ao longo de décadas. Ver um Inglaterra – Alemanha, ou vice-versa, na montra de uma grande competição é presenciar uma espécie de final antecipada, é o jogo grande dessa mesma competição, é um duelo de gigantes. Hoje vamos recordar os escaldantes e inolvidáveis embates entre britânicos e germânicos nos palcos dos dois maiores eventos de futebol do planeta, o Mundial e o Europeu.
1966
Quiseram os Deuses da bola que o primeiro embate dos dois gigantes tivesse como palco a catedral das catedrais do futebol, o Estádio de Wembley, em Londres.
E para dar mais brilho a este primeiro confronto nada melhor do que este ser jogado numa... final, o jogo decisivo do Campeonato do Mundo de 1966, o Mundial inglês em todos os sentidos.
Pela primeira e única vez na sua história – até à data – os súbitos de Sua Majestade organizavam o maior evento desportivo do planeta, sendo o título Mundial a meta exigida pelos apaixonados adeptos ingleses a Bobby Charlton e companhia.
Pois bem, entre altos e baixos patenteados ao longo do percurso o que é certo é que a Inglaterra estava no jogo decisivo do seu Mundial, e muitos terão pensado que o mais difícil estava feito, e que agora era só derrotar a não menos irregular – ao longo da prova – Alemanha Ocidental.
Um forte optimismo e um Wembley – com 93.000 almas, na sua esmagadora maioria britânicas – a fervilhar de entusiasmo eram teoricamente argumentos fortíssimos para coroar a Inglaterra como rainha do Mundo, mas, como dizem os mais antigos, da teoria à prática o caminho é longo e por vezes engandor, e a Alemanha entrou a matar, como se diz na gíria, tendo com naturalidade feito, ao minuto 12, o 1-0 por intermédio de Haller. E dizemos com naturalidade pois a equipa da casa entrou em campo num ritmo muito lento, perro, visivelmente desgastada pelo duro confronto das meias-finais mantido dias antes com Portugal de Eusébio e companhia.
Com o “tiro” de Haller Wembley socumbiu, gelou por completo, a barulheira entusiástica deu lugar ao silêncio... mas por pouco tempo. O homem que haveria de se tornar no herói desta memorável final, Geoff Hurst, faria o empate seis minutos depois, resgatando assim a euforia para Wembley.
Na 2ª parte o equilíbrio reinou no relvado sagrado da catedral naquela tarde de 30 de Julho de 1966, pese embora o maior poder de recuperação de esforço inglês se tivesse feito notar ao longo destes segundos 45 minutos. E mais do que notar transformou-se em actos concretos, o mesmo é dizer golos, já que aos 77 minutos Peters colocava pela primeira vez a selecção dos “3 leões” na frente.
Nesta altura Wembley transformou-se numa autêntica bomba relógio na sequência de uma enorme explosão de alegria. Entoavam-se cânticos aos novos campeões do Mundo. Mas... os alemães pareciam não ter gostado destes festejos antecipados e mesmo debilitados fisicamente conseguiam chegar à igualdade a um (!) minuto dos 90. Wembley gelou novamente perante o golo de Weber. Seguiu-se o prolongamento... onde o surreal aconteceu. Apesar de tudo mais frescos fisicamente os ingleses partiram para cima do exército alemão e aos 101 minutos Hurst envia a bola à parte inferior da trave da baliza alemã tendo esta pingado para o relvado junto da linha de golo. Foi golo, não foi? A dúvida tomou conta de Wembley. Depois de consultar o seu juíz de linha o suíço Dienst valida o golo perante a revolta dos alemães e a euforia dos ingleses.
O tento desanimou os visitantes, por assim dizer, que já na 2ª parte do tempo extra levaram a machadada final (aos 89 minutos) novamente por intermédio de Geoff Hurst, que assim se tornava no único jogador a fazer três golos numa final de Campeonato do Mundo. E mais do que isso a Inglaterra era Campeã Mundial. Tudo tinha assim acabado dentro do inicialmente previsto.
1970
Cidade de Leon, no México, 14 de Junho 1970, a República Federal da Alemanha tem uma oportunidade de ouro para vingar a derrota averbada quatro anos antes diante do velho inimigo britânico. O cenário de novo e escaldante duelo é novamente o Mundial de futebol, neste ano realizado no México. E escaldante em duplo significado, pois sobre Leon pairava um calor intenso e sufocante de... 46 graus!!! Como se já não bastasse terem de se superar ambos os conjuntos tinham também de lutar contra o calor, o qual seria o principal adversário de ambos.
O jogo foi por isso muito disputado e bastante duro sobre o aspecto físico. Mullery fez em cima do apito para o intervalo (45 minutos) o 1-0 para os campeões do Mundo em título, para depois aos cinco minutos da etapa complementar Peters aumentar para 2-0. Face às altas temperaturas que provocavam um claro desgaste nos jogadores em campo previa-se que ainda não era desta que os alemães iriam levar a melhor sobre os ingleses, mas mais uma vez as previsões falharam, e aos 23 minutos Beckenbauer reduziu, para depois Uwe Seeler empatar o jogo quando faltavam nove minutos para o final.
1966 voltava a repetir-se, Inglaterra e Alemanha iriam para prolongamento. Levariam novamente a melhor Bobby Charlton e companhia? O “bombardeiro” Gerd Muller respondeu que não, já que aos 108 minutos desfez a igualdade e colocava a sua equipa na meia-final. A vingança estava consumada. A aventura dos alemães no Mundial do México terminaria no jogo seguinte diante da Itália, numa meia-final electrizante e épica que foi concluida com um 4-3 a favor dos transalpinos.
1982
12 anos foram precisos para os dois velhos inimigos voltarem a esgrimir argumentos numa grande fase final. Tal aconteceu em Espanha, em 1982, e mais uma vez na fase final de um Campeonato do Mundo. Madrid, e o seu majestoso Santiago Bernabéu foram a 29 de Junho desse ano o palco da pobre cimeira futebolística. E pobre porque este foi talvez o duelo mais morno entre as duas selecções conforme traduz o nulo registado no final dos 90 minutos de um jogo alusivo à 1ª jornada do Grupo 2 da 2ª fase do citado Mundial. E não foi por falta de artistas que a contenda assim terminou, pois em campo estiveram naquela tarde alguns dos melhores futebolistas do planeta da época, casos dos alemães Karl-Heinz Rummenigge, Hrubesh, Uli Stielike, Paul Breitner, ou dos ingleses Peter Shilton, Bryan Robson, ou Kevin Keagan.
Num mini-grupo que era composto também pela Espanha seriam os alemães a chegar mais longe, e mais longe foi a final, onde à semelhança do ocorrido em 70, no México, ai na meia-final, tombariam aos pés da Itália.
1990
Mais uma vez com o cenário mais desejado como pano de fundo, o mesmo é dizer o Mundial, Alemanha e Inglaterra protagonizaram em solo italiano um dos clássicos mais intensos e de vencedor incerto da história. Turim e o seu Estádio dos Alpes testemunharam a 4 de Julho de 1990 este facto. Em jogo estava um lugar na final do Mundial 90, e quer de um lado quer do outro não faltavam estrelas capazes de colorir o céu da bela cidade italiana. Uma delas, Andy Brehme, fez aos 59 minutos o golo inaugural do jogo, para 21 minutos a estrela inglesa Gary Lineker repôr a igualdade com que se atingiu o término do tempo regulamentar.
Para não variar mais um prolongamento para decidir quem seguia em frente. Tempo extra que não deu em nada tendo então surgido a necessidade de se recorrer às sempre terríveis grandes penalidades. Aqui a lotaria saiu aos germânicos, muito por culpa dos falhanços de Stauart Pearce e Cris Waddle. De nada valeram as lágrimas de Paul Gascoigne, a Alemanha estava na final do Itália 90... onde iria sagrar-se pela terceira vez na sua história Campeã do Mundo (diante da Argentina).
1996
Depois de quatro confrontos em fases finais de Mundiais eis que Inglaterra e Alemanha esgrimiam argumentos pela primeira vez numa fase final de um Campeonato da Europa. E tal como 30 anos antes, aquando da estreia dos clássicos entre ambos, Wembley apadrinhou o “euro” duelo. Estreia era também o facto de a Inglaterra acolher um Europeu de futebol, pelo que tal como em 1966 os súbitos de Sua Majestade já sonhavam ver o capitão Tony Adams imitar Bobby Moore nesse célebre Mundial, ou seja, subir ao palanque real e erguer a Taça da Europa.
Contudo tal não aconteceu porque mais uma vez a lotaria das grandes penalidades saiu aos alemães depois de no tempo regulamentar se ter registado um empate a uma bola (Shearer marcou aos três minutos para a equipa da casa e Kuntz fez a igualdade ao minuto 16). No tiro ao alvo, isto é, nos penaltis, Southgate falhou o primeiro pontapé da segunda série (na primeira todas as grandes penalidades foram convertidas) e Andy Moller agradeceu fazendo o tento decisivo que colocava a Alemanha (unificada) na final. É caso para dizer que nunca a célebre frase proferida por Gary Lineker no final do Alemanha – Inglaterra de 1990 bateu tão certo... «o futebol é um jogo de 11 contra 11... e no final ganham os alemães». Pois é, e ganharam não só este duelo como também o Euro 96 (bateram na final a República Checa).
2000
Considerados como os grandes favoritos do Grupo A da fase final do Euro 2000 – realizado conjuntamente pela Holanda e Bélgica – Inglaterra e Alemanha subiram ao relvado do Estádio de Charleroi (Bélgica) a 17 de Junho desse ano numa fase conturbada das suas vidas. Por outras palavras, as suas equipas estavam numa profunda fase de remodelação, o que se vinha traduzindo em maus resultados ao longo dos últimos tempos, inclusive neste Euro, onde na 1ª jornada da fase de grupos a Alemanha não foi além de um sofrido empate com a Roménia, ao passo que a Inglaterra caiu aos pés de Portugal por 2-3.
Num jogo fraco levou melhor a Inglaterra, que depois de duas eliminações consecutivas aos pés dos velhos inimigos venceria por 1-0, graças a um tento do seu goleador Alan Shearer aos 53 minutos. Uma vitória que de nada serviu, já que uma humilhante derrota com a Roménia na última jornada atirou a selecção dos “3 leões” para fora do Euro 2000, fazendo assim companhia à velha e desgastada Alemanha de Matthaus, que saiu da competição vergada a uma pesada derrota (0-3) perante as reservas de Portugal!
2010
De novo na fase final de um Mundial, desta feita no primeiro certame deste calibre organizado por um país africano, neste caso a África do Sul, a Inglaterra sofreu a maior humilhação perante o velho inimigo. 4-1 (!) nos oitavos-de-final da competição mandou para casa mais cedo uma selecção que se auto-intitulava como candidata ao trono Mundial. Como estavam enganados! Thomas Muller por duas vezes, Klose, e Podolski fizeram os tentos germânicos, ao passo que o desolador golo solitário da Inglaterra coube ao defesa Upson. A saga alemã neste Mundial terminaria nas meias-finais diante da futura campeão do Mundo, a Espanha.
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