segunda-feira, março 18, 2024

Histórias do Futebol em Portugal (48)… O último ato do Académico do Porto nos palcos da “Primeira” (Parte V)

A turma da Académica de Coimbra que disputou
a 1.ª Divisão Nacional em 1941/42


Chegamos ao último capítulo desta memória sobre a derradeira e longínqua – já lá vão 82 anos – aparição do histórico Académico do Porto na 1.ª Divisão Nacional. E começamos esta derradeira viagem pela vitória dos academistas do Porto ante os academistas de Coimbra, no Estádio do Lima. “Bola cá, bola lá”, assim se afigura o encontro nos primeiros minutos, com ambas as defesas em alerta permanente. E mais uma vez, o relvado do Lima é abençoado – ou não – pela chuva que caí à hora do encontro na cidade do Porto. «As duas equipas e o árbitro (o lisboeta João Vaz) heroicamente se aguentam no terreno» escreve o jornalista ao serviço do Norte Desportivo. A chuva faz com que a partida não desperte grande entusiasmo, visto que não é possível praticar-se um futebol vistoso, dadas as condições do relvado do Lima. Os de Coimbra são os que mais tentam remar contra a maré, com tentativas de avanços no terreno, mas são os academistas que nas vezes em que se aventuram na área contrária mais perigo lá têm semeado. A Académica tem razões de queixa do árbitro lisboeta, já que em duas ocasiões reclama penalty, por derrube a Gomes e a Armando, com o juiz a mandar seguir.  As más condições do terreno fazem com que o portuense Marques abandone temporariamente o relvado, aparentemente com queixas físicas. Até que aos 33 minutos o encontro conhece o primeiro grande sinal de interesse, o golo da Académica de Coimbra. «Nini, de longe, ensaia um pontapé que sai com violência e que Santiago não pôde deter». Quase de seguida o Académico espreita o empate, não fosse o guardião Acácio fazer uma estirada espetacular. Até que na entrada para os últimos cinco minutos da primeira parte, os portuenses chegam à igualdade. «Raul, lançado pela esquerda, serviu excelentemente Julinho, e quando Acácio se lhe lançava aos pés, aquele fez-lhe passar a bola sobre o corpo, para o fundo da rede». 



O golo espicaçou os anfitriões, que apenas dois minutos volvidos ampliaram a vantagem. O lance começa em Álvaro Pereira, que executa um centro para a cabeça de Marques – que, entretanto, já havia voltado ao campo –, que desvia o esférico para Raul, que também de cabeça faz o segundo para o Académico. E assim termina a primeira metade. No recomeço os estudantes de Coimbra surgem mais velozes e lançados ao ataque. «Parece que os visitantes vão dar tudo por tudo para modificar a feição do encontro. Aparecem jogadas, agora mais claras, por parte dos visitantes». E numa delas Lemos tem uma fuga pelo centro do terreno, e de seguida cruza para a cabeça de Armando fazer o segundo tento da Briosa para espanto de Santiago. Este golo despertou os portuenses, que passaram a ter mais domínio no encontro, «obrigando os visitantes a ceder cantos em série». E como diz o ditado “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”, eis que Raul Castro fez o 3-2 final à passagem da hora de jogo, garantindo assim o triunfo dos alvi-negros, que nesta partida alinharam com: Santiago, António Jorge, Rafael, Manau, Marques, Eliseu, Álvaro Pereira, Gamboa, Julinho, Raul Castro e Raul.


Nova viagem de má memória ao sul de Portugal

Nesta sua derradeira aparição no Nacional da 1.ª Divisão não se pode dizer, muito longe disso, que as viagens ao sul do país tenham sido felizes para as hostes do Académico do Porto. Além dos 35 golos sofridos só na capital, os academistas encaixaram mais 13 (!) noutras deslocações a sul do Tejo. Isto é, aos cinco sofridos em Olhão na 8.ª jornada, averbaram mais oito na deslocação ao Barreiro. Caso para dizer que os ares do sul fizeram mal aos portuenses. No Campo do Rossio, «o Barreirense impôs uma toada rápida e de passes curtos que desconcertaram o adversário», escrevia o correspondente do Norte Desportivo. O jornalista retratava ainda que no primeiro quarto de hora, a equipa da “margem sul” «delineou avançadas vistosas a que os seus dianteiros deram boa conclusão». Por seu turno, o Académico alternou entre o bom e o mau, sendo que neste último capítulo o ataque esteve «muito irregular». Este encontro marcou ainda o regresso de Levy de Sousa à baliza academista, ele que apesar dos oito golos encaixados teve lances de bom desempenho, e talvez por isso no final da temporada tivesse rumado precisamente ao Barreirense. 8-1 a favor do conjunto do Barreiro num encontro em que o Académico apresentou o seguinte “onze”: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, António Silva, Marques, Eliseu, Larsen, Campos, Raul Castro, Julinho (que apontou o tento solitário dos portuenses) e Raul.


A vitória mais dilatada do Académico na 1.ª Divisão

E à 19.ª jornada o Académico do Porto tirou a barriga de misérias. E fê-lo à custa do Olhanense, que veio ao Lima “levar” nove! 9-0 foi o score daquela que foi a vitória mais robusta do combinado portuense nesta temporada. Aliás, este é o resultado mais dilatado alcançado pelos academistas nas suas cinco participações na 1.ª Divisão, estabelecendo, como tal, um recorde que perdura até hoje. A história deste encontro é simples de ser contada, e resume-se ao festival de golos do Académico, festival esse que começou mal a bola rolou pela primeira vez. Logo ao primeiro minuto Julinho marcou o primeiro na sequência de uma ação individual. Os alvi-negros dominavam os algarvios, e aos cinco minutos Raul Castro amplia a vantagem com um remate colocado. «O Olhanense parece sentir o piso relvado. A inconsistência das suas jogadas não lhes permite a realização de grandes feitos, pelo que o Académico se torna senhor da iniciativa e domínio», dizia o jornalista de serviço neste encontro, no sentido de explicar a apatia dos algarvios. Porém, a pouco e pouco os visitantes sacodem um pouco a pressão dos locais, embora sem conseguir criar perigo na baliza de Santiago. 

O Olhanense foi a vítima maior do Académico
na passagem dos portuenses pela 1.ª Divisão


O jogo perde alguma da sua beleza, dado os excessos de tentativas sem sucesso de jogadas individuais de parte a parte. Mas sobre o intervalo uma jogada individual de Julinho – que desta vez contrariou a tendência do individualismo de baixa qualidade – resultou numa grande penalidade, que Raul Castro converteu com êxito. 3-0, o resultado na saída para o descanso. No reatamento o Olhanense ainda dá um ar de sua graça, mas rapidamente o Académico esfria o ânimo algarvio e volta a assumir o controlo da partida. Aos 51 minutos Gamboa aponta o quarto tento dos academistas, que apenas três minutos volvidos veem Larsen fazer o 5-0. «Os algarvios acusam a ascendência do grupo local», e permitem que o mesmo Larsen dois minutos depois faça um novo golo. A avalanche dos portuenses não se ficaria por aqui, e Larsen, que teve uma tarde endiabrada, à passagem da hora de jogo, faz o 7-0. Aos 65 minutos foi a vez de Julinho voltar a fazer o gosto ao pé após uma série de dribles sobre os adversários, e a 10 minutos do fim este mesmo jogador, mesmo sendo carregado em falta, consegue faz o 9-0 com que foi selado o marcador. Inolvidável este jogo e o consequente resultado na história do futebol do Académico do Porto.

Os portuenses alinharam com: Santiago, António Jorge, Rafael, Manau, Eliseu, Marques, Álvaro Pereira, Gamboa, Julinho, Raul Castro e Neca.


Regresso às derrotas no meio da ventania de Leça da Palmeira

A festa duraria pouco, já que na semana seguinte uma curta viagem até Leça da Palmeira seria concluída por um desaire de 2-0 ante o conjunto local. O jornalista do Norte Desportivo, José Parreira, relata que os leceiros iniciam a partida a jogar contra o vento e que o duelo se desenrola com uma certa velocidade. As primeiras oportunidades de golo pertencem ao Leça, «que apesar de jogar contra o vento tem sido mais equipa». Por seu turno, o Académico só a partir da meia hora esboça uma reação, que não dura muito tempo. Na segunda metade, os leceiros, desta feita com o vento a seu favor, comandam abertamente a partida. «O Académico só esporadicamente aparece sobre a meia defesa dos locais. O goal custa a aparecer, as situações de perigo desenham-se continuamente junto dos postes de Levy (de Sousa), mas os dianteiros do Leça, umas vezes por falta de sorte, outras por pelos efeitos caprichosos que o vento imprime ao esférico, não encontram a finalidade desejada». Até que aos 65 minutos acontece uma “embrulhada” na área academista, e «Rocha, por entre um cacho de jogadores, atira a um canto, sem possibilidades para Levy (de Sousa)», abrindo assim o marcador. O Leça não abranda o ritmo, continua a dominar, e já sobre o final, Mendes tem um potente remate que o guardião academista não segurou e na recarga, oportuno, Lúcio fez o 2-0 final de um encontro onde o Académico alinhou com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Eliseu, Manau, Marques, Larsen, Gamboa, Julinho, Raul Castro e Carvalho.


Ânimos exaltados no duelo com os vizinhos da Invicta

Na penúltima ronda do campeonato e a precisar de pontuar para ainda ter esperanças de ficar na 1.ª Divisão, o Académico fez uma curtíssima viagem até ao Campo da Constituição, casa do vizinho FC Porto. Portistas que há muito já estavam afastados da luta pelo título de campeão, que estava já praticamente entregue ao Benfica. Sem nada a perder o FC Porto lança-se ao ataque, e logo nos minutos iniciais António Santos envia o esférico para o fundo das redes de Santiago, embora o árbitro invalide o golo por alegado fora de jogo do avançado da casa. Este foi o primeiro sinal de aviso do que iria acontecer logo aos 3 minutos, altura em que António Jorge carrega Correia Dias dentro de área. Desta feita, o árbitro Correia da Costa não tem dúvidas e assinala grande penalidade, a qual seria convertida precisamente por Correia Dias. «Os azuis e brancos usufruem maior quinhão de domínio, obrigando a defesa academista a um trabalho apurado», escreve o jornalista José Parreira. Com uma técnica mais apurada e maior pendor ofensivo, os portistas ameaçam continuamente a baliza de Santiago. Porém, aos 21 minutos o Académico tem uma oportunidade soberana para chegar à igualdade, quando numa das raras incursões à baliza de Béla Andrasik, o defesa Sárria mete mão à bola, com o juiz a apontar para a marca de castigo máximo. 

Correia Dias tenta furar a defesa academista


Na conversão, Raul Castro permite a defesa ao guarda-redes húngaro do FC Porto. Logo de seguida, Carlos Pratas envia uma bola ao poste, e já sob o intervalo este mesmo jogador faz o 2-0 a para os locais, resultado com que as equipas saem para o descanso. O jogo é retomado praticamente com o terceiro golo dos portistas, altura em que no meio de um aglomerado de jogadores na área de Santiago, Pratas é mais rápido a esticar a perna e rematar a bola para o fundo das malhas. O lance gera alguma confusão entre jogadores das duas equipas. António Santos e Eliseu agridem-se mutuamente, com o árbitro a expulsar o jogador do Académico e a deixar o portista em campo! Decisão incompreensível. Eliseu reclama da decisão, e o juiz é obrigado a chamar a polícia para retirar o atleta alvi-negro do terreno. Depois disto, Correia da Costa perde o controlo da partida, e acumula asneiras atrás de asneiras até final. Até que aos 21 minutos da etapa regulamentar Larsen foge aos adversários pelo flanco esquerdo, e aproveitando um dos raros deslizes de Andrasik faz o tento de honra do Académico, ainda assim insuficiente para evitar a derrota. Na Constituição, os academistas alinharam com: Santiago, António Jorge, Rafael, Manau, Eliseu, Marques, Raul Castro, Larsen, Gamboa, Julinho e Raul.


Despedida inglória do palco da “Primeira”

E eis que chegávamos à 22.ª e última jornada do Nacional da 1.ª Divisão de 41/42. Jornada decisiva para as duas equipas que mediam forças no Estádio do Lima, Académico e Carcavelinhos. O conjunto da capital tinha somente mais um ponto que os portuenses, sendo que a ambos só a vitória interessava para poderem continuar a sonhar com a permanência, visto que à mesma hora também o Olhanense lutava pelo mesmo objetivo. O encontro nem parecia de decisões, já que as bancadas do Lima se apresentavam despidas de público. Até ao minuto 10 o perigo rondou com mais insistência a baliza lisboeta, sendo que nas palavras do jornalista Bolero «o balanço ao quarto de hora dá vantagem territorial aos portuenses. Vinca-se a opinião que os academistas jogam melhor. Conduzem os seus ataques com mais método. O Carcavelinhos só a espaços elabora jogadas vistosas». Contudo, aos 20 minutos, contra a corrente do jogo os lisboetas marcam. Um cruzamento de Marques é bem aproveitado por Bernardo, que de cabeça bateu Santiago. O golo animou os rapazes de Alcântara, que passam a ter uma certa vantagem sobre o adversário. No entanto, até final do primeiro tempo o Académico recupera o comando da partida, atua mais próximo da área contrária, mas os seus avançados revelam pouca perícia na conclusão dos lances. A defesa também está nervosa, e Rafael quase oferece o segundo golo aos de Lisboa. Na segunda metade o encontro não muda de feição. «Joga-se mal de parte a parte e o entusiasmo pela luta também é escasso. A bola anda cá e lá em esquemas improvisados. Joga-se como calha e como a bola quer. O jogo quase não tem história», conta Bolero. A partir dos 55 minutos o Académico procura o golo com mais vontade, e o Carcavelinhos defende a sua magra vantagem com “unhas e dentes”. A partida caminha para o final, até que um balde de água fria cai sobre os lisboetas a três minutos dos 90, altura em que Larsen faz o empate. O resultado (1-1) não agrada a ninguém, já que ambas as equipas descem de divisão. O Académico despedia-se assim do principal palco do futebol português. Os portuenses encerraram o campeonato no 10.º lugar, com 13 pontos somados. Neste derradeiro encontro na “primeira” os academistas alinharam com: Santiago, Rafael, António Jorge, Manau, Américo, Gamboa, Raul, Marques, Larsen, Raul Castro e Julinho.

sexta-feira, março 15, 2024

Histórias do Futebol em Portugal (47)… O último ato do Académico do Porto nos palcos da “Primeira” (Parte IV)

A equipa do Benfica que se sagrou-se campeã nacional em 41/42,
época em que por duas vezes aplicou a chapa 4 ao Académico

12 de abril de 1942, dia de chuva na cidade do Porto, mas nada que impedisse o Estádio do Lima de registar uma boa casa na receção ao então líder do Campeonato Nacional da 1.ª Divisão, o Benfica. Facto curioso, o de os encarnados serem treinados pelo húngaro János Biri, que enquanto futebolista (foi guarda-redes) tinha passado pelo Académico do Porto, precisamente na época de estreia do campeonato nacional do escalão maior. Mas neste encontro com o Benfica a contar para a jornada 13 da época de 41/22, o Académico apresenta-se em campo sem um dos seus habituais titulares, o defesa António Jorge, um algarvio de gema que figura no top 10 dos jogadores com mais jogos realizados pelos academistas no escalão maior. Depois de os minutos iniciais serem de estudo mútuo, sem que a emoção empolgasse as bancadas do Lima, eis que «o Académico denota boa convicção no sentido de dar à pugna o máximo rendimento», escrevia o jornalista Domingos Castro. O Benfica respondeu de forma positiva à postura dos portuenses, e com uma «série de regulares combinações invade o terreno do Académico com mais insistência». E no seguimento dessas tentativas eis que Alfredo Valadas efetua um forte remate do lado esquerdo do seu ataque, com a bola ainda a raspar em Rafael e a aninhar-se no fundo das redes de Levy de Sousa. O golo trouxe mais alma aos benfiquistas, que assumiram o controlo da partida, e apenas um minuto volvido, em mais uma jogada de ataque bem conduzida, Nelo Barros aponta o segundo golo da tarde para os visitantes. «Os alvi-negros não acusam a desvantagem. Nota-se, no entanto, que mercê da vantagem do vento o Benfica insiste com mais frequência e Levy (de Sousa) é chamado várias vezes a intervir», analisava o jornalista do Norte Desportivo que esteve de serviço neste jogo. 



A partida continuava a ser disputada debaixo de chuva torrencial, e com o relvado do Lima alagado, ambas as equipas têm dificuldade em explanar o seu futebol. Ainda assim, o Benfica continua por cima dos acontecimentos, e só aos 35 minutos o guardião encarnado, Martins, é chamado a intervir com mais afinco. A partir daqui o Académico acreditou que podia fazer mais, e esse mais foi mesmo o golo, e Marques consegue-o na reta final da primeira parte. Com o relvado empapado o futebol joga-se de forma mais individual, e numa dessas jogadas a solo, Francisco Rodrigues tem uma investida pelo flanco direito, endossa depois a bola para Nelo Barros, que com um potente remate que leva a bola a bater na barrar e a dirigir-se depois para o fundo das redes. 3-1 para o Benfica na saída para o descanso. A chuva cai cada vez com mais intensidade no Porto, encharcando ainda mais o terreno de jogo. O Académico começa melhor. Álvaro Pereira dá o primeiro sinal de aviso no reatamento, com o esférico a sair ao lado. Depois disto o Benfica volta a invadir o meio campo contrário, tecnicamente os seus jogadores são mais evoluídos, e acima de tudo adaptam-se melhor às condições do tapete verde. E mercê da superioridade patenteada, eis que aos 65 minutos os benfiquistas chegam ao quarto golo. A jogada é feita entre Francisco Albino e Joaquim Teixeira, com este último, bem colocado em frente à baliza, a não dar hipóteses a Levy de Sousa. O jogo perde a partir daqui algum interesse, com o Benfica a gerir calmamente a folgada vantagem. Porém, em jogada de transição, Marques aproveita uma jogada confusa na área de Martins para estabelecer o resultado final 2-4 a favor dos lisboetas, que iriam chegar ao final desta maratona que é o campeonato nacional com o título de campeões no bolso.

Nesta partida o Académico jogou com: Levy de Sousa, Eliseu, Rafael, Manau, Guimarães, Gamboa, Raul Castro, Larsen, Julinho, Marques e Álvaro Pereira.


Pesadelo em Lisboa (parte III)

Aquela que seria a quinta e última viagem do Académico a Lisboa no âmbito desta edição do campeonato nacional, ficou saldada pela goelada mais pesada que a turma orientada por Albertino Andrade sofreu nesta época. 11-2 ante o Sporting. No Estádio do Lumiar pouco público, não só porque o adversário era pouco convidativo, mas de igual modo porque o Sporting de Joseph Szabo estava longe de encantar os seus adeptos. E na realidade o jogo teve pouco interesse, como contou o correspondente do Norte Desportivo na capital. «O Sporting venceu sem grandes dificuldades, e para tal não necessitou de se empregar a fundo. A sua defesa não teve muito que fazer, porque a linha de médios conseguiu tomar ascendente sobre o ataque contrário. A linha dianteira dos leões gisou alguns belos esquemas de jogo, atuando com um equilíbrio notável», analisou o jornalista destacado para este encontro.

Às mãos deste Sporting, o Académico sofreu a derrota
mas pesada da época: 11-2


Por sua vez, do lado do Académico só a defesa e o guarda-redes mereceram alguns elogios, sobretudo Levy de Sousa, que fez magníficas defesas. A linha de meio campo e o ataque academista «raramente tiveram jogadas capazes de permitir fácil seguimento». O Sporting foi inequivocamente superior, a prova disso é que ao intervalo a vantagem dos lisboetas era de 5-1. Na segunda metade o marcador foi dilatado… e de que maneira! Mais seis golos para os leões, sendo que ao décimo o azar bateu à porta do Académico. Levy de Sousa teve de sair do campo, por motivo de lesão, e numa altura em que ainda não havia substituições, Julinho foi para a baliza, ainda a tempo de a dois minutos do fim sofrer o 11.º golo do Sporting. E podiam ter sido mais, não fosse a defesa do Académico ter tido «o papel de mais relevo com algumas intervenções magníficas que obrigaram o Sporting a inutilizar algumas jogadas que aparentemente dariam pontos (golos)», elucidou o jornalista.

Com estes 11 golos sofridos, o Académico elevou para 35 o número de tentos encaixados na capital! Julinho e Raul Castro apontaram os tentos de honra dos academistas no jogo do Lumiar, sendo que os portuenses alinharam com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Guimarães, Eliseu, Larsen, Raul Castro, Julinho, Marques e Gamboa.


A vingança (ante o Unidos de Lisboa) serviu-se com três golos

Na 15.ª jornada o Académico obteve a sua quarta vitória na temporada, um triunfo que teve um certo sabor a vingança pelo que se tinha passado na primeira volta do campeonato. A turma portuense bateu no Lima, por 3-2, o Unidos de Lisboa, equipa esta que tinha derrotado os academistas por 10-1 em Lisboa. Foi mais uma partida disputada debaixo de chuva, que nas palavras do jornalista do Norte Desportivo, Joaquim de Castro, contribuiu para a má qualidade do futebol praticado. «Joga-se sem plano, definido à mercê do que o jogo dá», retratou o jornalista. O Unidos começa a registar um maior domínio territorial, com o Académico a ripostar, sendo que as suas incursões à área lisboeta eram sempre perigosas. «Numa delas Julinho passa em profundidade a Álvaro Pereira, que marca aos 16 minutos, imparavelmente, o primeiro goal do Académico. Este ponto parece despertar um pouco o ânimo do grupo academista que consegue usufrui um certo domínio», retratou Joaquim de Castro. Os portuenses acercam-se cada vez com mais perigo da baliza de Eduardo Santos, desperdiçando clamorosamente algumas oportunidades, como seria o caso de Marques após passe “açucarado” de Julinho. E como quem não marca sofre, o Unidos de Lisboa acaba por chegar à igualdade à passagem da meia hora. Arnaldo Carneiro desmarca Tanganho, que perante a indecisão da defesa local bateu Santiago, guarda-redes que substituiu neste encontro o habitual titular, Levy de Sousa. 

Álvaro Pereira


O jogo mudou de feição, isto, é o Unidos passou a dominar, ao passo que o Académico entregou-se em demasia aos trabalhos defensivos, permitindo aos lisboetas criarem várias ocasiões para ampliar o marcador. Não foi de estranhar que ainda antes do descanso, na marcação de um canto, «depois de uma embrulhada junto às redes de Santiago», Arnaldo Carneiro fizesse o 2-1 para os visitantes. Na segunda metade, e com o relvado do Lima alagado, o Académico surge com outra atitude, mais mandão, uma postura que seria premiada com a reviravolta no marcador. «O Unidos começa a sofrer um domínio dos academistas», até que num ataque pelo lado esquerdo, «Álvaro Pereira endossa a bola a Julinho, este parece perder a excelente oportunidade de passe, mas insiste e marca o segundo aos seis minutos», assim relatou o jornalista do Norte Desportivo. Arnaldo Carneiro ainda introduziu a bola na baliza de Santiago, mas o golo foi de pronto invalidado por nítido fora de jogo do avançado lisboeta. E eis que na sequência da marcação de um pontapé de canto Álvaro Pereira faz o golo da vitória (3-2) academista. E sobre este último futebolista, há que voltar a referir que a par de Levy de Sousa foi o único homem que esteve nas cinco participações do Académico do Porto na 1.ª Divisão Nacional. Mais do que isso, Álvaro Pereira é o jogador com mais jogos disputados pelos academistas na elite do futebol luso, 58 encontros para sermos mais precisos.

Diante do Unidos de Lisboa os portuenses alinharam com: Santiago, Rafael, António Jorge, Eliseu, Américo, Guimarães, Raul Castro, Gamboa, Larsen, Julinho e Álvaro Pereira.


Derrota tangencial no Campo do Benlhevai (Guimarães)

Na 16.ª jornada a equipa treinada por Albertino Andrade viajou até ao berço da nação, a Guimarães, para defrontar o Vitória local. Partida onde na primeira meia hora os academistas se mostraram «mais ao ataque, dando ensejo a que a extrema defesa dos vimaranenses brilhe em algumas intervenções decididas», escreveu o correspondente do Norte Desportivo encarregue de contar as incidências do encontro. Até que no último quarto de hora da primeira metade os locais ganharam ascendente, obrigado Santiago a intervir com redobrada atenção e perícia em duas ocasiões. 

Campo do Benlhevai (Guimarães)


Mas seria o Académico a abrir o marcador, por intermédio de Larsen, aos 26 minutos, na sequência de um canto apontado por Raul Castro. Pouco depois da meia hora Alexandre empata após um bom passe de Arlindo. Oito minutos volvidos o autor do primeiro tento dos vimaranenses bisou, depois de receber a bola dos pés de Ferraz. Na segunda metade, de nada valeu aos portuenses a pontaria afinada de Larsen, autor de mais dois tentos, já que Ferraz e Miguel asseguraram a vitória… do Vitória no Campo do Benlhevai por 4-3.

O Académico do Porto alinhou com: Santiago, António Jorge, Rafael, Manau, Eliseu, Marques, Raul Castro, Julinho, Larsen, Álvaro Pereira e Raul.

(continua)

quinta-feira, março 14, 2024

Histórias do Futebol em Portugal (46)… O último ato do Académico do Porto nos palcos da “Primeira” (Parte III)


Estreante nestas andanças de 1.ª Divisão Nacional era o Leça, clube modesto que nesta primeira aparição entre os “Grandes” se fazia representar na sua esmagadora maioria por jogadores da terra, todos amadores, e sem experiência no mais alto patamar do futebol luso. Leça que se deslocou ao Estádio do Lima na 9.ª jornada para disputar um «jogo de vizinhos» como lhe chamou o jornalista Bolero, do Norte Desportivo. Perante reduzida assistência a partida teve um início tímido, sendo que nos primeiros cinco minutos há apenas a registar uma oportunidade de golo perdida do academista Álvaro Pereira. Apesar de ser disputado a grande velocidade, o encontro não apresenta um padrão tático definido, o que o torna um pouco desinteressante. «Ambas as equipas jogam à base da energia, com uma ou outra jogada onde se vislumbra o desejo de conjunto (…) Uma e outra defesa, continuamente em ação, batalham ardorosamente. Se os setores dianteiro e médio têm trabalho sucessivo, o mesmo sucede com as extremas defesas, sempre na liça. Tem motivos de certo agrado esta partida entre leceiros e académicos», assim retratava Bolero.

A equipa do Leça que disputou a 1.ª Divisão em 41/42

À passagem da meia hora de jogo o Académico toma conta dos acontecimentos, perante um Leça que começa a dar sinais de alguma fraqueza à medida que se aproxima o intervalo. Levy de Sousa, guarda-redes do Académico do Porto, é um mero espectador, em contraste com Jaguaré – não o excêntrico guardião brasileiro que jogou no Académico anos antes, mas sim Alfredo Dias, conhecido pelo Jaguaré do Leça – que tem trabalhos redobrados. A avalanche academista produziu resultados antes do descanso, com Marques e Larsen a darem expressão ao marcador. A toada de jogo manteve-se na segunda metade, e quando estavam decorridos 62 minutos Raul Castro desfere um remate a cerca de 30 metros da baliza de Jaguaré, guardião que é traído pela trajetória da bola e não evita desta forma o terceiro tento dos portuenses. Tecnicamente o Académico era superior ao seu adversário, e o marcador seria fechado por Larsen a 15 minutos do fim, na sequência de um canto apontado por Machado. 4-0, vitória de um Académico que alinhou da seguinte forma: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Guimarães, Eliseu, Larsen, Raul Castro, Marques, Julinho e Álvaro Pereira.


O derby da Invicta pende para o lado azul-e-branco

E na 10.ª ronda houve aquele que foi o primeiro dérbi da Cidade Invicta no patamar mais alto do futebol em Portugal. Académico e FC Porto mediram forças no Lima. O jornalista Lopes Gaya conta que os portistas entraram em campo a pressionar os academistas, mostrando assim «certas tendências para abrir o ativo, porque aparecem com mais frequência no ataque. Levy (de Sousa) é chamado duas vezes a intervir, e fá-lo com certa felicidade a dois remates, um de Pinga e outro de António Santos». Após este começo mais afoito dos azuis e brancos o jogo entra numa toada de maior equilíbrio, com o Académico a espreitar com mais frequência o ataque, pese embora com a defesa portista sempre atenta. Até que à chegada da meia hora de jogo o FC Porto aplica dois rudes golpes ao Académico. O mesmo é dizer dois golos apontados quase de rajada. O primeiro por intermédio do possante avançado Correia Dias, aos 24 minutos, e o segundo dois minutos volvidos por Carlos Nunes. A equipa comandada pelo técnico Mihaly Siska saiu para o intervalo em vantagem, descanso esse que lhe parece ter feito mal, a julgar por uma entrada na segunda metade algo relaxada. Aproveitou o Académico que logo aos 10 minutos reduz a desvantagem. «Larsen lança um bom centro sobre a esquerda, a bola vai para Julinho que marca (passa) para Álvaro Pereira que fuzila rápido as redes de Béla (Andrasik)». A bola vai ao centro do terreno e… novo golo para o Académico. Julinho recebe a bola de um companheiro seu, e sem marcação corre em direção à baliza portista, rematando sem hipóteses para o fundo das redes. Estava feito o empate para delírio da claque do Académico, que «aplaude com entusiasmo a sua equipa». Do outro lado os adeptos do FC Porto também puxam pelo seu conjunto, e «estabelece-se um curioso duelo de claques. Um orfeão ruidoso a dar ambiente de espectativa ao encontro», descreveu Lopes Gaya. O FC Porto parece despertar da entrada sonolenta, e aos 65 minutos o árbitro Vieira da Costa assinala um livre perigoso para a baliza de Levy de Sousa. Na cobrança, António Baptista envia com habilidade a bola para o fundo da baliza academista, colocando novamente a sua equipa em vantagem. Aos 42 minutos, os portistas acabam com as esperanças dos seus vizinhos em pontuar. «Pratas desce e é carregado com certa violência. Pinga marca o castigo direto com um pontapé bem colocado e fixa o resultado em 4-2». No derby da Invicta o Académico alinhou com: Levy de Sousa, Rafael, António Jorge, Guimarães, Eliseu, Raul Castro, Larsen, Gamboa, Julinho, Marques e Álvaro Pereira.

Lance do dérbi da Cidade Invicta, entre Académico e FC Porto

Na derradeira jornada da primeira volta do campeonato o Académico voltou a não ser feliz na deslocação a Lisboa. Desta feita seria o Carcavelinhos a aplicar a chapa 6 aos portuenses. Sobre encontro não conseguimos encontrar o relato escrito das incidências do mesmo.

Treinador do Académico não atira a toalha ao chão

Conseguimos sim descobrir uma pequena entrevista concedida ao Norte Desportivo pelo treinador do Académico do Porto nesta temporada, Albertino Ferreira de Andrade, a sua graça. Nesta troca de palavras com aquele jornal portuense, o técnico fazia um balanço da primeira volta do campeonato, começando por opinar que tinha gostado de ver a equipa do Sporting em ação, e que em seu entender o FC Porto parecia querer regressar à boa forma do passado. 

O treinador do Académico:
Albertino Andrade

E sobre a sua equipa, Albertino Andrade não atirava a toalha ao chão, pelo contrário. «O orientador técnico do Académico parece, no entanto, não possuir fibra para o desânimo. (…) Sente na entrega à preparação física dos seus pupilos o melhor dos seus esforços. Percebe nos jogadores de futebol imensas deficiências, que procura corrigir, assim como determinados defeitos de formação». E mais adiante, ao falar dos resultados averbados até então, diz mesmo: «Pouca sorte, muito pouca sorte, é o que tem havido».


Nova viagem para esquecer à capital

O Início da segunda volta do campeonato marca uma nova viagem do emblema do Porto à capital, agora para defrontar o Belenenses, no mítico Estádio das Salésias. Os lisboetas vinham de uma vitória animadora no Campo da Constituição diante do FC Porto, na ronda anterior, e talvez por isso a massa adepta belenense fosse em grande número ver a sua equipa. Por seu turno, o Académico neste jogo «não foi melhor nem pior que noutras deslocações. A equipa, habilidosa por intermédio de alguns elementos, não tem fundo de resistência. No jogo de hoje transpareceu mais uma vez essa ideia. Em lampejos, o grupo consegue organizar algumas jogadas interessantes, mas com a sua linha de médios se divorcia muitas vezes do ataque, a equipa vive partida ao meio quase sempre», assim analisou a turma portuense o correspondente do Norte Desportivo na capital. O Belenenses entrou praticamente a ganhar, quando aos dois minutos Eliseu corta a bola com a mão dentro da área, com o árbitro setubalense Trindade a assinalar de pronto o castigo máximo. Na conversão, Feliciano marcou o primeiro tento dos azuis. O Belenenses teve quase sempre o ascendente do encontro, sendo que os campeões do Porto apenas se mostraram mais audazes no segundo quarto de hora da primeira parte. «De resto, a vontade mais forte foi a do Belenenses». Porém, contra a maré azul os academistas empatam a partida à passagem do minuto 19, por intermédio de Larsen. Empate que seria sol de pouca dura, já que três minutos passados António Jorge derruba Gilberto dentro da área e o árbitro não volta a ter dúvidas em assinalar nova grande penalidade a favor dos de Belém. Feliciano volta a não dar hipóteses de defesa a Levy de Sousa. E ainda antes do intervalo os locais ampliaram a vantagem, por intermédio de Artur Quaresma. «No segundo período, inicialmente, ainda o Académico se manteve com certa galhardia, mas depois o encontro entrou num período de certa monotonia dada a superioridade dos visitados», escrevia o Norte Desportivo. E seria dessa forma que Gilberto faria o quarto tento dos lisboetas, que praticamente sentenciou a partida, de nada valendo o facto de Larsen, aos 64 minutos, ter reduzido para 4-2, que seria, assim, o resultado final de um jogo onde o Académico alinhou com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Eliseu, Raul Castro, Larsen, Gamboa, Julinho, Marques e Álvaro Pereira.

(continua)

terça-feira, março 12, 2024

Histórias do Futebol em Portugal (45)… O último ato do Académico do Porto nos palcos da “Primeira” (Parte II)

Equipa do Vitória de Guimarães que em 41/42
foi a primeira vítima do Académico

Após quatro jornadas negativas, sem qualquer ponto somado e 19 golos encaixados, eis que à 5.ª jornada o Académico do Porto conhece a primeira das seis vitórias conquistados nesta época de 41/42. Uma partida disputada no Estádio do Lima, ante o Vitória de Guimarães, e em que nos primeiros minutos a bola foi muito disputada pelos dois combinados no miolo do terreno, sem que as duas balizas fossem, contudo, alvo de muitas ameaças, sendo a exceção protagonizadas pelos rapazes do Lima. «Academistas e vimaranenses disputam a bola com jogadas rápidas e pertencem aos locais as duas primeiras investidas em que se regista certo perigo, que Machado afasta com duas oportunas intervenções», contava o repórter ao serviço do Norte Desportivo nesse encontro. Marques e Raul Castro foram os homens do Académico que levaram a cabo essas ameaças à baliza do Vitória de Guimarães. Os visitantes só se organizaram após o primeiro quarto de hora, aparecendo mais no ataque. Neste período, uma jogada ofensiva pelo lado direito dos vimaranenses termina com uma atrapalhação do guarda-redes local, Levy de Sousa, valendo a atenção do seu companheiro Eliseu para sacudir a bola da área academista. Este seria, para sorte do Académico, um lance isolado em quase todo o jogo, já que os atacantes do Vitória mostravam «pouca decisão no remate final». Apesar disto o jogo corria de forma equilibrada, com “bola cá, bola lá”, e no derradeiro quarto de hora da primeira metade os dois guarda-redes são chamados a intervir com afinco. «As jogadas, porém, fazem-se com certa confusão, e só por isso as redes de qualquer dos grupos mantêm-se intactas quando o árbitro apita para o final do primeiro tempo», escrevia o jornalista de serviço. E seria na segunda parte que o Académico chegou aos golos. Primeiro, por Julinho, à passagem da hora de jogo. «Machado sai à jogada, a bola gira perto e Julinho acorre ao lance fazendo um tento aos três minutos».

Raul Castro com as 
cores do FC Porto ante 
de rumar ao Académico


O segundo festejo foi protagonizado por Raul Castro, na entrada para os 10 minutos finais. «Aos 36 minutos Julinho corre em direção a Machado, e Lino intervindo incorre em (grande) penalidade que Raul Castro transforma no segundo golo dos locais». Este último jogador apresentava-se como um dos mais reputados do plantel academista desta época. Chegou ao Académico com 29 anos, depois de ter estado durante sete temporadas ao serviço do vizinho FC Porto. Ao serviço dos azuis e brancos, Raul Augusto de Castro (nascido no dia 20 de maio de 1908) disputou 81 jogos oficiais, marcou 22 golos e conquistou nove títulos. Vestiu a camisola dos academistas durante cinco temporadas, entre 1937 e 1942. Com 53 jogos, Raul Castro foi o segundo jogador da história do Académico do Porto com mais partidas disputadas na 1.ª Divisão Nacional ao serviço deste clube.

Mas voltando ao encontro com o Vitória, para dizer que estava assim consumada a primeira vitória dos portuenses, que neste jogo alinharam com: Levy de Sousa, Rafael, Torres, Manau, Eliseu, Guimarães, Raul Castro, Gamboa, Álvaro Pereira, Marques e Julinho.


Alberto Gomes, a lenda do Académico que estava do outro lado da barricada

A euforia dos academistas durou pouco tempo, visto que na ronda seguinte voltaram a conhecer uma pesada derrota. Tal aconteceu na viagem a Coimbra, onde defrontaram a Académica. Estudantes que curiosamente eram orientados pelo jogador/treinador Alberto Gomes, uma antiga lenda do Académico do Porto, clube onde iniciou a sua brilhante carreira, antes de se transferir para a cidade do Mondego, onde fez história com a Briosa. Entre outros capítulos dourados, Alberto Gomes venceu a primeira edição da Taça de Portugal ao serviço da Académica.

Alberto Gomes


E no Campo de Santa Cruz, perante reduzida assistência, desde logo porque, e como escrevia o jornalista do Norte Desportivo presente, na sua última visita a Coimbra o Académico não tinha deixado boa impressão. Foi copiosamente goleado, e daí os adeptos da Académica pensarem que dificilmente os dois pontos fugiriam para o Porto. Porém, os portuenses mostraram outra imagem nesta visita. «No conjunto da partida de hoje, o Académico agradou mais do que na sua anterior visita. Houve mais equilíbrio nos seus setores. Todavia, aquele que mais agradou foi a defesa, pela sua decisão, no que se refere aos defesas e pela atenção ao jogo acusado por Levy (de Sousa), de facto um guarda-redes com personalidade», escrevia o jornalista, acrescentando que «porém, do trio defensivo para diante o grupo caiu bastante (…) No ataque houve toques inteligentes, desmarcações acertadas, mas na maioria do tempo faltou à linha ofensiva dos portuenses poder para lutar e para realizar».

Agradeceu assim a equipa da casa, que venceu por 6-3, com os tentos dos portuenses a pertencerem a Julinho (bisou) e Larsen.

Em Coimbra o Académico do Porto alinhou com o seguinte “onze”: Levy de Sousa, Rafael, António Jorge, Eliseu, Guimarães, Manau, Raul Castro, Larsen, Marques, Julinho e Gamboa.


Cá se fazem, cá se pagam! Que o diga o Barreirense

E na 7.ª jornada foi a vez do Académico do Porto atropelar, o mesmo será dizer, golear, um adversário seu nesta caminhada do Nacional da 1.ª Divisão de 41/42. A vítima foi o Barreirense, que levou do Estádio do Lima um cabaz de seis golos. Foram poucos os espectadores que assistiram a este encontro, desde logo porque a chuva caiu nesse dia sobre a cidade do Porto, afugentando o público do recinto. O Académico não poderia ter melhor entrada na partida, pois logo aos dois minutos «Julinho captou a bola e o defesa do Barreiro ficou pregado à relva. O jogador academista progrediu e sobre a direita desferiu um pontapé de baixo para cima. Baptista ainda abriu os braços, mas a bola levava letreiro», escrevia o jornalista do Norte Desportivo nesse jogo, que assinava como… Bolero! Bola ao centro e… novo golo do Académico. E novamente por intermédio de Julinho, que estava a ser um pesadelo para a defesa barreirense. Escrevia o jornalista Bolero que a relva estava a trair os visitantes! Pois é, há que ter em conta que o Estádio do Lima era a par do Estádio das Salésias o único campo relvado da então 1.ª Divisão Nacional, pelo que a esmagadora maioria dos futebolistas estava habituada a jogar em campos de terra batida. Pelos menos a julgar pela escorregadela do barreirense Pascoal, erro que permitiu a Álvaro Pereira aumentar a vantagem academista para 3-0. Os portuenses dominavam a partida, como deu conta Bolero, e nas raras vezes que o Barreirense subiu à área contrária lá estava Levy de Sousa, atento e seguro, a tapar os caminhos da sua baliza. Do outro lado do campo, o seu companheiro de posto, Baptista, vive em constante sobressalto. A pressão do Académico e constante, e os campeões de Setúbal raramente conseguem passar a linha do seu meio campo. «O engodo pela baliza do Barreirense é notório por parte do Académico», e não foi de estranhar que aos 57 minutos Julinho fizesse o 4-0, após ludibriar três adversários e a cerca da baliza disparar à queima roupa. «O Académico é sempre perigoso quando ataca, porque a defesa dos visitantes continua incerta», dava nota Bolero. E nesse sentido não foi difícil que Marques apontasse o quinto tento daquela tarde chuvosa. Mas o melhor estava reservado para o fim: o golo mais bonito, com uma cabeçada vistosa de Marques após centro de Larsen. 6-0.

Neste encontro o Académico alinhou com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Guimarães, Eliseu, Larsen, Raul Castro, Julinho, Marques e Álvaro Pereira.


A viagem mais longa terminou em nova derrota

E na 8.ª jornada os portuenses realizam a viagem mais longo desta sua última aventura na 1.ª Divisão. Foram até ao Algarve, mais precisamente até Olhão, onde mediram forças com o conjunto local. Foi um encontro que raramente teve brilho, conforme escreveu o Norte Desportivo, mas ainda assim o Olhanense puxou dos galões e venceu por 5-2. Do lado do Académico, Gamboa e Julinho marcaram, mas o melhor jogador em campo dos portuenses foi mesmo o guardião Levy de Sousa, que teve um naipe de boas intervenções que impediram uma goleada com contornos maiores. A propósito de Levy de Sousa, há que referir que ele foi o grande guarda-redes que defendeu as balizas dos portuenses na passagem destes pelo escalão maior. A par de Álvaro Pereira ele foi o único jogador que esteve nas cinco temporadas em que o Académico competiu na 1.ª Divisão. Esteve no Académico do Porto entre 1934 e 1942, e defendeu a baliza do clube no escalão maior em 33 jogos.

Levy de Sousa, histórico
guarda-redes do Académico

Em Olhão os portuenses alinharam com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Eliseu, Manau, Guimarães, Raul Castro, Larsen, Julinho, Marques e Gamboa.

(continua)

segunda-feira, março 11, 2024

Histórias do Futebol em Portugal (44)… O último ato do Académico do Porto nos palcos da “Primeira” (Parte I)

A equipa do Académico do Porto na época de 41/42, 
a última na 1.ª Divisão Nacional 

Apesar da palavra “futebol” fazer parte da designação deste histórico agente desportivo nascido na cidade do Porto há 113 anos, o que é certo é que este e o Belo Jogo andaram quase sempre em caminhos opostos no que a capítulos de glória diz respeito. Houve quem escrevesse – neste caso o distinto jornalista portuense Manuel Dias, no seu livro “Futebol no Porto” – que esta foi mesmo uma “relação” de azar, e que deixou, ou ainda deixa, alguma mágoa no seio da família deste mui nobre emblema portuense que é o Académico Futebol Clube. E é sobre a derradeira aparição do Académico do Porto entre a elite do futebol nacional – o mesmo será dizer a 1.ª Divisão Nacional – que iremos debruçar-nos nas próximas linhas. Sim, é verdade, o Académico faz parte da história do escalão maior do futebol nacional, cabendo-lhe mesmo o privilégio de ter sido um dos oito clubes que na temporada de 1934/35 inaugurou o Campeonato Nacional da 1.ª Divisão, nos dias de hoje denominado de I Liga. 

O majestoso Estádio do Lima, o primeiro grande estádio em Portugal

Voltando um pouco atrás nesta viagem ao passado, para recordar que foi o futebol que fez nascer o Académico, como indica, e já vimos, a sua própria designação. Contudo, com o passar dos anos o clube alargou a sua atividade a outras modalidades, que correram melhor, digamos, no plano desportivo do que o futebol. E mesmo o facto de o Académico ter sido o dono daquele que foi o primeiro grande estádio a ser construído em Portugal, o Estádio do Lima, não fez com que o clube se tornasse grande no Desporto Rei como seriam os seus vizinhos (em termos de proximidade) FC Porto e Salgueiros, a título de exemplo. As explicações para esta infelicidade dos academistas no futebol variam. O facto de ter precisamente como vizinhos de porta o FC Porto e o Salgueiros, ou simplesmente porque nunca se rendeu ao profissionalismo do futebol, são dois hipotéticos argumentos que até hoje não estão suficiente bem esclarecidos para justificar o insucesso do Académico no futebol. Mas há quem prefira ver no meio disto tudo o copo meio cheio, e encarar como um sucesso o facto de o Académico figurar no top 10 dos clubes com mais participações na primeira década de existência da 1.ª Divisão Nacional. Neste aspeto, o clube portuense só é superado pelo FC Porto, Benfica, Sporting, Belenenses, Académica de Coimbra e Vitória de Setúbal. Entre as épocas de 1934/35 e 1941/42, os alvi-negros, as cores deste nobre clube portuense, estiveram por cinco ocasiões no principal escalão do futebol português. E é então a última delas que hoje vamos recordar ao pormenor com o apoio das páginas de outro nobre – e hoje desaparecido – património do Porto, o jornal Norte Desportivo.


Pesadelo em Lisboa (parte I)

A derradeira aventura academista na 1.ª Divisão começou a 18 de janeiro de 1942, quando no mítico Estádio do Lima o Belenenses entrou com o pé direito no Nacional de 41/42, graças a um triunfo por 2-0. Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Eliseu, Manau, Torres, Marques, Raul Castro, Álvaro Pereira, Julinho e Larsen, formaram o “onze” do Académico neste encontro de estreia.
Uma semana mais tarde os portuenses viajaram até à capital para defrontar aquele que iria ser o campeão nacional desta temporada, o Benfica. E no Campo Grande «os encarnados encararam com à vontade» o seu jogo com o Académico, conforme dava nota o Norte Desportivo. 4-1 a favor dos benfiquistas, foi o resultado de uma partida onde o «Benfica só por intermitências deixou de conduzir a luta, e mesmo nesses períodos de reação, a defesa encarnada jogou com afoiteza bastante para se opor ao ataque inconsequente dos campeões portuenses». Nota de rodapé, o Académico regressava à 1.ª Divisão com o título de campeão regional do Porto no bolso. Mas voltando à crónica do jogo do Campo Grande, «o mesmo raramente teve emoção. Faltou a dança dos números para espevitar o interesse. O ataque do Benfica defrontou uma linha de médios pouco segura, e conseguiu construir bons ataques». O ataque do Benfica defrontou uma linha de médios pouco segura, e conseguiu construir bons ataques», assim relatava o jornalista que cobriu a partida. Foi, pois, com relativa facilidade que os benfiquistas penetraram na defensiva alvi-negra, fazendo com que Alfredo Valadas, Francisco Albino, Teixeirinha e Manuel da Costa batessem o guardião Levy de Sousa por quatro ocasiões. 

Julinho, estrela do Académico que
brilharia no Benfica

Do lado do Académico nem tudo foi mau ao olho do correspondente do Norte Desportivo. Eliseu destacou-se
«mais pela sua agressividade do que propriamente pelo bom jogo produzido. No ataque, Julinho e Marques foram as figuras mais em relevo». Julinho, esse mesmo, que na época seguinte iria assentar arraias em Lisboa, onde ao serviço do Benfica atingiu o caminho da glória ao longo de 10 temporadas consecutivas. Júlio Correia da Silva, o seu nome completo, foi figura de proa na conquista de três campeonatos nacionais, cinco Taças de Portugal e uma Taça Latina ao serviço dos encarnados. Pelo Benfica, Julinho revelou-se um avançado letal para os adversários, e a prová-lo os seus cerca de 200 golos apontados com a camisola encarnada. De novo com os olhos centrados nas memórias do jogo entre Benfica e Académico do Porto a contar para a 2.ª jornada do Nacional de 41/42, para recordar que os lisboetas não sentiram dificuldades em ficar com os dois pontos. Embora, «de quando em vez os portuenses mostraram lampejos de possuírem regular valor, mas foi sol de pouca dura…», dava conta o Norte Desportivo. Ainda assim, Julinho fez o tempo de honra de um Académico que alinhou com a seguinte formação: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Guimarães, Eliseu, Raul Castro, Julinho, Marques, Álvaro Pereira e Larsen.


Poderoso Sporting suou e… teve a sorte do seu lado no Lima

Na ronda seguinte um novo obstáculo surgiu no caminho dos academistas. Desta feita, era o campeão nacional em título, o Sporting que visitava o Estádio do Lima. Uma assistência numerosa marcou presença no majestoso recinto desportivo portuense para ver «a constelação de estrelas» leoninas, conforme escreveu o jornalista do Norte Desportivo presente na partida, José Parreira. Apesar do teórico desnível em termos de capacidade de argumentos para vencer, o jogo principia (às 15H05!) com relativo equilíbrio. O Sporting, «em pequenos pormenores aparece ao de cima, com um sistema de jogo mais claro, mais positivo», assim interpreta José Parreira. Contudo, a partida entra numa toada de parada e resposta, com os dois guarda-redes, Levy de Sousa, do lado do Académico, e Azevedo, do lado do Sporting, chamados a intervir com alguma regularidade. «O encontro tem fases de bom espetáculo. Prevê-se que qualquer um dos grupos marcará vantagem se iniciar primeiro o marcador, pois as duas balizas são visitadas com frequência. Os portuenses não se assustam perante a classe dos visitantes». Atente-se ao facto de já naquela altura os chamados Grandes do futebol luso sofrerem a bom sofrer sempre que visitam o reduto de um clube de menor nomeada futebolística, como era então o caso do Académico.

Azevedo salvou o Sporting no Lima 

De acordo com as palavras do jornalista José Parreira, as «redes do Sporting passam por transe aflitivo, mas Azevedo não consente que os portuenses transformem…», ou então quando não era o mítico guardião leonino a parar os ataques academistas, era o… azar a fazê-lo, como foi o exemplo de um remate portentoso de Raul Castro, que fez com que Azevedo deixasse escapar a bola por entre as mãos para a mesma sair a arrasar o poste. Lá está, o azar que o Académico tantas vezes teve ao longo da sua aventura futebolística também aqui teve um exemplo. E como quem não marca acaba sempre por sofrer, o Sporting chega à vantagem na sequência de um pontapé de canto apontado por Mourão, lance que é aproveitado por Paciência para abrir o marcador. O médio leonino beneficia do desnorte de Rafael, que tapou a visão do lance ao seu guarda-redes, para marcar. O tento espicaçou o Sporting, que cresceu no encontro e passou a ocupar mais vezes o meio campo contrário. Já o Académico aparecia agora menos vezes junto da baliza lisboeta, e quando o fazia os seus avançados «não tinham talento para conseguir desbravar a barreira oposta». Aproveita o Sporting para marcar o segundo tento da tarde, por intermédio de Cruz, que materializa assim a maior clarividência ofensiva dos campeões nacionais. Porém, o início da segunda metade volta a conhecer um Académico disposto a mudar o resultado. Os portuenses voltam a obrigar os leões a cuidados defensivos. Eliseu cabeceia uma bola à trave da baliza de Azevedo numa altura em que o Académico já fazia por justificar o golo. Mais uma vez o azar… «O Sporting cede cantos em série, permitindo franco domínio dos portuenses», escreve Parreira. No entanto, mais uma vez é o Sporting que lança os foguetes dos festejos de mais um golo, desta feita da autoria de Mourão, que leva a melhor num lance individual com Rafael. O Académico vê ainda Álvaro Pereira ser expulso por carga violenta sobre o sportinguista Canário, e mais do que isso conhece uma nova derrota (0-3). Ante o Sporting o Académico alinhou com: Levy de Sousa, António Jorge, Rafael, Manau, Eliseu, Guimarães, Raul Castro, Larsen, Marques, Álvaro Pereira e Julinho.


Pesadelo em Lisboa (parte II)

Na 4.ª jornada os portuenses têm uma nova deslocação a Lisboa, cidade que haveria de lhes ser maldita nesta última presença na 1.ª Divisão. Depois da derrota por 4-0 ante o Benfica seguiu-se um outro desaire, mas desta feita bem mais pesado. 10-1 a favor dos Unidos de Lisboa. Esta seria a segunda derrota mais avolumada averbada pelo Académico nesta época, superada apenas pelos 11-2 diante do Sporting na segunda volta do campeonato.
No Campo do Lumiar, e perante pouco público, encontravam-se duas equipas que lutavam pelos primeiros pontos no campeonato. «Todavia, os ex-cufistas estavam numa melhor situação, porque jogavam no seu ambiente, enquanto o Académico atuava num campo desconhecido, e este pormenor em grupos da mesma igualha tem uma importância especialíssima», assinalava o jornalista do Norte Desportivo que assistiu ao jogo. E de facto teve. O Unidos «venceu bem. (…) O seu setor defensivo teve uma tarefa que chegou a atingir o brilhantismo. Segurança no trio defensivo e belo trabalho dos médios. O ataque pôde destacar-se porque a linha intermediária do Académico vagueou muito», assim analisou o escriva

O Unidos de Lisboa destroçou o Académico na 4.ª jornada por... 10-1

Ainda antes da meia hora de jogo já os Unidos venciam por 5-0, de nada valendo o tento de Marques, aos 20 minutos, já que o descalabro continuou até à dezena de golos na segunda metade de uma partida onde o “onze” academista foi composto da seguinte forma: Levy de Sousa, Dias, Rafael, Guimarães, Eliseu, Raul Castro, Couto, Larsen, Marques, Julinho e Álvaro Pereira. Por esta altura, e com quatro jornadas disputadas o Académico ocupava a 12.ª e última posição, com zero pontos somados, a única equipa que ainda não havia somado qualquer ponto.

(continua)