sexta-feira, março 08, 2019

Histórias do Planeta da Bola (23)... Nita Carmona: o exemplo de coragem e paixão que ousou derrubar a barreira do preconceito e do machismo

Nita Carmona

Tal como em tantos outros setores da sociedade global o futebol ainda é visto no presente como um Mundo exclusivamente masculina! Por incrível que aparece assim é.  
Esta constatação vem a propósito do Dia Mundial da Mulher, que hoje se comemora em todo o planeta. E leva-nos numa viagem ao passado de quase um século de distância para recordar a história de uma mulher que teve a coragem de entrar num Mundo que lhe era proibido para dar azo à sua paixão: jogar futebol.
Nita Carmona, o nome da heroína que para derrubar a barreira da masculinidade no futebol teve de... se disfarçar de homem!
Nascida em Málaga (Espanha) a 16 de maio de 1908, Anita Carmona Ruiz desde criança, nas calles do Bairro de Capuchinos, onde vivia, contornou as rígidas regras sociais, digamos assim, da época para viver a sua grande paixão: jugar la pelota.
Filha mais nova de um estivador do Porto de Málaga, Nita apaixonou-se pelo Belo Jogo precisamente ali, onde marinheiros ingleses praticavam o football nos tempos livres. Desde criança que lutou contra o preconceito de ser mulher num Mundo a quem só era permitida a entrada a homens. Luta que começava no seu próprio lar, com os castigos impostos pelos seus pais, que ao ver a sua menina mais nova chegar a casa com os joelhos esfolados e arranhões por todo o corpo após longos e duros (por certo) duelos futebolísticos travados com os chicos de Málaga, decretavam de pronto a prisão domiciliária com o intuito de a impedir de voltar a correr atrás da sua paixão: a bola.

Nita, ao meio, disfarçada de Veleta!
O preconceito familiar chegou a determinada altura a ser estendido ao tio de Nita, médico de profissão, que alegava que a força física, o suor e a competitividade que eram características da prática do futebol estavam restritas aos homens, e que tal esforço iria ser prejudicial ao desenvolvimento corporal da sua sobrinha. Nesse sentido, pediu aos pais de Nita para a enviarem temporariamente para a localidade isolada de Vélez-Málaga para a afastar da tentação de jogar futebol.
Porém, nem todos pactuavam com o preconceito de apoiar e acima de tudo incentivar uma mulher a brilhar num Mundo de homens. Em 1921, chega ao Bairro de Capuchinos um padre... liberal. O padre Miguez. Oriundo de Ourense (Galiza) também ele se havia deixado enfeitiçar pela bola, e no âmbito da igreja fundou o Sporting de Málaga, que acabaria por ser uma das sementes para a criação anos mais tarde do atual Málaga Club de Fútbol.
Nita entrou para um clube cuja missão passava acima de tudo por angariar fundos para adquirir roupas e comida para os menino(a)s mais desfavorecidos do bairro, como colaboradora do massagista da equipa de futebol.
Terá sido esta a forma de o padre Miguez ajudar Nita a contornar a proibição dos seus progenitores em dar azo à sua paixão de menina. Paixão essa que ganhava vida nos jogos que o Sporting de Málaga realizava fora de portas, nos quais tinha um reforço de peso: Nita Carmona. Isto acontecia porque nos jogos caseiros corria o risco de ser reconhecida pela vizinhança!
Corpulenta, de feições rudes, cabelo curto, a jovem durante algum tempo conseguiu esconder em campo os seus traços femininos, usando calças cumpridas, camisas largas e cabelo curto. Após ter sido descoberta por uma qualquer equipa adversária, Nita foi mesmo enviada de castigo para Vélez-Málaga, para casa de familiares. Ali, continuou a lutar pela sua paixão, tendo então feito amizade com a irmã do capitão da equipa do Vélez, Juan Barranquero, o qual viria a convencer a deixá-la atuar pelo combinado local sob o nome (masculino) de... Veleta, para que não fosse descoberta nem por adversários nem pelos próprios colegas de equipa.

E sob este disfarce, Nita jogou vezes sem conta ao serviço do Vélez. Foi assim até meados da década de 30, quando teve início a Guerra Civil espanhola, altura em que Nita Carmona não conseguiu mais ludibriar a barreira do preconceito, acabando por ser descoberta e detida pelas autoridades em várias ocasiões, sendo que a sua condenação nunca foi mais longe sempre devido à influência (Divina) do padre Miguez.
Nita Carmona morreu jovem, com apenas 32 anos, mas para a História mais do que ter sido a primeira mulher-futebolista em Espanha foi um exemplo de coragem e paixão ousou derrubar a barreira do preconceito e do machismo numa sociedade tão desigual (entre homens e mulheres).

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