Muito poucos são hoje os testemunhos vivos de quem teve a honra e o privilégio de o ver jogar, e para estes não parecem existir dúvidas de que se ele vivesse nos dias de hoje seria um verdadeiro assombro – no bom sentido – dos relvados mundiais!
Contudo, a sua história tem tanto de encanto como de tragédia... como mais à frente iremos poder constatar. Senhoras e senhores visitantes a nossa lenda de hoje é José Manuel Soares, imortalizado no futebol como Pepe.
A 30 de Janeiro de 1908 no seio de uma família pobre de Belém (Lisboa) nasce aquele que viria a ser o maior ídolo do futebol português na década de 20 do século passado.
O seu nascimento aconteceu numa altura conturbada para Portugal, quer a nível social quer político. O povo passava fome numa época em que a Monarquia estava muito perto de ser substituida pela República. Aliás, neste aspecto é importante dizer que dois dias após o nascimento de Pepe dá-se o regicídio na Praça do Comércio que resultou na morte do rei D. Carlos e do seu filho o príncipe D. Luís Filipe.
Posteriormente o país mergulhou numa crise profunda que nem mesmo o nascimento da República (1910) suprimiu.
A infância de José Manuel Soares foi pois de profunda miséria, sendo que a única alegria dos meninos daquele tempo era única e simplesmente a bola de futebol.
Os primeiros passos da lenda...
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Não demoraria muito a sua ascensão até à equipa principal, a qual se daria um ano depois (1926) num confronto ante o Benfica no Campo das Amoreiras, duelo que terminaria 5-4 a favor do Belenenses, tendo Pepe apontado o golo do triunfo do seu clube. A sua exímia técnica aliada à sua velocidade estonteante e ao seu poderoso remate patenteados dali em diante fizeram com que fosse aclamado como o rei do futebol português.
De um dia para o outro Pepe tornou-se na alegria do povo. Em Belém, a zona onde continuava a residir numa pobre casa situada na Rua do Embaixador, não havia um único dia em que o seu nome fosse pronunciado com entusismo e vaidade. Mesmo sendo por aquela altura o habitante mais famoso de Belém o menino Pepe continuava humilde e... pobre, sim, porque o futebol não passava de uma brincadeira. Para ajudar a sua família foi trabalhar ainda moço para uma oficina de torneiro, para mais tarde passar a laborar no Centro de Aviação Naval.
De aspecto franzino o menino que todos os dias levava para o emprego um triste caldo para retemperar forças fazia magia nos campos de futebol em cada fim-de-semana com as cores do seu Belenenses. Carregou os azuis de Lisboa às costas nas conquistas dos campeonatos de Portugal de 1927 e 1929, bem como noutros tantos campeonatos de Lisboa. Entre 1928 e 1931 sagra-se naturalmente o melhor marcador do campeonato lisboeta, sendo que na temporada de 30/31 estabelece um recorde de 36 golos apontados em 14 encontros disputados!
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Mas nem só o Belenenses tirou partido do génio de Pepe, a própria selecção nacional também lhe fica a dever muitas vitórias e momentos inolvidáveis. Por 12 ocasiões ele vestiu a camisola das quinas, tendo com ela apontado sete golos.
Ele foi um dos notáveis que integrou o seleccionado português na primeira grande aparição deste numa competição à escala mundial: os Jogos Olímpicos. 1928 é o ano que assinala esse feito, ano em que Portugal fica às portas de uma medalha nas Olímpiadas de Amesterdão.
Estranha morte...
Consagrado a nível nacional e internacional a estrela de Pepe deixou de brilhar cedo, cedo demais, diria mesmo. Num dia como tantos outros o astro de Belém carrega na fria manhã de 24 de Outubro de 1931 o almoço preparado por sua mãe. Almoço é maneira de dizer, pois no bolso levava somente uma triste sande de chouriço que tinha sobrado do jantar da véspera. Chegada a pausa para o repasto Pepe leva o alimento à boca e horas depois é dado como morto no Hospital da Marinha, local para onde foi transportado assim que começou a sentir violentas dores abdominais e a ter hemorragias. Morreria às 10h30 da manhã, com apenas 23 anos... e um futuro – com toda a certeza – risonho ficou por percorrer.
As causas da morte muita tinta fizeram correr nos dias seguintes. Houve quem tivesse apontado ao assassinato... por invejosos do seu valor e popularidade. O envenenamento contudo não ficou senão a dever-se a um lapso – fatal – de sua mãe, a qual em vez de colocar bicarbonato de sódio na refeição colocou potassa, substância que iria destruir por completo o estômago do atleta.
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Pepe morreu e o país chorou dias a fio. O seu funeral foi uma prova colossal do carinho que o povo tinha por ele... 30.000 pessoas prestaram uma última homenagem ao rei do futebol português da década de 20.
Legenda das fotografias:
1- José Manuel Soares, futebolisticamente imortalizado como Pepe
2- Em acção - pelo seu Belenenses - contra o Sporting
3- Com as cores da Selecção Nacional
4- A multidão que marcou presença no funeral da lenda para um último adeus
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