quinta-feira, março 22, 2007

Emblemas Históricos (3)... Académica de Coimbra


À beira do Mondego nasceu Coimbra. Do Choupal. Da saudade. Fundada por alunos da universidade, no final do século XIX, surgiu a respeitosa Briosa". É com esta bela frase que começamos a nossa viagem de hoje pelo encantador Mundo do Futebol, para fazer uma visita à vitrina dos Emblemas Históricos, ao espaço sagrado dos grandes clubes/equipas que fizeram história no desporto-rei.
E o histórico clube de que hoje iremos falar dá pelo nome de Associação Académica de Coimbra, um emblema que carrega consigo uma impressionante e rica história. Apesar de não ter nas suas vitrinas as conquistas nacionais e internacionais que têm os três principais clubes portugueses (FC Porto, Benfica e Sporting) a Académica é um dos maiores emblemas do futebol lusitano. Um clube com uma mística ímpar. Um clube apaixonante. De tal maneira apaixonante que costuma-se até dizer que a Briosa (alcunha pelo qual é popularmente conhecida a Académica e que advém da forte entrega com que normalmente se batiam as equipas amadoras de estudantes mesmo contra equipas de atletas profissionais de alta competição) é, talvez, o clube com um maior número de simpatizantes no país...
É o clube mais antigo de Portugal, nasceu em 1887, fundado pelos estudantes da Associação Académica de Coimbra, da também mítica Universidade de Coimbra (UC). Um facto que permitiria que o clube, ao longo da sua centenária história, vivesse sempre envolto numa atmosfera única, ou seja, que a sua equipa de futebol principal fosse quase sempre composta por estudantes da UC.
O equipamento tradicional da Académica é integralmente negro, numa alusão evidente aos trajes académicos dos estudantes da universidade.
É igualmente um dos clubes mais eclécticos de Portugal, agregando modalidades como o andebol, atletismo, basquetebol, basebal, badminton, ginástica, hóquei em patins, judo, karaté, pugilismo, natação, ténis, rugby, voleibol, xadrez e futebol. E é nesta última modalidade que a estrela da Briosa mais brilhou ao longo dos anos. Em 120 anos de história a Briosa marcou presença no principal campeonato português (1ª Divisão Nacional) em 54 ocasiões, tendo como melhor classificação um 2º lugar na temporada de 66/67. Na competição que antecedeu o Campeonato Nacional da 1ª Divisão, o Campeonato de Portugal, a Académica foi vice-campeã na época 22/23. Em termos de títulos, alberga ainda nas suas vitrinas dois Campeonatos Nacionais da 2ª Divisão, conquistados nas temporadas de 48/49 e 72/73.
O primeiro clube a inscrever o seu nome na lista dos vencedores da Taça de Portugal
Mas é na Taça de Portugal que a Briosa escreveu a sua página mais brilhante. Corria a época 38/39 quando se disputou a 1ª edição da Taça de Portugal, tendo a primeira final da competição sido disputada entre a Académica de Coimbra e o SL Benfica a 25 de Junho de 1939. O palco do grande embate foi o extinto Campo das Salésias, em Lisboa. Para espanto dos espantos a Briosa sairia vencedora desse duelo, por 4-3, sendo desta forma a primeira equipa a inscrever o seu nome na lista dos vencedores da nobre competição portuguesa. Não querendo minimizar em breves linhas este glorioso e histórico momento vivido não só pela Académica como também pelo futebol português, o Museu Virtual do Futebol foi à sua extensa Biblioteca Futebolística "desenterrar" estes dois belíssimos artigos extraídos da enciclopédia "O Século do Desporto" (uma publicação do jornal A Bola) que descrevem na perfeição esta brilhante página:

Briosíssima

A 25 de Junho de 1939, nas Salésias, disputou-se a primeira final da Taça de Portugal. Entre a Académica e o Benfica. No Rossio, a caminho de Belém, os alfacinhas foram surpreendidos por danças e cantares, numa miscelânea de fogueiras de Coimbra e marchas lisboetas. A grande surpresa foi a superioridade técnica dos conimbricenses «até para os jogadores do Benfica», como escreveria no dia seguinte Ribeiro dos Reis. Ricardo Ornelas afinaria pelo mesmo diapasão: «Aparentemente a final de 1939 era para o Benfica. Os encarnados tinham mais experiência, mais jogadores habituados à relva, capacidade técnica para ganhar, vontade forte, publico dedicado, inclinação para as grandes dificuldades... As dúvidas opondo-se à aparência da vitória do Benfica tinham afinal razão de ser. A Académica conquistou a vitória da maneira mais brilhante. Os nervos pouco duraram, a relva não prejudicou o ataque e na defesa com pouca frequência apoquentou os jogadores pela táctica da proximidade dos adversários que a equipa inteligentemente adoptou; e a experiência dos encarnados foi derrotada desde os primeiros minutos pela autoridade de jogo dos estudantes na zona central do terreno».
Após o derradeiro apito do árbitro, António Palhinhas, 4 a 3... e a festa a negro...
O Diário de Coimbra, em metade da sua primeira página, noticiava à volta do emblema da Associação Académica de Coimbra: «Coimbra, desportista e profana, está em festa pela vitória alcançada ontem em Lisboa, pelo seu campeão de futebol a valorosa turma da Associação
Académica. Os estudantes, na própria terra do seu contendor - o não menos valoroso grupo do Sport Lisboa e Benfica -, souberam anular a desvantagem do ambiente e especialmente a do terreno e marcaram de forma superior o seu saber no meio futebolístico português, ganhando com absoluto mérito o título de campeão de Portugal do dilatado império».

Peripécias dos jogadores estudantes na primeira Taça...
Banco de pau castigo desfeito
Bernardo Pimenta marcou o primeiro golo da Académica. Professor, saíra de Coimbra de comboio namanhã do jogo - em terceira classe e assentos de madeira! Colocado em Bobadela, concelho de Oliveira do Hospital, durante esse ano escolar, treinava-se com a equipa do vilarejo e só ao sábado se juntava aos colegas de facto! «Depois de cinco horas na estafa da viagem, esperava-me um táxi que me conduziu ao Hotel Bragança, no Cais do Sodré, onde a equipa se hospedara para estágio. Almocei muito pouco pois o jogo realizava-se pelas 17 horas...»
César Machado, para não faltar às aulas, também não seguira na 5ª feira para Lisboa. Determinação que esteve para lhe ser fatal. «Resolvi dizer peremptoriamente ao Dr. Albano Paulo que não faltaria às aulas. Furioso, garantiu-me que então não jogaria a final. Como não era profissional sentia-me enfurecido, nervoso, e chorando fui para o ACM, onde dali a pouco estavam o capitão Pina Cabral, o Dr. Fausto, o Dr. Freitas, etc., que me foram injectar um calmante. Por não ter dinheiro para o comboio da claque fui à boleia com o capitão Pina Cabral. Chegados a Lisboa procurámos um modesto hotel, na Rua do Alecrim. De manhã levantei-me, almocei e segui para as Salésias... Como não tinha mais ninguém para pôr a jogar o Dr. Albano Paulo chamou-me e aquele foi o momento mais fabuloso da minha vida, da vida de todos nós, certamente. Ganhar ao Benfica, ganhar a primeira Taça de Portugal...»
Para a eternidade ficam os nomes dos obreiros desta grande conquista: Tibério Antunes, José Maria Antunes, César Machado, A. Portugal, Carlos Faustino, Octaviano, Manuel da Costa, Alberto Gomes, Arnaldo Carneiro, Nini e Bernardo Pimenta.
Os gloriosos anos 60 e 70
O clube viveria ainda nas décadas de 60 e 70 do século passado mais e novas glórias nos relvados nacionais e internacionais. Chegaria a mais três finais da Taça de Portugal (50/51, 66/67 e 68/69, tendo sido derrotado, respectivamente pelo Benfica, Vitória de Setúbal e novamente pelo Benfica).
Seria nestas duas décadas que a Briosa alcançaria as competições europeias de clubes, sendo que a estreia ocorreu na Taça das Cidades com Feiras (actual Taça UEFA), na época de 68/69, tendo a equipa sido afastada logo na 1ª eliminatória pelo Lyon de França por desempate de moeda ao ar, uma vez que a eliminatória terminou empatada a um golo.
Um ano mais tarde a Briosa viveria a sua maior epopeia nas competições europeias ao chegar aos ¼ de final da Taça das Taças. O percurso memorável na competição dessa época começou com a eliminação dos finlandeses do Kuopion Palloseura (com resultados de 0-0 e 1-0). Seguiram-se os poderosos alemães do Magdburgo (uma das melhores equipas europeias da época), que seriam afastados pelos estudantes com um resultado total de 2-1 (0-1 e 2-0). Nos ¼ de final coube em sorte - ou azar - à Académica outra forte equipa europeia, mais precisamente os ingleses do Manchester City. Depois de um empate a zero bolas no encontro da 1ª mão em Coimbra, a Briosa seria afastada da competição no jogo de Manchester em cima do minuto 30 do prolongamento, graças a um golo de Towers. O sonho da Briosa terminara ali, mas a presença nesta edição da Taça das Taças tornou-se histórica e inesquecível.
A última aparição numa competição europeia fez-se na época 71/72, na Taça UEFA, onde a Académica seria derrotada na 1ª eliminatória pelos ingleses do Wolverhampton (com um resultado total de 1-7).
Jogadores emblemáticos
Ao longos dos 120 anos de vida a Académica teve a defender a sua bonita camisola inúmeras figuras marcantes do futebol lusitano. Para além dos heróis da Taça de Portugal de 1939 destacamos como jogadores e treinadores mais marcantes da história do clube Artur Jorge (jogador e treinador), Mestre Cândido de Oliveira (treinador), Toni, Mário Campos, Vítor Campos, Gervásio (o jogador da Académica com mais jogos na 1ª Divisão, 329 no total), Mário Wilson, Maló, Jorge Humberto, Carlos Xavier, Capela, Manuel Dimas, Fernando Couto, Vítor Paneira, Sérgio Conceição, Manuel António (melhor marcador do Campeonato Nacional da 1ª Divisão 68/69, com 19 golos), Bentes (o melhor marcador do clube de todos os tempos na 1ª Divisão, com 134 golos) e mais recentemente Zé Castro.
Actualmente a Briosa disputa o principal campeonato português (denominado agora Superliga), embora muito longe dos gloriosos anos 60 e 70. A luta pela manutenção tem sido o objectivo da equipa nas últimas temporadas, objectivo esse que não tem sido fácil de atingir, já que normalmente só na derradeira jornada da competição os estudantes respiram de alívio. E para não fugir à regra a Académica versão 2006/07 vive dias de grandes instabilidade desportiva na Superliga portuguesa...
O guarda-redes Pedro Roma é a grande referência do clube na actualidade. O jogador, que vai já na sua 15ª temporada com o emblema da Briosa ao peito, é o guardião da mística do clube. Nomes como Vítor Vinha, Nuno Piloto (dois produtos da cantera do clube), Filipe Teixeira, Litos, Joeano e Pitbull são outros dos nomes mais populares da actual Briosa.
O palco das actuações caseiras da Académica é o Estádio Cidade de Coimbra (com capacidade para 30 000 lugares), um belo recinto desportivo que foi remodelado propositadamente para acolher dois encontros da fase final do Campeonato da Europa de Futebol de 2004.
Legendas das fotografias:
1- Emblema da Associação Académica de Coimbra
2- Vista da bela Cidade de Coimbra: berço da Briosa
3- A equipa que disputou a final da Taça de Portugal de 1969 envergando as tradicionais capas dos estudantes universitários durante a crise estudantil de finais dos anos 60
4- Uma equipa da Académica da década de 60, com Artur Jorge como a principal estrela
5- O onze da Briosa que defrontou o Manchester City, em Coimbra, para a 1ª mão dos 1/4 de final da Taça das Taças
6- Um histórico do clube, o Mestre Cândido de Oliveira
7- Artur Jorge, outros dos símbolos da Académica
8- O bonito Estádio Cidade de Coimbra

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