sexta-feira, abril 10, 2015

Histórias do Planeta da Bola (9)... Os anos dourados (1927-1939) da Taça Mitropa - A primeira montra de estrelas do futebol europeu (parte IV)

Matthias Sindelar, um dos mais virtuosos
futebolistas da História e a grande figura
da edição de 1933 da Mitropa Cup
Um céu repleto de estrelas, assim era vista a Taça Mitropa nos inícios dos anos 30. Uma deslumbrante constelação de estrelas dava cor a uma competição que em 1933 partia para sua sétima edição, e onde na qual aquela que foi talvez a estrela mais cintilante da história da Mitropa Cup teve a sua primeira aparição. Matthias Sindelar de seu nome, o Homem de Papel, ou o Mozart do futebol austríaco, uma lenda que vive na memória dos (poucos) comuns mortais - ainda entre nós - que o viram atuar e no imaginário de todos aqueles que lamentam não ter vivido no tempo em que este imortal do futebol espalhou (a sua) magia pelos retângulos do Velho Continente. Sindi - como era carinhosamente tratado pelos seus amigos e companheiros de equipa - foi então a estrela mais reluzente - não só pelo futebol que mostrou mas igualmente pela influência que teve na condução do seu Austria de Viena ao triunfo no certame - daquela que foi a edição da Taça Mitropa que mais figurais lendárias do futebol internacional das décadas de 20 e 30 reuniu ao seu redor. Nomes como Raymond Braine, István Avar, Raimundo Orsi, Josef Silný, Frantisek Plánicka, Giampiero Combi, ou Giuseppe Meazza, foram algumas das personagens mais famosas de um certame que atestou - uma vez mais - a mestria e o poderio do futebol austríaco de então, na sequência do triunfo final alcançado pelo estreante - no que concerne à Mitropa Cup - Austria de Viena. Liderado por aquele que era já considerado então o futebolista mais virtuoso da Áustria, Sindelar, o clube de Viena não teve contudo um trajeto livre de dificuldades até ao momento em que ergueu o troféu. Na primeira ronda o obstáculo deu pelo nome de Slavia de Praga, os campeões da Checoslováquia, cujo ponto forte estava na baliza: Frantisek Plánicka. Na primeira mão, realizada em Praga, o Austria pôde dar-se por satisfeito por ter regressado a casa com uma derrota de apenas 3-1. E dizemos apenas porque segundo rezam as crónicas de então o trio de avançados dos checoslovacos, Svoboda, Sobotka, e Kopecky - cada um deles com um golo apontado neste encontro - foi uma persistente dor de cabeça para a defensiva forasteira. Na segunda mão inverteu-se o cenário, com o Austria a dominar por completo um jogo onde Matthias Sindelar deslumbrou a assistência e... os adversários! Uma exibição soberba do Homem de Papel - assim chamado devido à sua estrutura física franzina - guiou os vienenses a um triunfo por 3-0, um score que só não foi mais avolumado devido à grande exibição do mãos de ferro Plánicka. Rudolf Viertl, com dois golos, e Sindelar com um, foram os homens que derrubaram a muralha checoslovaca rumo às meias-finais.

Raimundo Orsi
E se o embate entre checoslovacos e austríacos havia sido - no cômputo das duas mãos - equilibrado, o jogo entre os campeões italianos e húngaros, respetivamente, a Juventus e o Ujpest, foi notoriamente desnivelado.  Um resultado total de 10-4 assim o comprovou. Na primeira mão, ocorrida em Budapeste, a Juve chegou à meia hora da etapa inicial a vencer por 4-0! No jogo de volta o ítalo-argentino Raimundo Orsi assumiu o papel de estrela da companhia, ao apontar quatro dos seis golos - o resultado final foi de 6-2 - com que os transalpinos despacharam os húngaros. Orsi, que também tinha marcado um golo no início deste duplo embate, perfazia assim um total de cinco remates certeiros, que lhe iriam conferir a par de Sindelar, Kloz, e Meazza o título de melhor marcador da edição de 1933 da Mitropa.
Quem também teve motivos para festejar nesta primeira ronda foi a outra equipa italiana em prova, a Ambrosiana-Inter, que se desenvencilhou dos campeões da Áustria, o First de Viena, por um total de 4-1. Porém, na primeira mão, na capital austríaca, o emblema de Milão não teve vida fácil, devendo ao seu guarda-redes, Carlo Ceresoli, o facto de ter saído derrotado pela margem mínima (1-0). Na segunda mão uma exibição de gala de Giuseppe Meazza acabou com as aspirações dos conterrâneos de Mozart. Secundado de forma brilhante pelos extremos Frione e Levratto, Il Peppino, como era conhecido, apontou três dos quatro golos da sua squadra, que assim avançava para a fase seguinte, onde iria enfrentar o Sparta de Praga, conjunto este que graças à sua temível linha avançada formada por Raymond Braine, Josef Silný, Nejedly, e Frantisek Kloz afastou com dois triunfos mínimos (3-2 e 2-1) mas inteiramente merecidos o MTK de Budapeste.
A equipa da Juventus que na meia-final foi varrida por um vendaval chamado... Sindelar

A primeira mão das meias-finais praticamente decifrou quais os finalistas da edição de 1933 da Taça Mitropa, tal foi a robusta vantagem que as equipas que atuaram diante do seu público alcançaram. Em Viena, Sindelar voltou a fazer das suas. Que o diga Luis Monti, que teve a ingrata tarefa de marcar o Homem de Papel, que no encontro da capital austríaca esteve verdadeiramente endiabrado, sendo da sua autoria o golo madrugador - apontado aos três minutos - que violou a baliza de Combi. A veia artística de Sindi espicaçou a fúria dos italianos, que ao longo de todo o encontro recorreram a inúmeras entradas violentas para travar o astro austríaco. Numa dessa entradas o marcador direto do craque do Austria de Viena, Monti, recebeu ordem de expulsão por parte do árbitro húngaro Arpad Keil, já perto do final de uma partida que terminou com o triunfo por 3-0 dos vencedores da Taça da Áustria da época 32/33 - Sindelar bisou e Viktor Spechtl apontou o terceiro ainda antes do intervalo.
E se o Homem de Papel foi o herói do jogo de Viena, o guarda-redes austríaco Johann Billich centrou em si as atenções na partida de Turim, disputada no Stadio Benito Mussolini. Como lhe competia a Juventus entrou em campo disposta a provar que a tarefa de dar a volta ao marcador não era uma missão de todo impossível, com o trio ofensivo formado por Ferrari, Borel, e Cesarini a criar um sem número de oportunidades junto da baliza forasteira. Porém, esta era guardada de maneira heróica por Billich que só por uma vez foi buscar a bola ao fundo das redes, na sequência de um remate fulminante de Giovanni Ferrari, aos 21 minutos. Golo que foi sol de pouca dura, já que volvidos apenas nove minutos Josef Stroh restabeleceu a igualdade no marcador que até final não mais iria sofrer alterações, não obstante da avalanche ofensiva patenteada pela Juve na etapa complementar.

Attilio Demaria
Em Milão, Attilio Demaria foi a estrela do primeiro round entre a Ambrosiana-Inter e o Sparta de Praga. O ítalo-argentino apontou três dos quatro golos com que os italianos derrotaram (4-1) os checoslovacos. Este jogo teve a particularidade de conhecer duas partes bem distintas. A primeira foi desenvolvida num ritmo frenético por parte da turma da casa, que ao intervalo já vencia por 4-0, ao passo que a segunda foi lenta e desprovida de grandes interesses - a exceção foi talvez o golo do Sparta, apontado por Nejedly - muito por culpa do extremo calor que abraçou Milão.
E se o calor havia massacrado os jogadores da Ambrosiana-Inter na primeira mão, em Praga o massacre foi protagonizado pelos futebolistas do Sparta, que durante 90 minutos não largaram a baliza de Ceresoli. Ataques atrás de ataques resumiram um encontro de sentido - quase - único, o da baliza dos transalpinos, que muito tiveram de suar para sair da capital da Checoslováquia com uma preciosa igualdade a duas bolas, resultados que assim lhes garantia a presença na final. Frantisek Klos marcou os dois golos do Sparta, enquanto que do outro lado Demaria voltou a ser o abono de família da squadra de Milão, ao apontar mais um golo, o seu quarto no confronto com os checoslovacos.

Sindelar e Meazza, duas lendas
do futebol mundial dos anos 30,
posam juntos antes da final
Mitropa Cup de 1933
A 3 de setembro de 1933 a Europa do futebol acordou envolta num clima de entusiasmo, já que nesse dia dois dos maiores futebolistas de então iriam enfrentar-se na primeira mão da final da Mitropa Cup. Giuseppe Meazza e Matthias Sindelar, respetivamente as estrelas principais da Ambrosiana-Inter e do Austria de Viena. Ambos, Il Peppino e Sindi, jogaram de forma magistral, como lhes era característico, num jogo marcado pelo drama e pela postura heróica dos futebolistas daquele tempo. O azar bateu à porta dos italianos, que cedo se viram privados do atacante Felicio Levratto, o qual teve de abandonar por largos minutos o relvado por lesão, numa altura em que as substituições ainda não eram permitidas.
A jogar com menos um elemento os transalpinos não deixaram porém de atacar a baliza de Billich, sempre com perigo, e quase sempre por intermédio do génio Meazza. Fazendo jus a um velho ditado popular português, "água mole em pedra dura tanto bate até que fura", Il Peppino iria inaugurar o marcador a cinco minutos do intervalo, período em que para espanto da multidão presente na Arena Civica, Levratto retorna ao relvado - lesionado - para, no minuto seguinte, fazer o 2-0, naquele que foi um ato de coragem e paixão pelo emblema que carregava ao peito. No segundo tempo os papéis inverteram-se.
O Austria passou a controlar o jogo, postura essa que seria premiada com um golo, apontado por Rudolf Viertl, aos 77 minutos. 2-1, vitória da Ambrosiana-Inter, que partia assim para Viena com uma magra vantagem na bagagem. E como seria insuficiente...
As três equipas - o Austria de Viena, a Ambrosina-Inter, e o trio de arbitragem - que deram vida à final
de 1933 posam juntas
antes do pontapé de saída
Apenas cinco dias mais tarde as duas formações voltaram a medir forças, desta feita no Estádio do Prater - que havia sido inaugurado dois anos antes. Um embate que se resumiu em duas palavras: Matthias Sindelar. Simplesmente divina a atuação do Homem de Papel, que em cima do intervalo converteu uma grande penalidade que colocava a eliminatória em igualdade. Com sucessivos dribles diabólicos sobre os seus adversários, Sindi foi um quebra-cabeças constante para o último reduto dos nerazzurri, sendo que aos 80 minutos o génio austríaco levou a multidão ao delírio na sequência de uma soberba jogada individual que foi concluída com a bola a beijar o fundo das redes de Ceresoli. Este era, contudo, um duelo de astros, e quase na jogada seguinte Giuseppe Meazza também tirou um coelho da cartola, fazendo o 1-2, numa altura em que a Ambrosiana-Inter estava reduzida a nove homens, já que minutos antes dois jogadores seus - Allemandi e Demaria - haviam sido expulsos pelo árbitro checoslovaco Frantisek Cejnar. E eis que quando os 58 000 espectadores presentes no Prater de Viena já imaginavam um terceiro jogo para decidir quem iria ficar com o título de campeão, Matthias Sindelar, sempre ele, edifica um magnífico remate em vólei que termina no fundo da baliza italiana, quando o relógio marcava 88 minutos. Todo o estádio entrou em delírio perante aquela obra de arte criada pelo artista vienense. Um golo que mais do que conferir o título ao Austria Viena conferia a Sindi o estatuto de imortal do belo jogo.

Números e nomes:

Quartos-de-final (1ª e 2ª mãos)

Ujpest (Hungria) - Juventus (Itália): 2-4/2-6

Slavia Praga (Checoslováquia) - Austria Viena (Áustria): 3-1/0-3

MTK Budapeste (Hungria) - Sparta Praga (Checoslováquia): 2-3/1-2

First Viena (Áustria) - Ambrosiana-Inter (Itália): 1-0/0-4

Meias-finais (1ª e 2ª mãos)

Ambrosiana-Inter (Itália) - Sparta Praga (Checoslováquia): 4-1/2-2

Austria Viena (Áustria) - Juventus (Itália): 3-0/1-1

Final (1ª mão)

Ambrosiana-Inter (Itália) - Austria Viena (Áustria): 2-1

Data: 3 de setembro de 1933
Estádio: Arena Civica, em Milão (Itália)
Árbitro: Ferenc Klug (Hungria)

Ambrosiana-Inter: Carlo Ceresoli, Paolo Agosteo, Luigi Allemandi, Alfredo Pitto, Ricardo Faccio, Armando Castellazzi, Francisco Frione, Renato De Manzano, Giuseppe Meazza (c), Attilio Demaria, e Felice Levratto. Treinador: Árpád Weisz.

Austria Viena: Johann Billich, Karl Graf, Walter Nausch (c), Matthias Majemnik, Johann Mock, Karl Gall, Josef Molzer, Josef Stroh, Matthias Sindelar, Camillo Jerusalem, e Rudolf Viertl. Treinador: Josef Blum.

Golos: 1-0 (Meazza, aos 40m), 2-0 (Levratto, aos 41m), 2-1 (Viertl, aos 77m)

Final (2ª mão)

Austria Viena (Áustria) - Ambrosiana-Inter (Itália): 3-1

Data: 8 de setembro de 1933
Estádio: Prater, em Viena (Áustria)
Árbitro: Frantisek Cejnar (Checoslováquia)

Austria Viena: Johann Billich, Karl Graf, Walter Nausch (c), Matthias Majemnik, Johann Mock, Karl Adamek, Josef Molzer, Josef Stroh, Matthias Sindelar, Camillo Jerusalem, e Rudolf Viertl. Treinador: Josef Blum.

Ambrosiana-Inter: Carlo Ceresoli, Paolo Agosteo, Luigi Allemandi, Alfredo Pitto, Ricardo Faccio, Giuseppe Viani, Francisco Frione, Pietro Serantoni, Giuseppe Meazza (c), Attilio Demaria, e Armando Castellazzi. Treinador: Árpád Weisz.

Golos: 1-0 (Sindelar, aos 45), 2-0 (Sindelar, aos 80m), 2-1 (Meazza, aos 85m), 3-1 (Sindelar, aos 88m)
Matthias Sindelar - o primeiro jogar na fila de cima, a contar da esquerda para a direita - foi o ilustre condutor
que levou o Austria de Viena à conquista da Taça Mitropa de 1933
1934: O alargamento da grande montra europeia de clubes

Carlo Reguzzoni, o melhor marcador
da edição de 1934 da competição
A popularidade da Taça Mitropa na Europa do futebol na década de 30 era por demais evidente. O interesse em torno da competição - quer da parte dos clubes, quer da parte dos adeptos - subida de edição para edição. Ciente deste facto a organização decide em 1934 duplicar o número de participantes, passando de 8 para 16 os pretendentes ao trono da competição. Uma verdadeira Liga dos Campeões dos anos 30, com mais jogos, maior competitividade, e um maior número de estrelas envolvidas, era este o panorama da oitava edição da Mitropa.
Cada um dos quatro países envolvidos na competição passava agora a dispor de quatro vagas a serem ocupadas pelo campeão, vice-campeão, terceiro e quarto classificados, sendo que no caso da Áustria uma dessas vagas era ocupada pelo vencedor da taça. Com o aumento do número de clubes a competição europeia criada por Hugo Meisl conheceu alguns emblemas novos em 1934. Um desses caloiros foi o Floridsdorfer, da Áustria, que logo na primeira ronda evidenciou toda a sua inexperiência internacional ao ser copiosamente goleado por um resultado global de 10-1 pelos antigos campeões da prova, os húngaros do Ferencvaros, com o destaque individual deste confronto desnivelado a ir para o avançado do clube de Budapeste, Gyorgy Sarosi, autor de três dos dez tentos da sua equipa, a qual no jogo da segunda mão, disputado no mítico estádio Hohe Warte, em Viena, atuou para 800 pessoas, num recinto que tinha capacidade para acolher 40 000, constituindo-se este como um dos registos mais baixos - em termos de assistência - da história da era dourada da Mitropa Cup
Estreia auspiciosa tiveram os checoslovacos do Kladno, que protagonizariam a maior surpresa desta primeira eliminatória ao afastar os vice-campeões da temporada anterior, a Ambrosiana-Inter. Na primeira mão, os italianos arrancaram uma igualdade a uma bola no terreno do adversário, sendo impensável que no encontro de volta, em Milão, pudessem deixar escapar a oportunidade de continuar a sua caminhada rumo a uma nova final, no mínimo! Na verdade, Meazza e seus companheiros estavam enganados, já que uma exibição letal do ex-avançado do Sparta de Praga, Frantisek Kloz - um dos melhores marcadores da edição anterior - ajudou o Kladno a vencer em Itália por 3-2 e colocar desta forma a Europa do futebol em estado de choque! Pudera.

Angelo Schiavio remata para o fundo das redes húngaras
Passagem de eliminatória complicada teria o futuro campeão da prova, os também italianos do Bologna, que não tiveram vida fácil diante dos húngaros do Bocskai, que no jogo da primeira mão, no Stadio del Litorialle - atualmente denominado de Renato dall'Ara - se apresentou com uma defesa de ferro, só derrubada pela arte e força de Carlo Reguzzoni e da grande estrela da equipa, Angelo Schiavio. Na segunda mão foi a vez do setor defensivo dos italianos brilhar, segurando a avalanche ofensiva dos húngaros que tiveram em Jeno Vincze a sua maior figura, sendo dele um dos golos com que o Bocskai derrotou o Bologna, por 2-1. Resultado, contudo, insuficiente para passar aos quartos-de-final, já que o tento de Reguzzoni fez estalar a festa entre a comitiva transaplina. A primeira de muitas festas para os rapazes comandados pelo húngaro Lajos Kovács ao longo desta edição.
Outra das surpresas desta primeira ronda foi a eliminação dos campeões em título, o Austria de Viena, aos pés dos húngaros do Ujpest. Privados do seu capitão de equipa, Walter Nausch, por se encontrar lesionado, os austríacos foram derrotados pelo mesmo score (2-1) nos dois embates, onde ficou vincada a robustez defensiva do vice-campeão magiar.
Tranquila foi a passagem dos campeões de Itália, a Juventus, diante dos frágeis checoslovacos do FK Teplice, enquanto que o equilíbrio surgiu em dois dos restantes duelos desta primeira eliminatória, decididos num terceiro, quarto, quinto, e sexto jogos!!! Sem a sua estrela-mor, Anton Schall, os campeões da Áustria, o Admira de Viena, enfrentaram os estreantes do Nápoles, que na primeira mão causou surpresa ao empatar a zero bolas no terreno do adversário. Na cidade do sul de Itália verificou-se um novo empate no jogo de volta, desta feita com golos, 2-2, tendo os napolitanos estado em vantagem grande parte do tempo por 2-0, score que até poderia ser mais avolumado não fosse a tarde inspirada do guardião Peter Platzer. Porém, na reta final da partida apareceu Adolf Vogl, que com dois golos obrigou à necessidade de se realizar um terceiro e decisivo duelo. Ato este que decorreu em campo neutro, em Zurique mais concretamente, tendo ai o Admira vincado o porquê de ter vencido com distinção o competitivo campeonato austríaco na temporada anterior. 5-0, foi o pesado resultado com que os vienenses afastaram os italianos, com destaque para as magníficas performances de Stoiber, Sigl, e - mais uma vez - Vogl.

Raymond Braine, uma das grandes
estrelas do Sparta Praga
Renhida foi também a eliminatória entre o MTK de Budapeste e o Sparta de Praga. Na primeira mão, na capital da Checoslováquia, os húngaros surpreenderam o seu oponente com um triunfo por 2-1, enquanto que no jogo de volta foi a vez do belga Raymond Braine e do checoslovaco Nejedly guiarem o Sparta até um triunfo por 5-4, empatando assim a eliminatória, o que obrigou a um jogo de desempate. E aqui surgiu a polémica. O MTK protestou a utilização por parte do Sparta do jogador Facsinek no encontro do play-off de desempate, partida essa que os checoslovacos haviam vencido por 5-2. Na sequência desse protesto o comité organizador da Mitropa decidiu anular os três jogos da eliminatória disputados entre estes dois clubes, obrigando a que tudo fosse repetido, ou seja, a eliminatória iria começar do zero! No primeiro jogo o MTK venceu em casa por 2-1, enquanto que uma semana mais tarde o Sparta aplicou ao adversário o mesmo resultado, obrigando a um novo jogo de desempate. Para não variar, o equilíbrio foi a nota dominante numa eliminatória que teimava em não ser fechada, conforme traduz o resultado final de 1-1. Perante tal facto, os organizadores da prova tiveram de proceder a um sorteio para decidir quem avançaria para os quartos-de-final, tendo a sorte bafejado o Sparta Praga.
Pior sorte teve a outra equipa de Praga, o Slavia, que perdeu o braço de ferro com o Rapid de Viena.

Gyorgy Sarosi
Gyorgy Sarosi foi a vedeta do jogo da primeira mão dos quartos-de final entre o Ferencvaros e o surpreendente Kladno, ao apontar três dos seis golos com que a sua equipa esmagou (6-0) os checoslovacos, os quais na segunda mão estiveram muito perto de alcançar o impossível, como comprova o triunfo por 4-1, num jogo em que a linha defensiva dos húngaros mostrou não estar à altura da sua congénere ofensiva.  
Com a preciosa ajuda do melhor marcador do campeonato italiano da temporada transata, Felice Borel, a Juventus alcançou uma saborosa vitória - todas o são, naturalmente - em casa do Ujpest, por 3-1, com o citado atleta a fazer o gosto ao pé em duas ocasiões. Na segunda mão uma exibição categórica dos irmãos gémeos Mario e Giovanni Varglien no setor defensivo da Vecchia Signora impediu que o ataque dos húngaros fizesse estragos de maior em Turim, tendo o encontro terminado com um empate a uma bola, com Borel a apontar o tento dos italianos que assim seguiam em frente. Tranquila foi a passagem do Bologna, que na primeira mão, diante do seu público, humilhou por completo o Rapid de Viena. 6-1 foi o resultado de uma partida onde os atacantes Reguzzoni e Schiavio estiveram em claro destaque ao apontarem os golos da sua equipa. Em Viena, o Rapid adiantou-se cedo no marcador, por intermédio de Binder, logo aos dois minutos, dando ideia de que o milagre poderia acontecer, mas Reguzzoni logo tratou de arrefecer o ímpeto dos locais com o golo do empate, de nada valendo os três golos de Binder no segundo tempo.
Em grande forma estava por esta altura o Admira de Viena, que na receção ao Sparta de Praga aplicou a chapa 4 com uma classe meritória inquestionável, numa partida onde no plano individual sobressaiu o austríaco Wilhelm Hahnemann. Na segunda mão, e contrariamente ao que se previa, foi o Admira a entrar mais atrevido no jogo, tendo o bis de Karl Durspekt colocado os visitantes a vencer por 2-0 ao intervalo. Com a passagem às meias finais mais do que assegurada os vienenses abrandaram na segunda parte, permitindo que os checoslovacos concluíssem a sua participação na Mitropa Cup de 1934 com uma vitória (3-2).
Capitães do Ferencvaros e do Bologna posam para a posteridade junto da equipa de arbitragem
antes do início da primeira mão da meia-final
O primeiro embate das meias-finais comprovou que o Bologna era de facto uma das grandes equipas da Europa dos anos 30. Que o diga o Ferencvaros, que na primeira mão não foi além de um empate caseiro antes os italianos, que por sua vez no jogo de volta esmagaram por completo os húngaros na sequência de um robusto triunfo por 5-1, com relevo para as exibições de Fedullo e Schiavio, este último autor de dois golos. Na outra meia-final o Admira de Viena deu uma nova prova da sua condição de belíssima equipa. Com 50 minutos cravados no relógio - na partida da primeira mão - a turma austríaca já vencia a Juventus por 3-0. Um golo tardio de Orsi fechou o marcador em 3-1 para a turma da casa, um golo que dava assim alguma esperança ao campeão italiano. Juve que na segunda mão dominou por completo a partida, sendo que numa altura em que estavam decorridos 30 minutos de jogo o marcador indicava já uma vantagem de dois golos para os transalpinos - com golos de Borel e Orsi - que assim empatavam a eliminatória. Contudo, na aproximação ao intervalo, um contra-ataque letal do Admira foi concluído com êxito por Vogl. Um golo que selou a qualificação dos austríacos para a final, já que no segundo tempo a turma orientada por Hans Skolaut fechou-se a sete chaves na sua zona defensiva, travando de todas as formas e feitios os sucessivos ataques dos juventinos.

Fase da partida entre Bologna e Admira Viena
E assim chegávamos a mais uma final, onde surgiu pela segunda vez - no espaço de três anos - Il Grande Bologna, clube que, recorde-se, dois anos antes havia vencido a competição sem precisar de jogar a final, devido ao castigo imposto pela organização aos outros integrantes - Juventus e Slavia de Praga - de uma das semi-finais. Bologna que se viu a braços com o azar na partida da primeira mão da final da edição de 1934, já que por motivos de lesão a sua maior estrela, Angelo Schiavio, não pôde viajar para Viena. No entanto, e em contrário ao que se esperava, os italianos não ficariam fragilizados por esse facto, já que ao intervalo venciam o seu oponente por duas bolas a zero. No segundo tempo, e no curto espaço de seis minutos, o Admira deu a volta ao marcador, o qual não mais viria a ser alterado até final, graças a uma magnífica exibição do guardião bolonhês Mario Gianni. Na segunda mão, e já com o seu capitão e estrela-mor Schiavio em campo, o Bologna dominou por completo os acontecimentos. Jogada de baixo de um calor infernal a partida foi de sentido único, o da baliza forasteira, com sucessivos lances de perigo a ocorreram junto da baliza à guarda de Platzer. O perigo número um na área vienense dava pelo nome de Carlo Reguzzoni, que neste encontro esteve verdadeiramente endiabrado. Apontou três dos cinco golos com que o Bologna venceu o seu oponente, mas poderia ter marcado muitos mais, tais foram as ocasiões em que assustou Platzer. Com este hattrick Reguzzoni elevaria para 10 o número de golos marcados na competição, facto que fez dele o melhor da edição de 1934 da Mitropa. Quando o árbitro inglês Arthur James Jewell apitou para o final do encontro os 25 000 espectadores presentes no Stadio del Littoriale explodiram de alegria: Il Grande Bologna era de novo campeão da Europa.
Depois da conquista do Mundo - na sequência do triunfo da Squadra Azzura no Campeonato do Mundo da FIFA - o futebol italiano arrecadava agora a coroa europeia no que a clubes dizia respeito. Memorável.

Números e nomes: 

Oitavos-de-final (1ª e 2ª mãos)

Ferencvaros (Hungria) - Floridsdorfer (Áustria): 8-0/2-1

Kladno (Checoslováquia) - Ambrosiana-Inter (Itália): 1-1/3-2

Bologna (Itália) - Bocskay (Hungria): 2-0/1-2

Slavia Praga (Checoslováquia) - Rapid Viena (Áustria): 1-3/1-1

Austria Viena (Áustria) - Ujpest (Hungria): 1-2/1-2

Juventus (Itália) - Teplice (Checoslováquia): 4-2/1-0

Admira Viena (Áustria) - Nápoles (Itália): 0-0/2-2/5-0 (desempate)

MTK Budapeste (Hungria) - Sparta Praga (Checoslováquia): 2-1/1-2/1-1 (Sparta vence por sorteio)

Quartos-de-final (1ª e 2ª mãos)

Ferencvaros (Hungria) - Kladno (Checoslováquia): 6-0/1-4

Ujpest (Hungria) - Juventus (Itália): 1-3/1-1

Bologna (Itália) - Rapid Viena (Áustria): 6-1/1-4

Admira Viena (Áustria) - Sparta Praga (Checoslováquia): 4-0/2-3

Meias-finais (1ª e 2ª mãos)
Recorte de um jornal da época dando conta do embate entre o Bologna e o Ferencvaros
Ferencvaros (Hungria) - Bologna (Itália): 1-1/1-5

Admira Viena (Áustria) - Juventus (Itália): 3-1/1-2

Final (1ª mão)

Admira Viena (Áustria) - Bologna (Itália): 3-2

Data: 5 de setembro de 1934
Estádio: Prater, em Viena (Áustria)
Árbitro: William Walden (Inglaterra)

Admira Viena: Peter Platzer, Robert Pavlicek, Anton Janda, Johann Urbanek, Karl Hummeberger, Josef Mirschitzka, Ignaz Sigl (c), Wilhelm Hahnemann, Karl Stoiber, Anton Schall, e Adolf Vogl. Treinador: Hans Skolaut.

Bologna: Mario Gianni, Eraldo Monzeglio, Felice Gasperi, Mario Montesanto (c), Aldo Donati, Giordano Corsi, Bruno Maini, Raffaele Sansone, Aldo Spivach, Francisco Fedullo, e Carlo Reguzzoni. Treinador: Lajos Kovács.

Golos: 0-1 (Spivach, aos 7m), 0-2 (Reguzzoni, aos 25m), 1-2 (Stoiber, aos 56m), 2-2 (Vogl, aos 58m), 3-2 (Schall, aos 60m)

Final (2ª mão)

Bologna (Itália) - Admira Viena (Áustria): 5-1

Data: 9 de setembro de 1934
Estádio: Del Littoriale, em Bolonha (Itália)
Árbitro: Arthur James Jewell (Inglaterra)

Bologna: Mario Gianni, Eraldo Monzeglio, Felice Gasperi, Mario Montesanto, Aldo Donati, Giordano Corsi, Bruno Maini, Raffaele Sansone, Angelo Schiavio (c), Francisco Fedullo, e Carlo Reguzzoni. Treinador: Lajos Kovács.

Admira Viena: Peter Platzer, Robert Pavlicek, Anton Janda, Johann Urbanek, Karl Hummeberger, Josef Mirschitzka, Karl Durspekt, Wilhelm Hahnemann, Karl Stoiber, Anton Schall, e Adolf Vogl (c). Treinador: Hans Skolaut.

Golos: 1-0 (Maini, aos 21m), 1-1 (Vogl, aos 32m), 2-1 (Reguzzoni, aos 33m), 3-1 (Reguzzoni, aos 40m), 4-1 (Fedullo, aos 84m), 5-1 (Reguzzoni, aos 88m).
A squadra do Bologna que pela segunda vez no curto espaço de três anos conquistou a coroa do futebol europeu

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