sexta-feira, setembro 11, 2015

Copa América (5)... Argentina 1921

Uma revista da época retratando o feito alvi-celeste
1921 é um ano especial para o povo argentino. Pela primeira vez a seleção das pampas subia ao trono do futebol sul-americano após arrebatar a coroa de campeão continental. Um feito alcançado em Buenos Aires, o mesmo local onde cinco anos antes havia sido dado o pontapé de saída para aquela que é hoje a maior competição de seleções de todo o continente americano, a Copa América. Para a quinta edição do então denominado Campeonato Sul-Americano de Futebol uma novidade saltou à vista: a estreia do Paraguai. Orientados por um argentino, de nome José Durand Laguna, os paraguaios - que neste preciso ano de 1921 acabavam de filiar-se na FIFA - juntavam-se aos habituais Brasil, Uruguai e Argentina, substituindo a seleção do Chile, que devido a problemas internos na sua federação esteve ausente do campeonato. Paraguai que teve uma estreia de sonho na copa, já que no Estádio do Club Sportivo Barracas, o palco com capacidade para 30.000 pessoas que acolheu os seis encontros do certame, bateu por 2-1 nada mais nada menos do que os campeões em título, o Uruguai. Um dos responsáveis por esta autêntica surpresa foi um niño de 16 anos, Gerardo Rivas, que apesar da sua tenra idade assumia já o estatuto de grande estrela do selecionado paraguaio. Foi ele que aos 9 minutos abriu um marcador que seria ampliado já na etapa complementar por intermédio de Ildefonso López. O máximo que os atordoados uruguaios conseguiram fazer foi reduzir a desvantagem, através de um dos seus jogadores mais virtuosos, José Piendibene. 


Jogo inaugural da Copa de 1921,
entre a Argentina e o Brasil

O certame havia sido aberto no dia 2 de outubro desse longínquo ano de 1921 pelos combinados da Argentina e do Brasil. Esta última seleção viajou para Buenos Aires desfalcada dos seus melhores futebolistas, desde logo a grande estrela do futebol brasileiro de então, Arthur Friedenreich, que não participou na copa por ser... mestiço! Mais uma vez o racismo voltava a evidenciar-se nas canchas do futebol sul-americano. A recusa do Brasil em levar alguns dos seus melhores jogadores, grande parte deles de origem negra, surgia como consequência de um cartoon que um jornal de Buenos Aires havia feito em 1916, por alturas da primeira edição do Campeonato Sul-Americano, em que os futebolistas brasileiros eram representados por macacos magricelas a saltar de galho em galho a fazer piruetas! Uma caracterização que ganhou fama, sendo que a partir de então os brasileiros passaram a ser apelidados de macaquinhos. Cinco anos volvidos, e preocupados com a imagem que o país passou a deter no exterior na sequência desta caracterização, o presidente da República de então, Epitácio Pessoa, convocou uma reunião com a Confederação Brasileira de Desportos onde recomendou que apenas poderiam representar a nação os futebolistas das famílias mais abastadas economicamente, e que fossem de pele clara e de cabelos lisos! É caso para dizer que não sabe quem era mais racista, se os argentinos ou se o próprio chefe da nação brasileira! De nada valeram os protestos da sociedade do Brasil, onde se destacou a voz do escritor Lima Barreto, também ele mestiço, sendo que a seleção ao ficar privada dos seus craques não fez uma grande figura na capital argentina. Ante a equipa da casa o Brasil sucumbiu por 1-0, com o tento dos alvi-celestes a ser apontado por aquele que viria a ser o melhor marcador e grande figura do torneio, Julio Libonatti. Neste encontro de estreia os comandados de Ferreira Vianna Netto atuaram durante 80 minutos com menos um homem, já que logo aos 10 minutos o avançado Nonô teve de sair do relvado por motivo de lesão. 


Paraguaios não tiveram argumentos
para derrotar a turma da casa
Dez dias mais tarde o Brasil voltou a entrar em campo, desta feita para defrontar os caloiros do Paraguai. Mesmo sem realizar uma exibição convincente o escrete esmagou os paraguaios por 3-0, com golos de Machado (2) e Candiota, todos eles na primeira parte. 
Por sua vez, o Paraguai mostrou que a surpreendente vitória de estreia ante o poderoso Uruguai havia sido, quiçá, um mero golpe de sorte, pois à má performance obtida diante do Brasil seguiu-se uma nova e modesta atuação ante os anfitriões. Libonatti, aos 43 minutos, abriu o caminho de uma vitória fácil por 3-0 dos argentinos que desta forma estavam a um pequeno passo de entrar para a história. Mas para o fazer a equipa do jogador/treinador Pedro Fournol precisa de vencer o vizinho e eterno inimigo da outra margem do Rio da Prata, o Uruguai, seleção que se recompôs da derrota inaugural com um triunfo curto mas importante sobre o Brasil. Dois golos de Ángel Romano, um dos principais jogadores dos charrúas, contra apenas um dos brasileiros, deram aos campeões em título um novo alento quanto a uma possível renovação do ceptro. Quanto ao Brasil despedia-se sem honra nem glória, ficando somente para a história as heróicas atuações do seu guarda-redes, Júlio Kuntz, performance que levou a que o maestro Francisco Canaro tivesse composto um tango em homenagem ao goleiro do Flamengo. 


Libonatti marca o golo (contra o Uruguai)
que consagrou a Argentina
como campeã das américas
E no dia 30 de outubro o Estádio do Club Sportivo Barracas encheu para ver o encontro decisivo da copa. Aos argentinos um empate bastaria para celebrar o primeiro título continental da sua história, ao passo que uma derrota poderia dar o tetra à celeste. Contudo, os argentinos estavam dispostos a mudar o rumo da história, além de que contavam com um goleador em grande forma, Julio Libonatti, que aos 57 minutos apontou o único golo do encontro para gáudio do 30.00o espetadores presentes. Pelos seus golos Libonatti pode ter sido para muitos a chave do êxito argentino nesta competição, mas há que fazer igualmente uma referência ao guarda-redes alvi-celeste, Américo Tesoriere, que ao manter a sua baliza inviolável (!) deu um forte contributo para a conquista do título. Para a história do futebol argentino ficam os nomes de Florindo Bearzotti, Américo Tesoriere, Pedro Calomino, Aldolfo Celli, Jaime Chavín, Miguel Dellavalle, Raúl Echeverría, Alfredo Elli, José López, Vicente González, Julio Libonatt, Ernesto Kiessel, Juan Presta, Blas Saruppo, Emilio Solari e Gabino Sosa. Contudo, esta quinta edição ficou igualmente marcada pelo reduzido poder de finalização das quatro seleções em prova, já que somente 14 golos foram apontados em seis partidas.  

A figura: Julio Libonatti


Julio Libonatti com a camisola
da Argentina
Reza a lenda que mal o árbitro brasileiro Pedro Santos apitou para o final do decisivo Argentina - Uruguai os hinchas locais correram para agarrar Julio Libonatti, pegando nele e levando-o em ombros até à Plaza de Mayo! Ainda hoje, recordar o primeiro título do futebol argentino no que a seleções diz respeito obriga a proferir o nome de Libonatti, o herói da copa de 1921. Este atacante nasceu em Rosário a 5 de julho de 1901 tendo iniciado o seu percurso futebolístico num dos clubes locais, neste caso o Newell's Old Boys. Ao serviço deste emblema deu nas vistas durante os oito anos em que vestiu o seu manto sagrado, essencialmente devido aos seus atributos de temível matador, o mesmo será dizer, de homem-golo. A estas características não ficaram indiferentes os responsáveis pela seleção argentina, os quais em 1919 chamam Libonatti pela primeira vez. Um ano depois integrou o grupo que defendeu a Argentina no Campeonato Sul-Americano de 1920, vencido, como se sabe, pelo Uruguai, Em 1921 foi então uma peça fundamental, para muitoa foi mesmo a peça fundamental, do êxito alvi-celeste, ao apontar três golos decisivos para a conquista do primeiro título continental para aquela nação. A sua fama subiu pois em flecha, sendo que quatro anos mais tarde do outro lado do Atlântico chegou-lhe um convite para exibir o seu talento em terras italianas. O convite surgiu da parte do Torino, e Libonatti - descendente de italianos - não recusou, entrando para a história como o primeiro jogador sul-americano a atuar no Velho Continente. Em Turim continuou a fazer o que melhor sabia, isto é, golos. Juntamente com Gino Rossetti e Adolfo Baloncieri formou um trio mortífero para os rivais do Toro, de tal modo que a imprensa italiana o batizou de trio maravilha. Durante os nove anos em que defendeu as cores do Torino Libonatti apontou mais de 150 golos, tendo tido um papel preponderante na conquista de dois scudettos por parte do clube. Pelo facto de ter descendência italiana Julio Liboantti defendeu em 17 ocasiões as cores da Squadra Azzurra - seleção nacional - tendo sido o primeiro oriundi - descendente - a fazê-lo. Na reta final da sua carreira ficou-se por Itália, onde defendeu ainda os emblemas do Génova e do Rimini. Ao serviço deste último clube teve a sua curta experiência como treinador - em 1936. Viria a falecer a 9 de outubro de 1981, com 80 anos de idade. 

Números e nomes: 

2 de outubro de 1921

Argentina - Brasil: 1-0
(Libonatti, aos 27m)
A seleção do Paraguai que em 1921 participou pela primeira vez na Copa América
9 de outubro 1921

Paraguai - Uruguai: 2-1
(Rivas, aos 9m, López, aos 66m)
(Piendibene, aos 83m)
Um ângulo da bancada e da tribuna central do Estádio do Club Sportivo Barracas,
onde decorreu o campeonato sul-americano de 1921
12 de outubro de 1921

Brasil - Paraguai: 3-0
(Machado, aos 21m, aos 44m, Candiota, aos 45m)

16 de outubro de 1921
Capitães do Paraguai e da Argentina cumprimentam-se antes do duelo travado entre si
Argentina - Paraguai: 3-0
(Libonatti, aos 43m, Saruppo, aos 71m, Echeverría, aos 76m)

23 de outubro de 1921

Uruguai - Brasil: 2-1
(Romano, ao 1n, aos 8m)
(Zézé, aos 53m)

30 de outubro de 1921

Argentina - Uruguai: 1-0
(Libonatti, aos 57m)

Classificação

1-Argentina: 6 pontos
2-Brasil: 2 pontos
3-Uruguai: 2 pontos
4-Paraguai: 2 pontos
A célebre seleção argentina que em 1921 alcançou o seu primeiro título oficial

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