quarta-feira, abril 16, 2025

Jogos Memoráveis (10)... Southampton - Sporting (Taça UEFA 1981/82)


A primeira vez é sempre inesquecível, e então se acontecer num lugar especial ainda mais inolvidável se torna. É desta forma que podemos olhar para a vitória do Sporting em casa do Southampton na temporada de 81/82 em jogo a contar para a 1.ª mão da 2.ª eliminatória da Taça UEFA, por concludentes 4-2. E o que tem esta vitória de tão especial assim, perguntar-se-ão os visitantes do Museu. Simples, tratou-se do primeiro triunfo de uma equipa portuguesa em solo britânico a contar para as competições europeias de clubes. Em solo britânico, isto é, na terra dos inventores do futebol moderno, os mestres ingleses, há que sublinhá-lo, visto que não era qualquer equipa que ousava chegar a Inglaterra e vencer um cavaleiro dali oriundo. Mas aquela era, e é, talvez uma das equipas mais lendárias da história do Sporting, a equipa que nessa temporada venceu tudo a nível nacional através de um futebol encantador edificado por artistas de enorme qualidade em todos os setores do terreno. 


Havia, porém, uma zona do retângulo de jogo onde essa mestria se fazia notar ainda mais: o ataque. Setor este onde pontificava um dos tridentes mais cintilantes da história do futebol luso, um trio de artistas notáveis que muito contribuiu para que aquela fosse uma das melhores temporadas de sempre do Sporting. Falamos, claro, de António Oliveira, Rui Jordão e Manuel Fernandes. Pedra fundamental para que esta fosse uma das melhores épocas de sempre do Sporting foi o então seu lendário presidente, João Rocha, que após uma temporada (80/81) de insucesso desportivo começou por tomar a decisão de contratar um treinador que fizesse regressar a Alvalade a estrela das vitórias e mais do que isso, dos títulos. Depois de falhar a contratação de José Maria Pedroto e de John Mortimore, que tantas glórias haviam dado aos grandes rivais internos dos leões nos anos anteriores, respetivamente, FC Porto e Benfica, eis que a escolha recai noutro inglês, Malcolm Allison. Big Mal, como era conhecido no seu país, logo implementou um futebol de ataque no Sporting, assente na tal mestria e criatividade letal do trio Oliveira, Jordão e Manuel Fernandes, o qual era auxiliado por um meio campo operário, onde pontificavam nomes como Nogueira, Carlos Xavier, Ademar, Francisco Barão, ou Mário Jorge; uma defesa de betão, formada por figuras como Eurico, Inácio, ou Virgílio; e um guarda-redes ultra seguro, de seu nome Ferenc Mészáros. O guardião internacional húngaro foi a par de Oliveira a contratação mais sonante para aquela temporada de glória dos leões
Um "onze" do Sporting numa época (81/82) maravilhosa

E bem se pode dizer que o encantamento por aquele Sporting não só da parte dos adeptos leoninos como de todos aqueles que gostam de bom futebol, começou precisamente na noite de 21 de outubro de 1981, data em que o Southampton recebia o conjunto português. Atenção, este não era um Southampton qualquer, mas sim uma equipa recheada de talentos, sendo o maior deles aquele que provavelmente era o melhor futebolista inglês de então, Kevin Keegan. Vencedor por duas ocasiões (1978 e 1979) da Bola de Ouro, o famoso futebolista era a principal referência do Southampton, onde ingressara em 80/81 após três temporadas de sucesso ao serviço dos alemães do Hamburgo. Confiantes de que a sua estrela-mor iria abater os leões portugueses, os adeptos ingleses lotaram por completo o velhinho The Dell, mítico estádio do Southampton, mas o que viram, na realidade, foi uma exibição categórica e de autor do Sporting concluída com um histórico triunfo por 4-2. O primeiro de sempre, como já vimos, de equipas lusas em Terras de Sua Majestade a contar para as provas uefeiras. 

O Southampton onde pontificava o lendário Kevin Keegan

Abra-se aqui um parêntese, para recordar que antes deste jogo, os conjuntos portugueses haviam disputado 19 partidas europeias em solo da Velha Albion, por intermédio do Benfica, do FC Porto, do Belenenses, do Braga, do Vitória de Setúbal, do Vitória de Guimarães e do próprio Sporting, sendo que nesses 19 encontros anteriores ali disputados por estas equipas foram contabilizadas… 19 derrotas!

Mas o Sporting de Big Mal mudou esse paradigma naquela noite no relvado do The Dell. «O triunfo do Sporting frente a uma equipa onde joga o famoso Kevin Keegan, pode ser considerado uma proeza para o futebol português», assim escrevia o Diário de Lisboa na sua edição do dia seguinte a um jogo onde o Southampton cedo foi surpreendido com um futebol veloz e de ataque do Sporting, não sendo de admirar que logo aos 2 minutos Jordão, de cabeça, desse o melhor seguimento a uma jogada magistral de Oliveira, a qual foi construída pelo flanco direito do seu ataque. Aliás, ninguém esperava ver Oliveira nesse jogo a… defesa direito. A decisão de Allison deixou a todos perplexos, desde logo os seus próprios conterrâneos, e o que se passou foi que Oli – assim tratava Bil Mal o genial Oliveira – foi um verdadeiro diabo à solta no The Dell.

O majestoso tridente ofensivo dos leões: Jordão, Manuel Fernandes e Oliveira
O golo acordou os ingleses, que passaram a pressionar em zona alta os portugueses, mas a defesa leonina «susteve o ímpeto contrário e o meio campo e o ataque do Sporting trocavam a bola e lançavam perigosos contra-ataques que perturbavam a defesa inglesa», analisava o Diário de Lisboa. E seria num desses contragolpes venenosos que a sorte bafejou os portugueses e o azar bateu à porta dos britânicos. Estavam decorridos 20 minutos quando, pelo lado esquerdo, Freire rompeu com a bola pela área inglesa e pela frente encontrou Nick Holmes, que ao tentar roubar o esférico ao português traiu o seu guarda-redes e ampliou a vantagem dos visitantes. Apesar de atordoado com a postura inesperada dos portugueses, o Southampton não desistiu de atacar a baliza de Mészáros, «mas a defesa do Sporting, vigiando bem Keegan e atuando num sistema de dobras e apoios constantes (a que se associavam o meio campo e também Freire e Manuel Fernandes) foi-se opondo com êxito». Por seu turno, o Sporting continuava a dar azo a rápidos contra-ataques, e foi, uma vez mais, num desses lances que a três minutos do intervalo as bancadas do The Dell voltaram a estremecer com um novo golo lusitano. Oliveira, sempre ele, pelo flanco direito, lançou Manuel Fernandes, que ao superar a oposição da defesa local atirou para o fundo das redes de Peter Wells pela terceira vez naquela noite. Quem diria que ao intervalo o Sporting estaria a bater o Southampton em sua casa por 3-0! 

Keegan foi sempre muito bem vigiado pelos leões no The Dell
Na segunda parte houve sofrimento por parte dos leões, já que o Southampton, ferido no orgulho, apostou as fichas todas para inverter o rumo dos acontecimentos. O primeiro sinal de aviso foi dado por Mick Channon, aos 49 minutos, com um potente remate aos ferros da baliza de Mészáros. Persentindo, quiçá, o que seriam aqueles segundos 45 minutos, Malcolm Allison refresca e reforça o seu setor defensivo, tirando um homem de meio campo (Nogueira) e colocando em seu lugar um defesa (Virgílio). E quando não eram os homens do setor recuado leonino a dar conta do recado, lá estava Ferenc Mészáros a mostrar os seus dotes de guardião de craveira mundial. «Aos 56 minutos, Mészáros fez a defesa da noite: um “chapéu” de Moran apanhou-o adiantado e, quando o estádio aplaudia o golo, o guardião húngaro, em golpe de rins, desviou a bola para canto», contava a crónica do jogo escrita no Diário de Lisboa. À passagem da hora de jogo, George Lawrence reforçou o ataque inglês, e avalanche ofensiva dos anfitriões deu os seus frutos quando aos 68 minutos o central Eurico derrubou dentro de área o astro Kevin Keegan, não restando ao árbitro sueco, Erik Fredriksson, dúvidas quanto à marcação de grande penalidade a favor do Southampton. O mesmo Keegan bateu Mészáros e relançou a partida. O golo conferiu uma vitamina extra aos ingleses, que três minutos volvidos voltaram a marcar, desta feita Mick Channon, após assistência de Keegan. O Sporting passou a sofrer ainda mais a partir deste momento, com os ingleses a sufocarem ofensivamente os portugueses até final na expectativa de uma reviravolta. Valeu aos sportinguistas terem cabeça fria e muita concentração na hora em que o Southampton atacava. Até que a dois minutos dos 90 o sofrimento leonino terminou. Freire numa rápida incursão cruzou para o interior da área onde Manuel Fernandes não teve quaisquer dificuldades em fazer o 4-2 final a favor do Sporting. «A vitória do Sporting é indiscutível, sobretudo pela atuação da sua defesa, muito coesa, vibrante, corajosa e agressiva na marcação impiedosa que moveu aos jogadores contrários. O meio campo ajudou sempre que pôde e lançou o ataque em rápidos contra-ataques que desbarataram por completo a defesa inglesa, impotente face ao talento de Freire, Jordão Oliveira e Manuel Fernandes», concluiu o Diário de Lisboa. No jogo da 2.ª mão houve empate a zero bolas, o que permitiu ao Sporting avançar na prova, vindo a cair na ronda seguinte aos pés do Neuchâtel Xamax. 

Aqui fica a constituição das duas equipas nessa célebre noite europeia para o futebol português:

Southampton - Peter Wells, Chris Nicholl, Ivan Golac, Mark Whitlock (George Lawrence, 62), David Armstrong, Nick Holmes, Steve Williams, Alan Ball, Steve Moran, Mick Channon, e Kevin Keegan. Treinador: Lawrie McMenemy.

Sporting: Ferenc Mészáros, Eurico, Inácio, Zezinho (Francisco Barão, 79), Carlos Xavier, António Oliveira, Nogueira (Virgílio, 55), Ademar, Rui Jordão, Manuel Fernandes, e Freire. Treinador: Malcolm Allison.

Vídeo: Resumo da célebre partida disputada no The Dell

quinta-feira, abril 10, 2025

Copa América (8)... Uruguai 1924

Os campeões olímpicos (e do Mundo) revalidaram o título 
das américas em 1924

É já ostentando a coroa de melhor equipa do Mundo, ou de campeões do Mundo, se preferirem, que o Uruguai entrava em campo no Campeonato Sul-Americano de 1924 para defender o título conquistado um ano antes. Sim, campeões do Mundo, já que à época o torneio olímpico de futebol era a competição mais alta a nível planetário, e arrecadar a medalha de ouro significava por aqueles dias ser campeão mundial. E o Uruguai tinha alcançado (nos Jogos Olímpicos de Paris) esse feito sensivelmente quatro meses antes do pontapé de saída da 8.ª edição da atual Copa América. Estávamos de facto diante da melhor seleção do planeta, e se dúvidas ainda restassem elas seriam (novamente) dissipadas num torneio que inicialmente estava destinado a ter como sede a cidade de Assunção, no Paraguai. Porém, a capital paraguaia não dispunha de unidades hoteleiras com condições mínimas para albergar as delegações visitantes, o que levou a organização a transferir a prova para Montevideu, onde havia sido realizada nas edições de 1923 e 1917. Dessa forma, o Parque Central de Montevideu voltou a ser – tal como no ano anterior – o palco de uma competição que para além do Uruguai contou com a participação da Argentina, do Chile e do Paraguai, quatro seleções que mediram forças num sistema de poule – todos contra todos – em que a equipa que somasse mais pontos seria coroada campeã. Ou seja, tal e qual às anteriores edições. 
Duelo inaugural da Copa de 24, entre argentinos e paraguaios
E no dia 12 de outubro de 1924 deu-se o pontapé de saída do 8.º Campeonato Sul Americano, em que 12.000 pessoas assistiram ao pobre nulo (0-0) entre argentinos e paraguaios. Este empate haveria de sair caro àquela que a par do Uruguai era a seleção favorita ao título, a Argentina. Sete dias depois (!!!) entraram em campo os campeões olímpicos – e por consequência do Mundo – para medir forças com o Chile. E o que se viu foi não só mais do que uma demonstração do poderio e arte do futebol uruguaio, que esmagou o seu oponente por 5-0, com destaque para o hattrick de Pedro Petrone, que desta forma se tornava no primeiro futebolista a apontar três golos ao serviço da seleção celeste no mesmo jogo e logo numa competição internacional.  

Fase do jogo entre Uruguai e Paraguai
No dia 25 de outubro teve lugar o terceiro jogo da prova, tendo a Argentina puxado, finalmente, dos galões para bater o Chile por 2-0, sendo que no dia seguinte o Uruguai derrotava o Paraguai por 3-1, com golos de Petrone, Ángel Romano e Pedro Cea. Face a estes dois resultados desde logo ficou definido que o clássico do Rio da Prata entre uruguaios e argentinos teria contornos de final, pois quem vencesse seria matematicamente campeão. Contudo, à equipa da casa bastaria um empate para revalidar o cetro. E assim foi. 

Episódio caricato que se repetiria entre os velhos rivais do Rio da Prata na final do primeiro Mundial seis anos depois

O grande clássico das américas nos anos 20: Uruguai vs Argentina
para decidir o campeão do continente em 1924

20.000 pessoas – a maior assistência do Sul-Americano de 1924 – lotaram no derradeiro dia da competição o Parque Central para assistir à “final” do torneio. Antes do pontapé de saída, o árbitro do encontro, o chileno Carlos Fanta, deparou-se com um contratempo caricato. Os uruguaios, a jogarem em casa, acharam-se no direito de jogar com a sua bola, que era confessionada de couro fraco e de dimensões maiores àquelas que os argentinos estavam habituados a jogar. O guarda-redes da Argentina, Américo Tesoriere, contou, anos mais tarde, que no seu país a bola habitualmente utilizada nos matchs era mais parecida com as que se utilizavam na Europa, de dimensões mais pequenas, e que os uruguaios diziam que aquilo era uma bola para as crianças jogarem. Após muita discussão, o árbitro Fanta decidiu-se pela “bola europeia”, para gaudio dos visitantes, sobretudo para o seu guarda-redes. Abra-se desde já aqui um parêntese para recordar que um episódio em (quase) tudo semelhante iria ocorrer seis anos depois na mesma cidade (Montevideu) e protagonizado por estas mesmas seleções, só que desta feita no primeiro Mundial da FIFA. Em 1930, uruguaios e argentinos queriam jogar a final do Campeonato do Mundo com as respetivas bolas, sendo que na altura o árbitro belga, John Langenus, repartiu o mal pelas aldeias, ou seja, decidiu que no primeiro tempo se iria jogar com a bola argentina e no segundo com a bola uruguaia. Mas voltemos aos acontecimentos da “final” da Copa América de 1924, onde os uruguaios dispuseram de inúmeras oportunidades para marcar, não fosse a boa atuação de Tesoriere, que mais habituado à “bola argentina” agarrava com facilidade o esférico sempre que este se aproximava da sua baliza. «Os uruguaios deviam ter-nos goleado, mas naquela tarde eu estava inspirado», contaria anos mais tarde Américo Tesoriere, que a propósito da avalanche ofensiva dos charruás neste encontro, recordou que a certa altura a bola pingou na área argentina onde apareceu o perigoso El Loco Romano pronto para desferir o golpe fatal. Apercebendo-se disso, Tesoriere antecipa-se ao avançado uruguaio ao adivinhar-lhe o lado para o qual aquele iria rematar. «Mergulhei para o lado esquerdo ainda antes dele rematar. Romano nem olhou e de pronto virou costas ao lance comemorando o golo. No entanto, como não ouviu gritos das bancadas virou-se para a baliza para ver o que se tinha passado, percebendo mais tarde que afinal eu tinha defendido aquele golo certo. Naquele momento ele virou-se para mim e disse um palavrão, mas depois confessou-me que não tinha entendido como eu tinha defendido aquele remate letal», contou o arquero argentino, que fruto da sua estupenda exibição seria no final carregado em ombros pelo próprio Romano e pelo companheiro de equipas deste, Alfredo Zibechi. Contas feitas, o encontro terminou empatado sem golos, o que de pronto conferiu o quinto título de campeão das américas ao Uruguai, que assim somava 5 pontos, mais um que os velhos inimigos da Argentina.

Lenda do futebol paraguaio nasce na Copa de 1924

Aurelio González

No terceiro lugar ficou a seleção do Paraguai, após ter vencido a sua congénere chilena por -1 na 3.ª e última jornada da prova. Uma vitória que muito se fica a dever a um então jovem de 19 anos, que fez neste Campeonato Sul-Americano a sua estreia pelo combinado guarani. Aurelio González, o seu nome. Nascido na cidade de Luque, a 25 de setembro de 1905, González é para muitos o melhor futebolista da história do Paraguai, sendo que a sua fama de goleador ao ultrapassar a fronteira dos campos de futebol, fizeram dele um verdadeiro herói deste país. Na Copa América de 1924, ele apontou dois dos três golos com que a sua seleção venceu o Chile, tornando-se a partir daquele momento na figura central da sua seleção, tendo inclusive, participado com esta no primeiro Mundial da FIFA, em 1930. Começou a despontar para o futebol no clube da sua terra, o Sportivo Luqueño, mas seria no Olimpia onde se tornou uma lenda, sendo conhecido como o Grande Capitão, tendo sido uma das figuras principais do primeiro tri-campeonato nacional (1927, 1928 e 1929) conquistado pelo emblema da capital. Na década de 30, González era já o mais popular futebolista paraguaio, quer do ponto de vista interno, quer externo, e como tal não foi de admirar que por esta altura os argentinos do San Lorenzo de Almagro lhe tivessem feito uma oferta milionária para se transferir para o clube daquele bairro de Buenos Aires. Oferta recusada por Aurelio, que pelo amor à pátria deixou de lado a bola para passar a servir o exército da sua nação na Guerra do Chaco, que opôs paraguaios a bolivianos. O conflito bélico entre os dois países paralisou o desporto local, e Aurelio González integrou o 14.º Regimento de Cerro Corá. Sobreviveu à guerra, foi elevado à categoria de herói nacional, pelo que fez dentro e fora dos campos de futebol. Faleceu a 9 de julho de 1997.

Nomes e números:

 

12 de outubro de 1924

Argentina – Paraguai: 0-0


19 de outubro de 1924

Uruguai – Chile: 5-0

(Pedro Petrone, 40, 53, 88; Pedro Zingone, 73; Ángel Romano, 78)


25 de outubro de 1924

Argentina – Chile: 2-0

(Gabino Sosa, 5; Juan Loyarte, 78)


26 de outubro de 1924

Uruguai – Paraguai: 3-1

(Pedro Petrone, 28; Ángel Romano, 37; Pedro Cea, 53)

(Urbieta Sosa, 77) 

Paraguaios saúdam a multidão em Montevideu


1 de novembro de 1924

Paraguai – Chile: 3-1

(Aurelio González, 15, 52; Ildefonso López, 33)

(David Arellano, 6) 

A guarda de honra feita aos campeões
da Copa América de 1924


2 de novembro de 1924

Uruguai – Argentina: 0-0

 

Classificação: 

1.º Uruguai: 5 pontos

2.º Argentina: 5 pontos

3.º Paraguai: 3 pontos

4.º Chile: 0 pontos

sexta-feira, abril 04, 2025

Museu Virtual do Futebol celebra o seu 19.º aniversário


E eis que hoje surgimos isolados rumo à baliza dos 20 anos de idade. Falta pouco, estamos a um remate de atingir duas décadas de vida a deambular pela história maravilhosa do Belo Jogo. Mas para já celebramos o nosso 19.º aniversário a percorrer com alegria e entusiasmo os retângulos mágicos do futebol a nível mundial. Obrigado a todos aqueles que da bancada virtual nos têm acompanhado e vibrado com cada golo que temos marcado. 

quinta-feira, abril 03, 2025

Efemérides do Futebol (54)... Trio de arbitragem recrutado na bancada

O insólito trio de arbitragem comandado pelo 
senhor José Nunes ladeado pelos capitães das equipas

A velha expressão popular de que “quem não tem cão, caça com gato” encaixaria na perfeição neste episódio insólito que há pouco mais de uma década a esta parte aconteceu no futebol português. No futebol do povo, há que sublinhá-lo, no futebol jogado em campos de terra batida de forma desinteressada e apaixonada. Mas voltando a esta efeméride bizarra para recuar até ao dia 10 de março de 2012, altura em que na 12.º jornada do hoje extinto Campeonato de Amadores da Associação de Futebol do Porto mediam forças a Associação Desportiva e Cultural de Frazão e o Clube Marechal Gomes da Costa (MGC). Até aqui tudo normal, menos o facto de a Paços de Ferreira – local do encontro – não se ter deslocado o trio de arbitragem! Aparentemente, como seria explicado mais tarde, um erro informático não designou nenhuma equipa de arbitragem para dirigir a partida. 
Não foi por falta de árbitros oficiais que não se jogou
futebol no pelado de Frazão

Mas não foi por isso que o jogo não se realizou, já que na bancada foram recrutados três espectadores que assumiram a responsabilidade de arbitrar o duelo. Mas e os cartões (?), perguntar-se-ão os ilustres leitores. Fácil, recorreu-se a cartões multibanco de cores amarela e vermelha para admoestar os jogadores quando fosse necessário. E o jogo lá chegou ao fim com a vitória dos portuenses do MGC por 2-1. Por certo, este foi um dia que ficou na memória do senhor José Nunes – o árbitro improvisado.

Grandes Mestres da Táctica (14)... Artur Baeta


É um facto que o futebol de formação em Portugal só começou a ser encarado com mais atenção, e acima de tudo com mais profissionalismo, com a chamada Geração de Ouro criada por Carlos Queirós na década de 80 do século passado. Porém, muito antes do professor Queirós promover o 25 de Abril do futebol em Portugal, outra figura olhou para a formação com uma atenção muito especial, dedicando-se de corpo e alma ao longo do seu trajeto pela modalidade a desenvolver não só os futebolistas do “amanhã”, mas acima de tudo promover a valorização do homem no seio do fenómeno desportivo. Essa figura foi, e é, Artur Baeta, um homem do sul (nasceu no Barreiro a 29 de julho de 1912) que construiu o seu legado no norte, como já iremos perceber nas próximas linhas. Como jogador de futebol teve uma carreira simples, sem grande pompa, com passagens pelo Barreirense e pelo Carcavelinhos na década de 30. A sua estrela começou, de facto, a brilhar assim que pendurou as chuteiras, começando por se exibir no clube da sua terra, o Barreirense, como um visionário no que ao futebol de formação diz respeito. No emblema do Barreiro fundou uma escola de jogadores, na década de 40, onde na qual evoluíam jovens a partir dos 15 anos de idade. Algo inédito para a época no Desporto Rei português. Artur Baeta não se limitava a ser um condutor de jovens futebolistas, mas de igual modo um mestre na vertente dos ensinamentos cívicos, um pedagogo de excelência, que aliou o desenvolvimento do jovem futebolista quer enquanto atleta, mas sobretudo, quer enquanto futuro homem, enquanto cidadão. 

Artur Baeta não vivia então exclusivamente do futebol, era funcionário público de profissão, tendo por esse motivo sido transferido, em meados dos anos 40, para a cidade do Porto, onde, de facto, viria a construir o seu legado de mestre na área do futebol de formação. O FC Porto em boa hora o recebeu, já que de pronto Artur Baeta revolucionou, no bom sentido, o setor da formação portista ao longo da década seguinte. Criou um gabinete técnico específico para as camadas jovens; passou a enfatizar a vida académica dos jovens futebolistas, incentivado, e até exigindo, bons resultados a nível escolar; passou a preocupar-se com alimentação dos seus jovens futebolistas; entre outros conceitos inovadores. Os frutos deste pioneirismo, digamos assim, foram colhidos em 1953, ano em que o FC Porto conquistou o seu primeiro título de campeão nacional de juniores, sob a batuta de Baeta. Nas Antas, os seus vastos conhecimentos seriam ainda aproveitados pela equipa sénior, já que nesta primeira passagem pelo clube da Cidade Invicta foi treinador-adjunto entre 1952 e 1954, desde logo de outro mestre do futebol nacional, Cândido de Oliveira. Aliás, o primeiro curso de treinadores de futebol organizado em Portugal, e, 1940, teve estes dois homens como atores: mestre Cândido no papel de professor, e Baeta como aluno.

Provou igualmente que era um excelente estratega no plano administrativo a nível mais generalizado, ou seja, ao ponto de reestruturar todo o funcionamento de um clube no que a futebol alude. Que o diga o Salgueiros, que em finais dos anos 50 beneficiou da sapiência de Artur Baeta. Em 1959, a secção de futebol do clube de Paranhos foi dirigida por este homem, tendo sido completamente reorganizada/reestruturada sob o ponto de vista interno no seu conjunto de obrigações e deveres; e no relacionamento entre dirigentes, técnicos e desportivas. No plano desportivo houve um volte face na postura do velho Salgueiral, tendo sido implementada uma filosofia mais profissionalizada do seu futebol, quer sob o ponto de vista da preparação física, quer no aspeto da psicológica. E também o Salgueiros colheu frutos desta política desportiva, já que logo na primeira temporada (59/60) sob o comando de Artur Baeta a equipa sénior subiu à 1.ª Divisão Nacional. Repetiu a façanha mais a sul na temporada de 61/62, quando guiou o Feirense até ao escalão maior português. Contudo, a sua grande paixão e talento era a formação, trabalhar com os jovens, e em 1963 regressa ao FC Porto para ajudar a formar centenas, para não dizer milhares, de futebolistas, alguns deles viriam a ser lendas do futebol portista, casos de Pavão, Artur Jorge, António Oliveira, Fernando Gomes, ou Rodolfo Reis. Todos estes jogadores evoluíram nas mãos de Artur Beata no mítico Campo da Constituição, verdadeiro alfobre de campeões, e que após a sua morte, em janeiro de 1999, se passou a denominar Campo da Constituição - Escola de Futebol Artur Baeta, sendo que já no novo milénio seria rebatizado para Vitalis Park/Campo da Constituição. Paralelamente à liderança do departamento de formação dos azuis-e-brancos, Artur Baeta deu uma perninha no jornalismo desportivo, notabilizando-se com os seus vastos conhecimentos do futebol de formação no Jornal de Notícias, no Mundo Desportivo, e no Norte Desportivo.  

quinta-feira, março 20, 2025

Jogos Memoráveis (9)... Belenenses - Barcelona (Taça UEFA 1987/88)

É gooooloooo do Belenenses!

No futebol existem vitórias que são encaradas como se títulos pomposos se tratassem. Mesmo até que esses triunfos na prática não tenham levado a caminho algum, ou por outras palavras, que não tenham evitado uma eliminação de uma qualquer competição. Mas sempre que o pequeno David vence o gigante Golias é sempre uma história inolvidável e digna de ser recordada vezes sem conta. E na temporada de 1987/88 o Belenenses vestiu a pele de David após vencer no seu estádio um Golias que dava pelo nome de Barcelona, em jogo da 2.ª mão da 1.ª eliminatória da então Taça UEFA. Foi um triunfo histórico, mas que na verdade não foi suficiente para que os azuis do Restelo afastassem os catalães da prova, isto é, na Cidade Condal registou-se um resultado favorável ao Barcelona por 2-0, e em Lisboa o emblema da Cruz de Cristo venceu por 1-0. E é precisamente sobre este célebre triunfo que hoje vamos recordar, o qual resultou de um dos jogos mais épicos realizados pelo grande Belenenses nas provas europeias. Numa nota introdutória a este momento, é de realçar que esta era a terceira vez que os dois clubes se encontram numa eliminatória das competições europeias, sendo que apesar de ultrapassar sempre o Belenenses, o Barça nunca ganhou um jogo disputado no Restelo, contabilizando dois empates e uma derrota. 


Pois bem, em 87/88 o Barcelona não viveu um grande momento desportivo, muito pelo contrário. A equipa ficou num modesto 6.º lugar na LigaEspanhola, caiu nos quartos-de-final da Taça UEFA, e nem a vitória na Copa del Rey apagou uma época tão cinzenta. E isso ficou logo patente no jogo da primeira mão da eliminatória ante do Belenenses, realizado em Camp Nou, em que só um milagre deu o triunfo (2-0) aos catalães no… período de compensação. A vitória sofrida fez-se sentir entre os adeptos blaugrana, que no final se despediram da sua equipa com lenços brancos, sendo que a vítima imediata desta indignação foi o treinador inglês Terry Venables, despedido pouco depois e substituído no cargo pelo espanhol Luis Aragonés. Não era por falta e argumentos que o Barça vivia, ou viveu, naquele ano uma fase negativa, muito pelo contrário. Nomes de craveira mundial como o inglês Gary Lineker, o alemão Bernd Schuster, ou os espanhóis Andoni Zubizarreta, Víctor Muñoz, Migueli, Julio Alberto, Urbano, ou Alexanko faziam daquele Barcelona um dos conjuntos mais bem apetrechados do futebol europeu. Porém, nem sempre fartura (de craques) é sinónimo de qualidade. E qualidade era também o que não faltava a um Belenenses que viveria nesta reta final dos anos 80 um dos melhores períodos da sua história. 

Um "onze" do Belém nessa temporada de 87/88

Orientado pelo brasileiro Marinho Peres – que enquanto futebolista havia passado, curiosamente, pelo Barcelona – os azuis do Restelo fizeram uma temporada soberba, que terminou com um 3.º lugar no campeonato nacional, o que lhes valeria uma nova qualificação para a Taça UEFA da época seguinte onde voltariam a escrever história, ao eliminar o então detentor do título uefeiro, o Bayer Leverkusen. Mas isso é uma outra história. Centremos atenções no jogo de 30 de setembro de 1987, no Estádio do Restelo, que veio a provar que eliminar o Barcelona depois de uma derrota por 2-0 em Camp Nou não era afinal uma missão assim tão impossível de atingir. Não aconteceu, é certo, mas esteve muito perto de ser alcançada como iremos perceber nas próximas linhas. A exibição dos lisboetas no encontro da 1.º mão galvanizou os adeptos belenenses, que acorreram em massa ao Restelo. Quiçá esperançados numa reviravolta épica, mais otimistas ficaram quando logo aos 4 minutos viram o cerebral Schuster perder no seu meio campo uma bola para o búlgaro Mladenov, que sem perder tempo sprintou pelo flanco esquerdo do seu ataque, entrou na área e cruzou para o miolo onde apareceu Mapuata solto de marcação para fazer um golo que fez explodir de alegria as bancadas do Restelo. «Cumpriu-se o primeiro desejo de Marinho Peres: que o Belenenses marcasse cedo», assim rezava o início da crónica do encontro escrita por Jorge Caiágua no jornal oficial do emblema da Cruz de Cristo. 

O lance do golo de Mapuata

O jornalista escrevia mais adiante que o clube português se bateu com empenho e dignidade, confirmando o valor da equipa. De facto, assistiu-se a um jogo quase de sentido único, o da baliza de Zubizarreta, muito por culpa dos pupilos de Marinho Peres, que entraram no relvado impondo um ritmo veloz ao jogo, antecipando-se às jogadas de ataque dos catalães quase sempre, e quando a bola era recuperada não perdiam tempo a lançá-la para os homens da frente. Na realidade, esta partida mostrou uma vez mais que além de o Belenenses estar numa excelente forma, o seu opositor continuava a jogar mal, e no Restelo viu-se um Barça que atuou sempre sobre brasas. Para se resguardar das investidas azuis, os catalães mastigaram sempre muito o jogo no seu meio campo ao longo da primeira parte. Chiquinho Conde e Mladenov, que juntamente com Mapuata formavam o tridente ofensivo do Belenenses nessa célebre noite, não aproveitaram as abertas que o Barcelona por vezes ia dando na sua zona defensiva. Ainda no primeiro tempo, o búlgaro e o moçambicano desperdiçaram flagrantes oportunidades para desfeitear o grande Zubi. Mas não era apenas o setor atacante dos portugueses a dar nas vistas, já que a defesa, comandada pelo capitão e líder do grupo, José António, esteve sublime quer na marcação, quer na antecipação de jogadas ofensivas dos catalães. José António e Sobrinho, a dupla de centrais do Belenenses, foi um verdadeiro muro nessa noite. O próprio José António aventurou-se algumas vezes no ataque da sua equipa, e num desses lances, já perto do fim, chegou um tudo ou nada atrasado a uma recarga após defesa incompleta de Zubizarreta a um cabeceamento de Chiquinho Conde


Não foram poucas as ocasiões em que na segunda metade vimos os jogadores do Barcelona a recorreram às faltas (algumas bem duras) para travar o ímpeto belenense. «Jogou tão bem o Belenenses, foi tão grande o esforço que desenvolveu frente à equipa do clube mais poderoso do Mundo, que Marinho Peres não hesitou em mandar entrar Luís Reina e Chico Faria, acabando o desafio com todos os avançados disponíveis, sempre com o objetivo de alcançar o segundo golo. E se esse risco que o técnico brasileiro correu numa demonstração cabal da sua grande visão estratégica, foi possível, não devemos esquecer desta vez, o acerto da defensiva azul, criticada noutras ocasiões, mas que na quarta-feira atuou com eficácia», assim analisava o jornalista Jorge Caiágua a exibição coletiva do seu clube. Apesar desta exibição categórica, culminada com uma inédita e mais do que merecida vitória sobre o todo poderoso Barcelona, o Belenenses ficava pelo caminho na Taça UEFA, um desfecho algo injusto para o futebol produzido pelos azuis nos dois jogos, sobretudo no do Restelo. «Foi pena. Vencemos mas deixamos a Taça UEFA com uma certa frustração. Caímos de pé», rematou assim a crónica o jornalista do órgão de comunicação oficial do Belenenses. 

Schuster e Lineker, duas das grandes 
estrelas do Barça de 87/88

Anos mais tarde, numa entrevista à RTP em que juntamente com Jaime recordou este jogo, o defesa Sobrinho confessou que antes deste jogo se abeirou da estrela inglesa do Barça, Gary Lineker, no sentido de com este trocar de camisola no final, ao que o inglês terá respondido: “depois vemos isso”. Porém, seria o próprio Lineker que após o apito final do suíço Kurt Rothlisberger foi ter com Sobrinho a pedir para trocarem de camisola, confessando ao jogador português que nunca ninguém lhe tinha feito uma marcação tão cerrada e ao mesmo tempo disciplinada como a que o defesa central belenenses lhe fez naquela noite.

Para a eternidade, aqui fica a ficha deste célebre capítulo da história do Belenenses nas provas da UEFA.

Belenenses: Jorge Martins, Teixeira, José António, Sobrinho, Artur Fonte (Luís Reina, 54), Paulo Monteiro (Chico Faria, 69), Jaime Mercês, Juanico, Mapuata, Mladenov, e Chiquinho Conde. Treinador: Marinho Peres.

Barcelona: Zubizarreta, Gerardo Miranda, Moratalla, Migueli, Julio Alberto, Urbano, Víctor Muñoz, Bernd Schuster, Roberto Fernández, Gary Lineker, e Lobo Carrasco. Treinador: Luis Aragónes.

Vídeo do histórico golo de Mapuata diante do Barcelona:



segunda-feira, março 03, 2025

Viagem (real) ao passado para (re)viver o primeiro jogo oficial realizado em Portugal

 


O dia 1 de março de 2025 ficou assinalado por uma viagem ao passado para reviver um momento histórico do futebol português. No dia 2 de março de 1894, a cidade do Porto foi palco do primeiro jogo oficial de futebol em Portugal, um acontecimento que teve lugar no campo do Oporto Cricket Club (na zona do Campo Alegre) e que (mais de) 130 anos volvidos foi vivenciado com uma recriação histórica inesquecível. 




O histórico match teve lugar no mesmo local de há 130 anos atrás, e toda a sua envolvência e espírito foram recriados de forma original, desde os peculiares equipamentos da época, as balizas rudimentares, as marcações do campo, as regras do então recém-nascido (em Portugal) football, a chegada de El Rei Dom Carlos e a Rainha Dona Amélia quando o jogo ia já na 2.ª parte, e a própria taça, a original, que fez as delícias de quem presenciou esta recriação daquele que foi o primeiro jogo oficial (e por consequência o primeiro troféu atribuído ao vencedor) da história do futebol em Portugal.

O team de Lisboa


O team do Porto
Foi de facto uma experiência única e fascinante para quem vive apaixonado pelo passado do Belo Jogo. Esta encenação futebolística, digamos assim, contou com a presença de gente ilustre do passado (mais recente) futebol português. Desde logo os futebolistas que no relvado do Oporto Cricket Club (o clube mais antigo da Cidade Invicta) recriaram o jogo de 1894. Do lado da seleção de Lisboa pudemos rever craques como Quim Berto, Fernando Nélson, Gaúcho, ou Rebelo, que se faziam acompanhar por outros nomes (talvez) menos conhecidos do grande público, a saber Brito, Ferreira, André Reis, Fernando Gonçalves, Tiago Henrique, Nuno Teixeira, Pedro Rodrigues, Nuno Horta, Hugo Fonseca, Nuno Miguel Teixeira, Nuno Rosário, Soeiro e Renato Anjos. Do lado da seleção portuense não faltaram lendas do Futebol Clube do Porto, desde logo o eterno capitão João Pinto, que se fez acompanhar por Derlei, Rolando, Ricardo Silva, Bandeirinha, Bruno Vale, Tiago Cintra, Artur Alexandre,  Joca Valente, Costa e Almeida,  Hélder Barbosa, Nuno André Coelho e Marek Cech. 


Contrariamente ao que aconteceu há (mais de) 130 anos, altura em que a seleção lisboeta capitaneada por Guilherme Pinto Basto venceu a sua congénere portuense por 1-0, desta feita o team do Porto bateu o de Lisboa por 4-1 perante o olhar de Suas Majestades El Rei Dom Carlos e a Rainha Dona Amélia, que tal como em 1894 chegaram ao match a meio da segunda parte, na charrete real. A presença da “família real” deu de facto um colorido ainda mais brilhante a esta encenação histórica. Ainda em relação ao match há que dizer que este foi precedido da interpretação do “Hino do Infante D. Henrique”, composto por Alfredo Keil e H. Lopes de Mendonça para as comemorações Henriquinas de 1894.


Fascinante e emocionante (pelo menos para quem escreve estas linhas) foi ver de perto e poder tocar na “Cup D’El Rei”, o troféu mais antigo do futebol português, o primeiro troféu a ser disputado em Portugal, há que sublinhá-lo, e quiçá por esse simples facto o tornam numa relíquia sem par na nossa história.

quinta-feira, fevereiro 06, 2025

Histórias do Planeta da Bola (34)... Há 100 anos a Inglaterra testemunhou o primeiro preconceito racial na sua seleção


Barrar a convocatória de um futebolista para uma qualquer equipa devido à cor da sua pele é aos olhos da atualidade um ato criminoso e acima de tudo vergonhoso. Mas há precisamente 100 anos atrás nem toda a gente pensava desta forma, ou pelo menos julga-se que assim era quando recordamos o caso de Jack Leslie, o primeiro negro a ser convocado e ao mesmo tempo desconvocado para a seleção inglesa. Nascido no bairro londrino de Canning Town, no dia 17 de agosto de 1901, Jack era filho de pai jamaicano e mãe inglesa. Ao serviço do Barking Town, modesto emblema de outro bairro da capital inglesa, Leslie cedo começou a dar nas vistas pela sua veia goleadora. Conta-se que terá marcado ao serviço deste emblema mais de 250 golos nos primeiros anos de carreira, tendo tido um contributo preponderante para a conquistas da Taça Sénior Essex, em 1920; da London League Premier Division, no ano seguinte. Os feitos de Leslie começaram a ultrapassar as fronteiras de Londres, e em 1921 é contratado pelo Plymouth Argyle, clube do sudeste de Inglaterra, onde se tornaria uma verdadeira lenda nos 14 anos seguintes. Nos 400 encontros realizados com o clube apontou um total de 137 golos, fazendo uma dupla mortífera com outro ícone do clube, Sammy Black, uma parceria que ao longo de todos estes anos rendeu mais de 300 golos aos Pilgrims, a alcunha pelo qual é conhecido este emblema. E seria precisamente no auge da sua carreira, que em 1925 Leslie recebe da boca do seu treinador, Bob Jack, a notícia de que estava convocado para jogar pela seleção inglesa num jogo contra a Irlanda. A boa nova, para Leslie, foi divulgada pela imprensa, tendo o Birmingham Gazette e o Liverpool Echo feito eco da notícia. Porém, e para espanto de todos, quando a convocatória oficial saiu o nome de Jack Leslie não estava mencionado (!), sem qualquer explicação posterior dada pela Football Association (FA). De pronto, surgiram teorias de que Leslie tinha sido riscado da convocatória final devido à cor da sua pele, já que quando os responsáveis pela seleção se aperceberam que o jogador era negro simplesmente voltaram atrás na decisão de o convocar. Anos mais tarde, a FA admitiu que os seus dirigentes não sabiam inicialmente que Leslie era negro, e quando descobriram… já se sabe o resto da história. Em 1978, Leslie deu uma entrevista ao jornal Daily Mail em que disse que quando a FA descobriu que ele era negro julgaram que seria estrangeiro e como tal foi descartado da convocatória. Em 2022, ano em que Jack Leslie havia já deixado o mundo dos vivos (faleceu em 1988), a FA admitiu o erro que cometeu em 1925 e chamou os descendentes do jogador ao Estádio de Wembley, tendo-lhes entregue um boné! Sim, um boné que simbolizava a internacionalização que deveria ter acontecido quase (e então) 100 anos antes. Uma espécie de pedido de desculpas que, quiçá, terá chegado tarde demais, e que veio fazer justiça a um jogador que após pendurar as chuteiras  passou o restos dos seus dias a limpar… chuteiras. Sim, nas décadas de 60 e 70 Leslie seria funcionário do West Ham United, onde se ocupava de tratar/limpar das botas/chuteiras dos futebolistas dos Hammers, entre outros de lendas como Bobby Moore, Geoff Hurst, e Martin Peters, três campeões do Mundo ao serviço da Inglaterra, em 1966. Seleção inglesa que apenas em 1978 veria um jogador negro vestir a sua camisola: Viv Anderson, o seu nome.

 

quarta-feira, fevereiro 05, 2025

Grandes Mestres do Jornalismo Desportivo (26)... Nuno Ferrari


Hoje é dia de lembrar Nuno Ferrari, o poeta da imagem. Falar desta figura nascida a 6 de março de 1935 é simplesmente falar do maior repórter fotográfico do desporto (muito em particular do futebol) português. E assim o é, não apenas pelo seu dom na arte de fotografar, mas de igual modo, e sobretudo, porque foi ele o grande operário da revolução – no bom sentido da palavra – no jornalismo desportivo nacional no que à imagem diz respeito. Nuno José da Fonseca Ferreira, o seu nome de batismo, e que adotou o nome de Ferrari devido a um dos pioneiros da fotografia desportiva em Portugal; apesar de não usar caneta nem a máquina de escrever criou centenas, se não mesmo milhares, de obras de arte jornalísticas na história da imprensa desportiva portuguesa. E tudo através da fotografia, imagens que só de olhar para elas erámos capazes de conhecer uma história sem precisar de ler o título ou a crónica que a acompanhava. Aliás, muitas das suas fotografias inspiraram grandes vultos da escrita desportiva a escrever as suas prosas, tendo ele mesmo, Nuno Ferrari, rivalizado, no sentido positivo, com esses monstros sagrados da escrita desportiva em termos de preponderância. Nuno Ferrari era um artista, um criativo, um fotojornalista que não se limitava a tirar simples bonecos (vulgo, fotografias) de um jogo de futebol, ou de outro qualquer evento desportivo. Ele captava o sentimento da pessoa que fotografava, a título de exemplo, sendo que este seu talento mudaria até aos dias de hoje a forma como vemos o futebol, e o desporto em geral, quando este é impresso num qualquer jornal desportivo. Combinava talento e qualidade com o saber esperar pelo momento certo para tirar a fotografia. Olhar para as fotografias de Nuno Ferrari era (e é) como se estivéssemos a viver o momento in loco. Existe um “antes” e um “depois” de Nuno Ferrari no jornalismo desportivo português. Antes da sua chegada ao jornal A Bola, a 7 de março de 1953, as primeiras páginas dos jornais desportivos praticamente só tinham texto, e mesmo o interior era composto apenas pelas prosas jornalísticas, sem o colorido (mesmo que a preto e branco) da imagem. Com a chegada de Ferrari ao jornal da Travessa da Queimada, isso mudou, e a suas fotos começaram a acompanhar não só as crónicas publicadas no interior do jornal, como também as manchetes da primeira página. A Bola, o jornal que Nuno Ferrari dedicou toda a sua vida profissional, pode considerar-se como uma publicação pioneira no que toca à espécie de nova linguagem jornalística criada, onde a imagem passou a fazer parte da história que era contada. Aliás, e como já fizemos alusão, as fotografias deste vulto do jornalismo desportivo só por si contavam muitas vezes as histórias que A Bola publicou. Carlos Pinhão, um dos muitos nomes míticos deste jornal, quando um dia foi desafio a definir Nuno Ferrari numa só palavra de pronto o rotulou como «insubstituível». Também Vítor Serpa, outro ícone de A Bola, disse certa vez que «se costuma dizer que não há ninguém insubstituível. Bom… talvez com exceção do Nuno Ferrari». Ao longo dos seus 43 anos de carreira, o célebre fotojornalista esteve presente em dezenas de momentos importantes do desporto nacional, com destaque, se calhar, para o Campeonato do Mundo de 1966, onde captou a lendária imagem de Eusébio a deixar o relvado de Wembley em lágrimas, após Portugal ter sido eliminado pela Inglaterra. Nuno Ferrari morreu em serviço, no Estádio da Luz, quando fazia a cobertura de um jogo do Benfica.