Gotemburgo nos finais do século XIX, altura em que o futebol aqui chegou |
Inglaterra, o berço do futebol moderno.
Foi daqui que ele – o então ainda jovem football – partiu à conquista do
resto do Mundo pela mão de marinheiros, mineiros, ferroviários, ou diplomatas
que na bagagem rumo a outras paragens (por motivos profissionais) levavam
recordações alusivas à sua amada pátria no sentido de minimizar a saudade de
casa. Entre os muitos objetos saudosistas estava, naturalmente, a bola de
futebol, que nos tempos livres assumia protagonismo entre os súditos de Sua
Majestade.
Brincadeiras que rapidamente
contagiaram os habitantes locais, criando-se clubes, campos, duelos acesos, ligas,
e acima de tudo uma enorme paixão que foi crescendo até aos dias de hoje. Foi
assim um pouco por todo Mundo onde o Belo
Jogo se implementou e criou raízes.
Tal e qual uma qualquer carga ou
mercadoria foi pela via marítima que o futebol chegou a grande parte dos países
do globo terrestre, começando, consequentemente, por se implementar nas cidades
portuárias para depois se expandir para o interior dos territórios. Foi assim
na cidade que hoje visitamos, uma cidade por natureza fria mas extremamente
quente no que a capítulos de inolvidável glória futebolística diz respeito.
Bem vindo a Gotemburgo.
Trabalhadores britânicos dos caminhos de ferro |
Mas comecemos pelo início. Estávamos em
1870 quando cravadores escoceses, marinheiros ingleses, engenheiros e
trabalhadores dos caminhos de ferro britânicos atracavam naquela que é hoje a segunda maior cidade da Suécia -
logo atrás da capital Estocolmo -, localizada na foz do rio Gota e cenário do
maior porto dos países nórdicos em busca de melhores condições de vida.
Gotemburgo foi pois o centro da ação dos primeiros tempos em que a bola rolou
em território sueco, sendo que com a rápida incursão dos mestres ingleses por
outros pontos do país o jogo passou a desenrolar-se noutras cidades, como por
exemplo Malmo, dista a cerca de 275 quilómetros de Gotemburgo. Foi precisamente
em Malmo que 20 anos depois do football ter
atracado na Suécia se desenrolou o primeiro
jogo oficial, isto é, disputado sob as regras da Football Association, na Suécia.
Facto ocorrido então em 1890, quando no
pequeno velódromo de ciclismo de Malmo um clube da vizinha Dinamarca, o Kobenhavns Bold Club, dividiu o seu grupo
de atletas em duas equipas e levou à cena uma espécie de jogo de exibição para
os habitantes locais.
Dois anos após este capítulo a História da Bola na Suécia conheceu
outro momento importante, quando em Gotemburgo se defrontaram pela primeira vez
duas equipas suecas. entre o Orgryte IS e o Lyckans Soldater, em Heden, um
campo no centro de Gotemburgo. Facto ocorrido na zona de Heden, no centro de
Gotemburgo, quando num pequeno campo ali erguido aquele que ainda hoje é
considerado como o primeiro gigante do futebol sueco mediu forças com o
combinado do Lyckans Soldater.
Equipa do Orgryte que venceu a primeira edição do campeonato sueco em 1896 |
Gigante esse que dá pelo nome de
Orgryte Idrottsallskap, fundado a 4 de dezembro de 1887, e que contribuiu
imenso para o crescimento do futebol no país. A influência britânica neste
emblema fez-se notar desde a nascença, influência, e sobretudo mestria, essa
que fez do Orgryte o clube dominador do futebol sueco nas primeiras duas
décadas de vida da liga sueca, criada em finais do século XIX - 1896, para
sermos mais precisos. Emblema apoiado pela classe média da cidade, o Orgryte
entrou para a história não só por ter vencido os primeiros títulos oficiais do
país, mas de igual modo por ser o primeiro a criar infraestruturas condignas para a prática do
jogo ao erguer logo após a sua fundação o primeiro campo desportivo da cidade,
o Balders Hage (1887). Porém, com o crescimento do futebol cerca de 9 anos
volvidos é construído um templo maior, o Goteborgs velociped klubb. Foi aqui
que a Suécia jogou o seu primeiro jogo internacional, em 1908, contra a
Noruega. Foi também neste ano que o Orgryte construiu na zona de Walhalla um
estádio ainda maior, com capacidade para 8000 pessoas, com a missão de
substituir o Balders Hage, já pequeno demais face à grandeza do clube.
O
Walhalla foi inaugurado num jogo ante o campeão alemão, o Viktoria Berlim, em 6
de setembro de 1908 numa altura em que o Orgryte detinha já nos eu currículo
oito títulos de campeão sueco em 12 edições de uma liga que começou a ser
disputada em 1896 e que até 1900 era restrita apenas a clubes de Gotemburgo. Só
a partir deste primeiro ano do século XX é que os emblemas de Estocolmo foram
inseridos na liga.
O símbolo e as cores do IFK Gotemburgo |
A
popularização do futebol torna-se viral na Suécia a partir do novo século, nascendo
"aqui e ali" as primeiras rivalidades locais. E em 1904 nasce em
Gotemburgo aquele que viria não só a ser o maior opositor do Orgryte a nível
local como também o responsável pelo (hoje) declínio do primeiro gigante do
futebol sueco: o IFK. O facto de ser um clube que nasceu em berço pobre, de ser
um clube do povo, nascido por influência da classe trabalhadora de Gotemburgo e
por estudantes locais, contrariamente ao Orgryte, um clube apoiado pela classe
média-alta da cidade e com forte influência britânica (muitos dos seus
principais jogadores eram ingleses e escoceses), tornou o IFK popular e com o
passar dos anos no clube de maior sucesso do futebol da Suécia. A ultrapassagem
em termos de popularidade do IFK ao vizinho Orgryte começou a ser dada em 1907
quando os primeiros batem pela primeira vez os segundos num jogo oficial.
Com o
passar dos anos o IFK atraiu a si uma multidão cada vez maior, ao passo que o
Orgryte começou a perder fulgor a partir dos anos 30, e consequentemente
poderio financeiro para lutar com o rival IFK não só a nível local como a nível
nacional e a prova disso é que o após 1930 apenas por uma vez conseguiu
alcançar o título nacional, em 1985, vagueando hoje pelas ruas da amargura, o
mesmo será dizer, pelas divisões secundárias do futebol sueco.
Contudo,
ninguém pode apagar a história, e a história diz-nos que estamos perante o
primeiro grande clube da Suécia que entre 1896 e 1930 conquistou 13 dos seus 14
títulos de campeão nacional, e acima de tudo contribuiu para o crescimento do Belo Jogo no país. Hoje, como já vimos,
atua na 2.ª Divisão sueca, continua a ser um clube apoiado pela classe média
alta da cidade, mas humilde e com pouca ou nenhuma expressão no futebol
nacional.
Do
outro lado, está o clube mais popular e dos mais titulados da Suécia, o IFK,
com 18 títulos de campeão nacional - superado apenas pelo Malmo, com 20 - e o
único emblema do país a triunfar nas competições europeias de clubes.
Rivais de Gotemburgo partilham a primeira
lenda do futebol sueco
Erik Borjesson, a primeira lenda sueca |
Além de
uma outrora acesa rivalidade, algo que hoje em dia não acontece, precisamente
pela distância em termos de dimensão que os dois clubes se encontram, Orgryte e
IFK partilham o privilégio de terem sido defendidos por aquele que é
considerado como a primeira grande lenda do futebol sueco: Erik Borjesson.
Nascido
em Jonsered, uma pequena cidade nos arredores de Gotemburgo, no dia 1 de
dezembro de 1888, Borjesson começou a trabalhar cedo, aos 12 anos, numa fábrica
local, onde ainda cedo perdeu dois dedos num acidente de trabalho. Facto que
não o impediria de brilhar pelo clube da sua terra natal, o GIF, centrando em
si os olhares dos grandes clubes de Gotemburgo que correram pela sua
contratação. Ganhou a corrida o IFK, que a partir de 1907 começa a beneficiar
da ímpar habilidade e perícia no remate de Erik Borjesson para lograr alcançar
os seus primeiros títulos. Ele foi decisivo em 1908 na conquista do primeiro
campeonato por parte dos azuis e brancos de Gotemburgo.
Dois
anos depois (1910) ele troca de camisola, passando a envergar a dos grandes
rivais do IFK, o Orgryte, mas por pouco tempo, já que em 1912 retorna ao IFK
num ano de grande importância para o futebol sueco. É neste ano que o país
organiza os Jogos Olímpicos, cabendo a Estocolmo a responsabilidade de sediar o
maior evento desportivo do planeta. Borjesson é um dos nomes principais da
seleção sueca que disputa o torneio de futebol olímpico, seleção a quem o
Orgryte dá nove jogadores e o IFK dois, prova do poderio dos dois clubes. As
esperanças suecas em fazer um bom torneio são eclipsadas logo na primeira
eliminatória aos pés da Holanda, que no Estádio Olímpico batem os anfitriões
por 4-3.
Um dos três tentos suecos é da autoria de Erik Borjesson que até final
da sua carreira (1925) declina um pomposo convite que poderia, quiçá, ter
tornado a sua lenda ainda maior. Estávamos em 1914, quando após um amigável
entre o IFK e o Liverpool o clube inglês quis contratar o talentoso sueco que
por sua vez disse "não". Até 1920 defendeu as cores do IFK
Gotemburgo, ao serviço do qual conquistou em 1918 mais um título nacional.
entre 1920 e 1922 não se lhe conhece quaisquer atividade desportiva, tendo
regressado aos relvados em 1923 para voltar a defender as cores do outro clube
da cidade, o Orgryte, algo que fez até 1925 quando colocou então um ponto final
na carreira. Pela Suécia Borjesson jogou um total de 17 jogos internacionais,
tendo marcado 14 golos. Faleceu em 1983, já depois de ter visto o homem que lhe
sucedeu no Mundo do Futebol na qualidade de filho pródigo de Gotemburgo a
vingar no Planeta da Bola.
Balders Hege,o primeiro templo do futebol em Gotemburgo |
A fábula Gre-No-Li tem raízes em Gotemburgo
O famoso trio Gre-No-Li ao serviço do Milan |
Em 1920
nascia na cidade aquele que haveria de ser um dos principais símbolos do
desporto sueco dos anos 40 e 50. Filho de um carpinteiro local ele nasceu com o
talento ímpar que ainda hoje fazem dele uma lenda viva do desporto deste país,
apesar de já deixado o Mundo terrestre em 1991. O seu nome é Gunnar Gren.
Com
apenas 13 anos ele mostrou a sua perícia com uma bola de futebol ao vencer um
prémio de malabarismos com o esférico, e aos 17 era já a estrela principal do
Garda, um pequeno clube de Gotemburgo que tinha sido fundado no final dos anos
20. Ali, ele despertou a atenção de um dos gigantes da cidade, no caso o IFK,
que o contrata em 1941. Ao serviço deste clube venceu apenas uma liga (em 1942)
mas entrou para a história após vencer a primeira edição do prémio de melhor
marcador do campeonato sueco, em 1946.
Mas a
lenda de Gren ganhou maiores contornos ao serviço da seleção nacional, cuja
camisola ele vestiu pela primeira vez ainda antes de se transferir para o IFK,
em 1940. Envergou a camisola amarela da Suécia em quase 60 ocasiões (57 para
sermos mais precisos) entre 1940 e 1958, quase sempre na companhia dos seus
inseparáveis companheiros e amigos Gunnar Nordhal e Nils Liedholm, com quem
formou um dos trios atacantes mais sublimes e mortíferos - para os adversários
- do futebol planetário: o Gre-No-Li.
Gunnar Gren com a camisola do IFK |
Na
verdade, esta sigla não é mais do que as primeiras sílabas dos nomes Gren,
Nordhal e Liedholm. Sob a liderança destes três artistas a Suécia viveu a era
mais gloriosa da sua história no que ao futebol concerne. Em 1948, eles foram
os responsáveis pela conquista daquele que é ainda hoje o título mais
importante do futebol sueco, a medalha de ouro dos Jogos Olímpicos que nesse
ano decorreram em Londres.
Treinada
pelo inglês George Raynor - e aqui se constata a contínua influência dos
britânicos no futebol deste país - os suecos começaram por vencer a Áustria
(3-0) para depois esmagaram a Coreia (12-0). Nas meias-finais, encontraram pela
frente os vizinhos da Dinamarca, que até se adiantou no marcador, mas os suecos
deram a volta e ganharam por 4-2.
Na
final, disputada no majestoso Estádio de Wembley, os escandinavos tiveram pela
frente a Jugoslávia. A contenda foi resolvida pelo trio Gre-No-Li. Gren marcou
dois golos e Nordhal o outro da vitória por 3-1 que garantiu a conquista do
ouro olímpico.
Depois
deste brilharete os três jogadores foram aliciados por clubes de grande
dimensão. O primeiro a morder o anzol
foi Nordhal, que seria contratado pelo Milan, precisamente na temporada de
48-49. Uma transferência polémica, já que o facto de na Suécia o futebol ser
então ainda amador e os jogadores eram obrigados a ter uma profissão fora dos
retângulos de jogo, fez com que Gunnar Nordhal fosse obrigado a abandonar a
seleção. Nada que impedisse que uma temporada mais tarde Gren e Liedholm
seguissem as pisadas do seu compatriota e também eles assinassem pelo emblema
de Milão.
A
partir de então o trio Gre-No-Li tornou-se a atração principal de todos aqueles
que se sentavam nas bancadas dos estádios italianos para ver o Milan jogar.
Juntos apenas venceram um Scudetto
(50-51) bem como uma Taça Latina (nessa mesma temporada).
Com a
saída de Gren para a Fiorentina em 1953 o trio separou-se, mas a magia dos três
exímios executantes suecos continuou por mais alguns anos em Itália em emblemas
como o Génova, ou Roma.
O momento de ouro do futebol sueco em 1948 |
Com a
abolição da proibição do profissionalismo no futebol sueco dois destes três
artistas ainda voltaram a vestir a camisola da seleção nórdica, nomeadamente Gren
e Liedholm . Os dois integraram a equipa nacional que em 1958 atuou em casa no
Campeonato do Mundo que seria ganho pelo Brasil, que na final derrotou
precisamente a seleção sueca, por 5-2, que assim alcançava o seu segundo maior
feito na sua história: ser vice-campeã do Mundo. E Gren esteve lá, ele que
depois de regressar de Itália ainda atuou Orgryte e nos GAIS, outro pequeno
emblema da cidade de Gotemburgo.
1958 é
pois um ano de ouro para a Suécia, não só porque acolheu o maior certame
futebolístico planetário, como também pelo facto de se ter sagrado
vice-campeã mundial face a uma equipa...
do outro Mundo.
Deuses do futebol brasileiro nascem em
Gotemburgo
Os Deuses Pelé e Garrincha |
Para
muitos historiadores do Belo Jogo
terá sido na Suécia, e quiçá em Gotemburgo, que o Brasil se tornou no país do
futebol, em que se tornou rei do futebol além fronteiras. Foi na Suécia que os
brasileiros foram coroados pela primeira vez como campeões do Mundo, depois de
nas cinco primeiras edições da Copa do
Mundo terem feito campanhas modestas ou mesmo dramáticas como a de 1950
quando em pleno Maracanã viram o Uruguai levar para casa a taça.
O
fantasma do Maracanã estava pois bem vivo no seio da seleção antes da partida
para a Suécia em 58. A seleção partiu desacreditada para o continente europeu não
só por tudo que tinha feito em copas
anteriores, mas também pela sofrida qualificação - empate com o Peru, em Lima, 1-1,
e uma vitória medíocre contra a mesma seleção, por 1-0, no Maracanã, graças a
um golo de Didi. Comandada por Vicente Feola a seleção incorporava alguns dos
maiores talentos do país, casos de Didi, Djalma Santos, Bellini, Mauro, Nilton
Santos, Vavá, Zagallo, Pepe, entre tantos outros. E junto destes estavam dois
então profundos desconhecidos para o resto do Mundo, dois jovens que hoje
repousam no Panteão dos Imortais do
futebol, duas lendas, dois génios que jamais o Mundo irá esquecer. Pelé e
Garrincha. Dois nomes que ajudaram a matar o fantasma do Maracanã, senão mesmo
os principais responsáveis pela morte desse temível fantasma.
Mas
hoje a história poderia ser bem diferente caso ambos não tivessem viajado para
a Suécia, como esteve para acontecer na antecâmara do Mundial.
E vai Mané Garricnha para mais um drible |
O
jornalista e escritor Ruy Castro conta no seu livro " Estrela Solitária –
Um brasileiro chamado Garrincha" que «em 1958, a Confederação Brasileira
de Desportos (CBD) contratou o psicólogo João Carvalhaes para submeter os
atletas a testes de “avaliação de inteligência e equilíbrio psicológico”. Os
exercícios consistiam em completar figuras pela metade ou desenhar o que viesse
à cabeça e dizer o que significava. Num máximo de 123 pontos, Garrincha fez
somente 38. Pelé fez 68. O psicólogo definiu o jovem de 17 anos com essas
palavras: “Pelé é obviamente infantil. Falta-lhe o necessário espírito de luta.
É jovem demais para sentir as agressões e reagir com a força adequada. [...]
Não acho aconselhável seu aproveitamento».
Já
Garrincha, obteve uma nota 38 nos testes e com esse desempenho ele estava
reprovado num comum exame de condução! Face a este fraco desempenho o psicólogo
da seleção concluiu que Mané não tinha condições de participar em jogos de
muita pressão como eram os de um Campeonato do Mundo. Além disso, Garrincha
tinha um pormenor físico curioso: tinha as pernas tortas. A sua perna direita
era seis centímetros mais curta que a sua perna esquerda, além de que a direita
era flexionada para o lado esquerdo, tal como a perna esquerda. Era assim como
que um... desenho animado mal... desenhado.
Contudo,
apesar desta avaliação médica a sorte dos jogadores, e da própria nação, acabou
por vir ao de cima, já que Julinho, o habitual dono do lugar que Garrincha
ocupava em campo, recusou representar a seleção. Isto porque atuava em Itália
na altura e achava que não era justo jogadores que atuavam no estrangeiro
ocuparem o lugar de atletas que desenvolviam a sua carreira em solo brasileiro,
pelo que Mané ficou com o lugar e viajou para a Suécia.
Pelé foi decisivo contra o País de Gales em Gotemburgo |
Já
Pelé, os seus colegas de seleção e o próprio selecionador insistiram na sua
convocação, e mesmo contra o diagnóstico do psicólogo o jovem oriundo de Três
Corações também seguiu viagem para a Europa.
Contudo,
os dois jogadores ficaram de fora nos dois primeiros jogos do Brasil na Copa. O
escrete fez a estreia no Mundial em
Gotemburgo diante da Áustria, tendo vencido por 3-0 mas sem convencer.
Seguiu-se a Inglaterra, também em Gotemburgo, num palco inaugurado precisamente
nesse ano de 1958 e que hoje mais do que ser o mais emblemático estádio do
futebol sueco e igualmente um dos templos mais mediáticos do futebol
planetário, por tudo o que irá ser escrito daqui em diante. Senhoras e senhores
bem vindos ao majestoso Ullevi Stadium.
Foi aqui que nasceram inúmeros mitos, e o do Brasil foi talvez o primeiro
deles.
Pelé e Garrincha festejam o título mundial |
Mas
voltemos à partida com a Inglaterra, em que o Brasil empatou de forma dramática
a zero bolas, onde o guardião inglês defendeu tudo o que havia para defender e
os sul-amercianos quase perderam. O alarme soou então. Reunião de emergência
entre o selecionador e alguns dos jogadores mais influentes. O resultado fazia
recordar, ou antever, 1950, o Maracanazo,
e urgia encontrar uma solução para que tal não se voltasse a repetir. E a
solução estava no banco: Pelé e Garrincha. Os dois seriam titulares no encontro
decisivo do grupo ante os cientistas do futebol, a União Soviética, que dois
anos antes havia vencido o torneio olímpico de futebol e dois anos mais tarde
seria coroada campeã da Europa. Uma super equipa liderada desde a baliza pelo
lendário Lev Yashin.
O dia
15 de junho de 1958 entra para a história da própria Humanidade, pois nesse dia
Pelé e Garrincha mostraram-se pela primeira vez ao Mundo num grande palco, num
Campeonato do Mundo. Naquele dia em Gotemburgo nasciam dois Deuses do futebol.
Nesse jogo o Brasil deslumbrou, jogou um futebol ofensivo e brilhante sob o
ponto de vista técnico. Sobretudo, porque tinha Garrincha, que driblou meia
equipa da União Soviética vezes sem conta para delírio dos sortudos que nesse
dia estiveram nas bancadas do Ullevi
Stadium. Criativo o quanto baste o ponta direita do escrete ofuscou o futebol cientifico dos soviéticos, sendo decisivo
para uma vitória de 2-0 que qualificou o Brasil para a fase seguinte. O resto
desta história é apenas isso, história. Pelé seria decisivo ante o País de Gales
nos quartos de final, também disputados em Gotemburgo, e demolidor na meia
final contra a França. E na grande final foi a vez da anfitriã Suécia
testemunhar a magia e arte dos dois jogadores que integraram uma das maiores
equipas de futebol de sempre, o Brasil de 58. O Brasil campeão do Mundo de
1958. E tudo começou em Gotemburgo. Com Pelé e Garrincha juntos em campo a
seleção brasileira nunca foi derrotada: foram 40 jogos, com 36 vitórias e
quatro empates! É obra.
Na Suécia o Brasil é campeão do Mundo pela primeira vez |
Gotemburgo: Paraíso de outsiders
Sven Goran Eriksson nos tempos do IFK |
Quando
o capitão Bellini ergueu em Estocolmo a primeira taça Jules Rimet da história
do Brasil, na pequena cidade sueca de Torsby vivia uma criança de apenas 4 anos
que muito provavelmente estaria longe de imaginar o quão importante tinha sido
aquela conquista para a nação sul-americana, mas mais ainda distante de sonhar
que também haveria de entrar na História do futebol. Após uma não muito bem
sucedida carreira de futebolista nos escalões secundários do futebol sueco a
par de um emprego enquanto professor de Educação Física em Orebro, eis que com
apenas 27 anos decide pendurar as chuteiras e dar início a uma brilhante
carreira de treinador. O seu nome é Sven-Goran Eriksson.
Nos
anos 70 o futebol sueco ainda bebia - e muito - da influência britânica,
sobretudo ao nível do estilo de jogo e da mentalidade, e a prova disso é que o
país estava "povoado" de técnicos britânicos, tendo alguns deles
feito um trabalho notável ao serviço dos clubes locais. Foram os casos de Roy
Hodgson (ao serviço do Halmstad, do Orebro ou do Malmo) e de Bob Houghton (que
em 79 levou pela primeira vez uma equipa nórdica, no caso o Malmo, a uma final
europeia, mais precisamente à final da Taça dos Campeões Europeus, onde seria
derrotado pelo Nottingham Forest).
Desfeito
o sonho de ser futebolista profissional, Eriksson iniciou a sua carreira de treinador
ao serviço do Degerfors, onde aos 29 anos de idade começou a beber da sabedoria
do seu mentor, Tord Grip. Começou como adjunto de Grip e com a saída deste para
a seleção nacional sueca o jovem Sven assumiu o barco do Degerfors onde
rapidamente atingiu o sucesso, guiando a modesta equipa da 2.ª à 1.ª divisão
sueca logo em ano de estreia.
Este
sucesso chamou à atenção do IFK Gotemburgo, clube histórico que decidiu romper
com a tradição de técnicos britânicos ao leme das equipas suecas e oferecer o
cargo de treinador da sua equipa a Eriksson, então com apenas 31 anos. Para
muitos foi uma decisão arriscada, tendo em conta que além de jovem era um
técnico ainda muito pouco conhecido na Suécia, mas o risco seria desfeito logo
na época de estreia com a conquista da primeira Taça da Suécia para o emblema
de Gotemburgo.
Mas a
glória suprema seria alcançada no ano de 1982. Ano memorável para Eriksson e
para o futebol sueco. Além da conquista da dobradinha (campeonato e taça) para
o IFK, sendo que o campeonato já não era conquistado por este emblema desde
1969, Sven chocou o futebol continental ao levar o clube de Gotemburgo à
vitória na Taça UEFA de 81/82.
Talento,
força e inteligência foram os ingredientes que Eriksson, um confesso admirador
do estilo britânico, aplicou naquele histórico conjunto, onde pontificavam
artistas como Glenn Stromberg (um filho de Gotemburgo), Torbjorn Nilsson, ou Dan
Corneliusson. Com muitos jogadores oriundos da sua formação, o IFK de Eriksson praticava
um futebol de pressão alta, concedendo pouco espaço aos seus opositores, além
de exibir uma disciplina férrea, ou não fosse Sven um obcecado pela disciplina
tática.
Os capitães de equipa antes da primeira mão da final da Taça UEFA de 1982 |
A
campanha europeia do IFK começou na Finlândia face a um fraco oponente, o Haka,
que seria facilmente despachado com dois triunfos (3-2 e 4-0). Seguiu-se uma
viagem à Áustria, onde o Sturm Graz foi um osso duro de roer para os suecos,
que garantiram a passagem de eliminatória por um golo de diferença (5-4 no
agregado dos dois jogos). Mais fácil foram as vitórias (3-1 e 1-0) sobre o
Dínamo de Bucareste na ronda seguinte que levaram o IFK até uns impensáveis
quartos-de-final da prova. Para muitos este era o limite para os
semi-profissionais suecos, que nesta eliminatória teriam pela frente o
experiente e favorito Valência. A eliminatória começou de forma conturbada
mesmo antes das equipas terem entrado em campo, pois uma crise interna no IFK
fez com que o clube não tivesse dinheiro para custear a viagem até Espanha.
Valeram os adeptos, que se juntaram e pagaram a deslocação do grupo liderado
por Eriksson. As bases populares do IFK estavam aqui bem visíveis com este
gesto. Tocados por esta atitude os suecos fizeram uma grande exibição no
Mestalla, alcançando um impensável empate a duas bolas. Seria contudo na
fortaleza de Ullevi, perante 50.000 adeptos em estado de loucura total pela
campanha que a sua equipa vinha fazendo, que o IFK logo aos 4 minutos fez
explodir de alegria as bancadas do mítico estádio ao marcar o primeiro golo do
jogo. A confirmação da vitória e da passagem às meias-finais aconteceu na
segunda metade, de penalty, e o Ullevi entrou em delírio absoluto. Nas
meias-finais o IFK enfrentava a força do futebol alemão, expressa no Kaiserslautern,
que havia deixado pelo caminho o Real Madrid. Após dois jogos muito equilibrados
só o prolongamento decidiu quem passava à final, tendo o talento, a força e a
inteligência do IFK levado a melhor.
Estava
igualado o feito do Malmo em 79, e pela segunda vez uma equipa sueca atingia
uma final europeia.
IFK Gotemburgo sobe ao céu no verão de 82 |
A
expectativa na cidade era enorme. A final seria ante outro gigante alemão, no
caso o Hamburgo, orientado pelo mestre da
tática Ernst Happel, sendo que o primeiro encontro da final seria no
Ullevi. Felix Magath, Groh, Lars Bastrup, ou Hrubesch eram algumas das pedras
principais da poderosa equipa alemã, que um ano mais tarde se consagraria
campeã da Europa.
Num
Estádio Ullevi lotado, o Hamburgo entrou estranhamente a defender, parecendo
satisfeito em levar para a segunda mão uma igualdade a zero bolas. Num relvado
extremamente pesado, devido à chuva intensa que nesse dia caiu sobre
Gotemburgo, o IFK tentava de todas as maneiras chegar à baliza de Stein,
persistência que daria frutos a três minutos do fim quando Holmgren marcou o
único golo do encontro para a turma da casa.
Aqui
estava o primeiro capítulo do Ullevi enquanto palco de grandes surpresas
internacionais no que a finais europeias dizia respeito.
Na
segunda mão uma multidão de 60.000 pessoas lotou o Volksparkstadion de Hamburgo na esperança de ver a equipa da casa
facilmente anular a desvantagem trazida da Suécia e ficar com a taça. Puro
engano. A primeira parte foi controlada em absoluto pelo IFK, de forma
inteligente, uma supremacia coroada com êxito logo aos 19 minutos quando Corneliusson
fez o 1-0. Se já estava difícil para os alemães mais ainda ficou após este
golo. Mas o baile de Eriksson não se ficou por aqui. Lançados no ataque os
alemães abriram muitos espaços na sua defesa na segunda metade, facto
aproveitado por Nilsson aos 62 minutos para fazer o 2-0. O Hamburgo estava de
cabeça perdida, e quatro minutos depois comete uma falta dentro de área que
rapidamente o árbitro inglês Courtney sancionou com o castigo máximo, o qual
seria aplicado por Fredriksson. 3-0 e as dúvidas estavam acabadas. O IFK
entrava para a história como a primeira equipa sueca a vencer uma competição
continental. A Europa começou a olhar então espantada para Gotemburgo e após
esse sucesso Eriksson rumou para outras paragens, tornando-se com o passar dos
anos num dos mais afamados e talentosos técnicos do futebol mundial. Com
Eriksson saíram outros craques daquele talentoso IFK, tal como Stromberg, mas a
aptidão pelas grandes vitórias manteve-se na cidade portuária da Suécia. Não só
a nível interno, onde o IFK continuou a colecionar títulos, mas sobretudo no
plano internacional, onde a equipa continuou a surpreender.
Final da Taça UEFA de 1987 |
Em 1986
os suecos trilharam uma caminhada quase triunfal na prova rainha da UEFA, a
Taça dos Campeões Europeus, caindo somente nas meias-finais ante o Barcelona
após o desempate nas grandes penalidades. Na época seguinte o IFK provou, se é
que ainda o tinha de fazer, que a vitória na Taça UEFA de 82 estaria longe de
ser um milagre, repetindo a glória nesta competição após um triunfo na final
sobre os escoceses do Dundee United. Pode
não ter sido um triunfo tão surpreendente quanto o de 82, mas mesmo assim não
deixou de ser marcante, sobretudo quando nos quartos-de-final a equipa então
orientada pela velha raposa Giovani Trapattoni e que tinha como grande estrela
o alemão Karl-Heinz Rummenigge.
Contam-se
pelos dedos de uma só mão as ocasiões em que o gigante Real Madrid perdeu uma
final europeia. Foram precisamente cinco as vezes em que os merengues claudicaram no jogo de todas
as decisões numa prova da UEFA, e uma delas foi provavelmente umas das maiores
surpresas da história do futebol internacional. E não deixa de ser curioso que
tenha acontecido numa outra noite chuvosa de Gotemburgo apenas um ano depois do
IFK ali ter dado o primeiro passo rumo à conquista da Taça UEFA de 1982.
No dia
11 de maio de 1983 a Europa assistiu de boca
aberta a mais um capítulo da fábula "David vs Golias" em que o
pequeno David derrota o gigante Golias. E em 83 o papel de David foi
interpretado pelo praticamente desconhecido Aberdeen Football Club, liderado
pelo até então não menos conhecido no plano internacional Alex Ferguson.
Alex Ferguson nos tempos do Aberdeen |
Este
antigo futebolista nascido em Glasgow e que brilhou na década de 60, tendo sido
o melhor marcador da liga escocesa em 66 ao serviço do Dunfermline Athletic,
facto que no ano seguinte fez o Rangers perder a cabeça e pagar uma pipa de massa pela sua contratação, a
qual viria a tornar-se um fiasco, iniciou, tal como Eriksson, a sua carreira de
treinador relativamente jovem, com 32 anos.
Após
passagens pelo East Stirlingshire e pelo St. Mirren ele chega a Aberdeen aos 36
anos, em junho de 78. Desde 1955 que o clube não ganhava um título, vivendo de
lá para cá na sombra dos gigantes de Glasgow (Celtic e Rangers). A chegada a Pittodrie
(a casa do Aberdeen) não foi pacífica, sobretudo porque no clube atuavam
jogadores mais velhos que o próprio Ferguson e que não viam com bons olhos um
rapaz de Glasgow dar-lhes ordens.
Contudo,
a reputação de Alex enquanto disciplinador autoritário rapidamente esfriou as
intenções dos jogadores mais velhos do Aberdeen, que rapidamente se renderam a
ele. Os primeiros sinais de sucesso chegaram em 1980, quando os Dons (alcunha do Aberdeen) interromperam
o reinado de 15 anos consecutivos do Rangers e do Celtic na liga escocesa,
vencendo assim o segundo campeonato da história do clube do norte da Escócia.
Sob a liderança de Ferguson o Aberdeen viveu a fase mais gloriosa da sua
existência, alcançando em 1984 e 1985 mais dois títulos de campeão nacional aos
quais juntou três vitórias consecutivas na Taça da Escócia (82, 83 e 84) e uma
Taça da Liga (86). Mas a glória suprema do reinado de Ferguson no Pittodrie
aconteceu então na noite chuvosa de 11 de maio de 63, em Gotemburgo, quando o
modesto Aberdeen defrontou o poderoso Real Madrid na final da Taça dos Vencedores das Taças.
Primeira glória europeia de Fergie ao serviço do modesto Aberdeen |
A
caminhada triunfal começou na Suíça, numa ronda pré-eliminar, tendo os
escoceses despachado com facilidade o Sion por um total (no conjunto das duas
mãos) de 11-1. Nas duas rondas seguintes foi a vez do Dínamo de Tirana e do Lech
Poznan caírem aos pés dos pupilos de Fergie
(como ficaria conhecido anos mais tarde). O primeiro grande obstáculo vinha da
Baviera e dava pelo nome de Bayern de Munique. E quem pensava num atropelamento
na primeira mão na Alemanha enganou-se redondamente. O encontro terminou
empatado a zero, e se para a maioria dos escoceses este era um resultado
estupendo, para Ferguson o nulo havia sido um péssimo resultado, pois a sua
equipa havia... vulgarizado o colosso Bayern. E queixou-se de alguma falta de
sorte para justificar as duas bolas enviadas ao poste dos germânicos.
Na
segunda mão, disputada nas Terras Altas da Escócia, a teoria esteve quase a
confirmar-se, isto é, que o Bayern era favorito a passar a eliminatória,
sobretudo depois do golo de Augenthaler logo aos 10 minutos. O jogo esteve
frenético a partir de então, e ainda antes do descanso Neil Simpson fez o
empate. No reatamento o Bayern voltou a agigantar-se e Pflugler fez o 2-1 que
parecia sentenciar a eliminatória e acabar com o sonho dos Dons. Mas o que se seguiu foram talvez os 30 minutos mais soberbos
da história do futebol escocês. Uma cavalgada impressionante do Aberdeen
destruiu por completo o conjunto germânico que saiu do Pittodrie vergado a uma
derrota por 3-2. Os Dons estavam nas
meias finais, onde viriam a derrotar com relativa facilidade os belgas do Waterschei
Thor por um total de 5-2 nas duas mãos. A impensável final de Gotemburgo era
agora uma realidade.
Lance da final de 83 no Ullevi |
Na
gélida Suécia o conjunto de Fergie
tinha pela frente o colosso mundial Real Madrid, orientado pela sua maior
lenda, Alfredo Di Stéfano, que tinha à sua disposição um leque de notáveis
artistas como Santillana, Camacho, Stielike, Metdgod, Del Bosque, ou Juanito.
Em suma, gente mais do que suficiente para conquistar a taça. Cerca de 14.000
adeptos do Aberdeen perderam a cabeça e deixaram tudo para trás para acompanhar
o seu modesto clube nesta aventura europeia. Fretaram-se aviões, alguns fans fizeram a longa viagem de barco até
aos mares da Escandinávia ao longo de dois dias. Assim que chegaram a
Gotemburgo o clima era-lhes familiar: chovia copiosamente e isso favorecia o
estilo de jogo britânico do Aberdeen em detrimento do estilo mais tecnicista e
latino dos madrilenos.
Fergie preparou a equipa de forma meticulosa,
incutiu em cada jogador um espírito indomável, uma vontade férrea de vencer,
como anos mais tarde disse um dos jogadores chave daquela equipa, Gordon
Strachan: «Se pudéssemos transformar toda a energia que ele nos passou antes
desse jogo em eletricidade, poderíamos alimentar todo o norte da Escócia!».
Ferguson
era já na altura um especialista em mind
games, no chamado jogo psicológico, tendo antes da final passado a mensagem
de que para o Aberdeen estar ali, naquele jogo, já era uma grande vitória,
dando a entender com isto ao Real Madrid que os escoceses iriam quase que fazer
figura de corpo presente e assistir ao triunfo do colosso madrileno. Os
espanhóis morderam o isco, sentiram-se importantes, superiores, e assim que a
bola começou a rolar no relvado encharcado do Ullevi o que se viu foi um
festival dado pelo Aberdeen.
Aberdeen alcança a glória em Gotemburgo |
Logo
aos 7 minutos Eric Black traduziu em golo a superioridade dos escoceses,
batendo um desamparado Augustín. Porém, o estado difícil do terreno também
traiu os rapazes do norte da Escócia, e um passe mal calculado de Alex McLeish
para o guardião Jim Leighton deu origem a uma grande penalidade a favor dos
madrilenos, a qual seria convertia por Juanito, ao minuto 15. No segundo tempo
o Aberdeen dispôs das melhores oportunidades para marcar, mas teimosamente o
marcador não se iria alterar até aos 90 minutos, pelo que se teve de jogar mais
30 minutos de prolongamento. Mas aqui veio ao de cima a criatividade tática de Fergie, que ao colocar John Hewitt em
campo trocou por completo as voltas ao Real Madrid, tendo este suplente sido o
autor do 2-1 que conferiu o título mais importante da história do clube
escocês.
Quanto
a Ferguson, após ter sido do Pittodrie assinou pelo Manchester United, onde...
fez a história que sobejamente se conhece e que o iria tornar em Sir Alex
Ferguson.
Sampdoria vence no Ullevi o seu único troféu internacional |
Apesar
de ter o condão de transformar Golias em heróis o Ullevi serviu também para
confirmar o poderio de escolas, ou correntes, futebolísticas. Foi o caso da
escola italiana, cujo campeonato nacional nos anos 80 e 90 era tão só o mais
mediático a nível mundial. Os grandes astros do futebol atuavam todos em
Itália, e como consequência disso os emblemas transalpinos venceram 15 troféus
europeus nestas duas décadas de supremacia, para além de terem chegado a muitas
outras finais continentais.
E em
1990 fizeram algo que nunca nenhum outro país conseguiu até hoje, que foi fazer
o pleno de vitórias nas três competições europeias, isto é, vencer na mesma
temporada a Taça dos Campeões Europeus, a Taça UEFA e a Taça das Taças. A
primeira foi conquistada pelo super Milan liderada pelo trio holandês composto
por Gullit, Van Basten e Rijkaard, ao
passo que a segunda também viajou para Milão, mas pelas mãos do Inter dos
alemães Klinsmann, Brehme e Matthaus. A terceira foi conquistada pela Sampdoria,
cujo ponto forte estava no eu ataque, o qual era composto pela dupla Roberto
Mancini e Gianluca Vialli que em Gotemburgo foram preponderantes em ajudar a Samp a conquistar (ao Anderlecht) o seu
único troféu internacional até à data.
Vikings provocam em Gotemburgo a maior surpresa da História
Dinamarqueses festejam o conto de fadas no verão de 92 |
Mas
quiçá a maior surpresa da história do futebol europeu - e porque não dizê-lo a
nível Mundial - aconteceu dois anos depois da Samp ter erguido nos céus de Gotemburgo a Taça das Taças. Utopia,
simples palavra que servirá - ainda hoje - para descrever esta surpresa que
alude a um triunfo que se equipara a um conto de fadas, altamente improvável de
transpor as fronteiras da realidade e que ainda hoje causa uma certa estranheza
de perceber como é que uma equipa chamada à última da hora, para substituir
outra, conseguiu conjungar os verbos chegar, ver, e vencer de uma forma tão
nítida num certame de grau de dificuldade tão elevado como é o caso do Campeonato da Europa!
Estas
são algumas palavras que ajudam a descrever a vitória da Dinamarca no Euro 92,
disputado em solo sueco, e que teve em Gotemburgo a grande final. Ou melhor, a
grande surpresa.
Dinamarca
que na verdade nem se qualificou para este Europeu, mas o facto de a Jugoslávia
estar então a braços com uma guerra abriu as portas do Euro aos vikings, que desta forma à última da
hora fizeram as malas e embarcaram para a vizinha Suécia. Reza a lenda que a
maior parte dos jogadores dinamarqueses gozava já o merecido período de férias
nas tórridas praias do sul da Europa, entre eles a grande estrela daquela
seleção, Michael Laudrup, que quando convocado - à última da hora - pelo
selecionador Richard Moller-Nielsen preferiu... continuar a apanhar sol ao
invés de calçar as chuteiras numa prova em que o próprio - e não só - achava
que o seu país não ia fazer mais do que corpo presente. Na verdade, não só
Laudrup era desta opinião, todos os críticos e conhecedores da modalidade
estavam cientes de que pelo seu curto tempo de preparação a seleção escandinava
pouco mais podia fazer do que evitar sair goleada dos 3 jogos que iria fazer no
grupo 1 da fase final. Como estavam enganados.
E na
estreia a Dinamarca contrariou desde logo essa previsão, impondo um empate a
zero a Gary Lineker e companhia, isto é, à seleção de Inglaterra, que dois anos
antes havia alcançado um brilhante 4º lugar no Mundial de Itália. Um pobre 0-0,
na realidade, resultado de um paupérrimo jogo de futebol, mas que na verdade
rasgou sorrisos de felicidade entre os até há poucos dias atrás veraneantes vikings.
Seguiu-se
o duelo nórdico, entre Dinamarca e Suécia, sendo que os primeiros mesmo não
fazendo um mau jogo, contrariamente ao que haviam feito dias antes ante a
Inglaterra, não conseguiram contrariar a avalanche ofensiva sueca, liderada por
Limpar, Dahlin, e Brolin, cabendo a esta último o papel de herói dessa célebre
noite, depois de apontar (aos 58 minutos) o único golo da partida. Porém,
chamando a si o espírito da Danish
Dynamite dos anos 80 os dinamarqueses protagonizaram no dia 17 de junho de
92 a primeira grande surpresa daquele Euro, quando em Malmo derrotaram (2-1) e
eliminaram a favorita França de Eric Cantona, Boli, Manuel Amoros, Casoni,
Fernandez, ou do goleador Papin. Acontecesse o que acontecesse dali em diante a
Dinamarca já tinha feito muito mais do que era esperado.
A taça é nossa! Quem imaginava esta imagem? |
E de
novo o Ullevi de Gotemburgo voltou a ser palco de um verdadeiro conto de fadas
na semi-final do Euro 92. Pela frente os dinamarqueses tinham os detentores do
ceptro europeu, a Holanda, que não só pela sua condição de detentor do título
mas sobretudo pelo futebol espetáculo apresentado na fase de grupos poucos
imaginavam que não voltaria a erguer o troféu. Pelo que a Dinamarca era apenas
uma mera formalidade para cumprir com maior ou menor dificuldade. Aliás, na véspera
do jogo o defesa holandês Ronald Koeman adiantava à imprensa que já sonhava com
a final e com... as férias do Algarve! Como muitas das vezes acontece o excesso
de confiança paga-se bem caro, e os mestres holandeses pagaram-no,
efetivamente. Os nórdicos colocaram-se em vantagem bem cedo (5 minutos) por
intermédio de Henrik Larsen, que naquela tarde de 22 de junho viveria na relva
do Ullevi o grande momento da sua carreira, como mais à frente iremos perceber.
Bergkamp ainda empatou para a Holanda, aos 23 minutos, mas os vikings queriam
fazer história, queriam continuar a sua - inesperada - aventura, e à passagem
do minuto 32 Henrik Larsen voltou a colocar em delírio os apoiantes
dinamarqueses. Naquele instante ninguém no Reino da Dinamarca se lembrava de...
Michael Laudrup. Larsen, Lars Olsen, Kim Vilfort, Povlsen, Peter Schmeichel, ou
o mais novo dos Laudrup (Brian) eram mais do que suficientes para trazer
alegria à nação escandinava. O guarda-redes Schmeichel fez mesmo uma das
melhores exibições da sua gloriosa carreira, travando com defesas espetaculares
e seguras a avalanche holandesa que ia subindo de intensidade à medida que o
relógio ia avançando. Porém, aos 85 minutos, Schmeichel foi incapaz de travar o
remate certeiro de Frank Rijkaard, que desta forma colocava tudo na estaca
zero. A Dinamarca tinha já superado o pior, mas ainda assim poucos acreditavam
que a Holanda não acabasse por demonstrar a sua superioridade no prolongamento.
Não mostrou, na verdade, e o jogo foi decidido nas grandes penalidades, onde um
desinspirado Marco Van Basten - fez um Euro 92 muito abaixo das suas
potencialidades - viu o seu penalty ser travado pelo bravo Schmeichel, que
pouco depois via o seu companheiro Christofte levar a Dinamarca para a final do
Campeonato da Europa! Impensável, não nos cansamos de repetir. E tudo o que
acontecesse depois daquela noite não teria importância, pois quer vencessem ou
não a final os dinamarqueses já eram os grandes heróis deste Euro 92.
E como
não tinham mesmo nada a perder o conto de fadas conheceu um final deslumbrante!
Uma imagem do Ullevi atual, o palco onde nasceram Deuses e onde aconteceram grandes surpresas |
Estádio
Ullevi, dia 26 de junho, para a Alemanha poderia ser mais um jogo rumo a mais
um título, para a Dinamarca era o jogo de uma vida, o momento mais sublime da
sua história desportiva. Cedo os alemães quiseram ver a questão resolvida, mas
os nórdicos mostravam que já que haviam sido convidados para participar na
festa não queriam sair dali sem se divertirem. E alegria foi o que John Faxe
Jensen terá sentido ao minuto 18 quando na sequência de um remate à entrada da área
coloca a Dinamarca em vantagem! Os Deuses (do futebol) estavam definitivamente
loucos. Os alemães continuaram no entanto a dominar, massacrar será mesmo a
palavra exata. Mas aquela não era a sua noite, era a noite de uns mágicos vikings que já perto do final da
contenda deram o golpe final por intermédio de Kim Vilfort. 2-0, os veraneantes
dinamarqueses podiam finalmente gozar as suas merecidas férias, mas agora
ostentando o pomposo título de CAMPEÕES DA EUROPA, e o Mundo ficava pasmado, de
olhos postos em Gotemburgo, uma cidade que futebolisticamente falando viu
nascer Deuses como Pelé, Garrincha, Sven Goran Eriksson, Alex Ferguson, ou
Peter Schmeichel, mas também testemunhou alguns dos mais belos contos de fada
do Planeta da Bola, como esta final
do Euro 92.
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