Jaguaré |
O "Garrincha das Metas" a atuar em terrenos do campo que não o seu |
Ídolo vascaíno
Equipa do Vasco da Gama que conquistou o título de campeão estadual do Rio de Janeiro em 1929 |
Jaguaré na seleção |
A veia artística de Jaguaré não passa despercebida aos responsáveis pela seleção brasileira, sendo que entre 1928 e 1929 o goleiro é chamado por três ocasiões ao escrete - que ainda não era canarinho - para a disputa de partidas amigáveis ante as equipas do Motherwell (Escócia), do Barracas (Argentina), e do Rampla Juniors (Uruguai). Em 1931 a vida do guarda-redes que adorava desafiar os avançados contrários com saídas aventureiras da sua zona de ação conhece um novo capítulo. O Vasco da Gama promove uma digressão da sua equipa principal até Portugal e Espanha, países cuja interpretação do futebol deixou Jaguaré maravilhado. O goleiro mostrou-se fascinado com os modos cavalheirescos e profissionais com que o belo jogo era tratado no Velho Continente, em contraste com o rude amadorismo como era vivido no seu país. Face a esse fascínio Jaguaré e o seu colega de equipa Fausto não fizeram a viagem de regresso ao Brasil, forçando, em Espanha, a saída imediata do Vasco da Gama, para em seguida firmar contrato com o Barcelona. Ligação que seria histórica, já que desta forma Jaguaré e Fausto tornavam-se nos primeiros futebolistas brasileiros a jogar - profissionalmente - na Europa.
Catalães não acharam muita graça às molecagens de Jaguaré
Jaguaré e Fausto, os primeiros brasileiros a jogar no estrangeiro |
Nova travessia no Atlântico: rumo a Lisboa
Jaguaré com as cores do Sporting frente grande rival Benfica |
Jaguaré não ficou perturbado pela experiência menos positiva de Barcelona, e em 1935 atravessa de novo o Atlântico rumo a Lisboa, desta feita para defender as cores do Sporting. À semelhança do ocorrido na Catalunha também a estadia do brasileiro em solo luso foi curta, mas ao que se sabe um pouco mais feliz em relação à primeira experiência. Jaguaré fez, de certa forma, história no futebol português, desde logo por ter sido o primeiro guarda-redes a usar luvas, tal como havia acontecido no Brasil. Entre novembro de 1935 e abril de 1936 o excêntrico jogador defendeu por sete ocasiões a baliza leonina, tendo vencido seis jogos e perdido apenas um - para o rival Benfica. Tal como no Brasil e em Espanha o estilo brincalhão e provocador que Jaguaré exibia em campo causou algum impacto em Portugal. Certo dia, num embate contra o Benfica, Jaguaré cuspiu na bola antes do benfiquista Aníbal José partir para a conversão de uma grande penalidade. Desconhecendo-se se com algum nojo ou não por tal atitude o que é certo é que Anibal José atirou o esférico por cima da baliza. O árbitro mandou repetir o lance, e Jaguaré voltou a cuspir na bichinha, como ele gostava de chamar a sua companheira das brincadeiras, e mais uma vez o jogador do Benfica voltou a falhar o pénalti. Reza ainda a lenda que num outro encontro, desta feita ante a Académica, Jaguaré sai a correr da baliza para travar um ataque contrário, sendo que posteriormente na posse da bola sai ele próprio a jogar em contra-ataque perante o espanto de colegas, adversários, e do próprio público. Como já foi referido a estadia do brasileiro em Lisboa durou apenas seis meses, muito por culpa de um jovem de 20 anos chamado Azevedo, figura esta que ao agarrar a titularidade da baliza sportinguista iniciava um trajeto que o haveria de o levar até ao Olimpo dos Deuses do futebol português. Mesmo tapado por aquele que viria a ser caracterizado como um dos melhores guardiões lusos de todos os tempos, Jaguaré enriqueceu ao serviço do Sporting o seu currículo desportivo, na sequência da conquista do título de campeão de Lisboa de 35/36.
O pénalti da fama em França
Equipa do Olympique de Marseille campeã de França em 1937 |
Deixando para trás a capital portuguesa Jaguaré rumou para a edílica região do sul de França, para representar o Olympique de Marseille (OM), onde se tornou ídolo. As suas excêntricas exibições ao serviço dos marselheses atraíram até si as luzes da ribalta, a fama que tanto buscou em Espanha e em Portugal e nunca alcançou. No Marselha foi peça fundamental para a conquista de títulos que ainda hoje se destacam no vasto currículo do emblema marselhês muito por culpa das brincadeiras que Le Jaguar - como a imprensa gaulesa o iria apelidar - efetuava em campo. Reza a lenda que em França a excentricidade de Jaguaré atingiu contornos vincados: danças com a bola nos pés em frente aos adversários, defesas com pontapés de bicicleta - terá sido nele que Higuita se inspirou para edificar a sua famosa defesa escorpião? - provocações constantes a adversários que os levavam à profunda irritação, e goleador. É verdade, goleador. Jaguaré foi o primeiro guarda-redes a converter grandes penalidades, facto ocorrido na final da Taça de França de 1938, a qual colocou frente a frente o OM e o Metz. Lance imortalizado da seguinte forma pela revista Sport Ilustrado na edição de 22 de junho de 1938: «Aos 22 minutos, Laurent, do Metz, fez um penalty. Com supresa de todos os assistentes, Jaguaré abandonou o seu posto e encaminhou-se para o goal adversário. Jaguaré collocou-se diante da bola, e quando o árbitro apitou, bateu o penalty. Ouviu-se uma exclamação da assistência. Jaguaré enviou a bola a um canto e marcou o goal de empate. Foi um lance sensacional. Um arqueiro fazer um goal contra o adversário! Em nossa capital, jamais houve um caso, em partida official, de um arqueiro executar um penalty».
Final onde a excentricidade do brasileiro iria mais além ao defender uma grande penalidade com um salto impressionante, onde mais parecia um... jaguar a agarrar a sua presa.
Jaguaré atuando pelo Corinthians disputa uma bola com o astro do futebol brasileiro da época: Arthur Friendenreich |
Uma rara fotografia de Jaguaré aquando da sua passagem pelo Académico do Porto |
Ao ler isto, essa faceta transporta ao antigo exemplo de Barrigana, o Mãos de Ferro. Senhor de carácter, que não tinha medo de nada. Destemido em dose, a pontos de passados tantos anos, já quase nem havendo quem o tivesse visto jogar, continua lendário na transmissão popular. Chegando Lobo Antunes, o escritor também meio louco mas de lucidez descritiva, embora não sendo adepto ferrenho de futebol e até sendo mais virado a sul... a ter escrito que gostava de ter sido Barrigana...
ResponderExcluirAP
Memória Portista
Casualmente entrei no Museu Virtual do Futebol, através da amiga Carla Alexandra. Ainda bem.
ResponderExcluirFiquei a saber que antes do grande g.redes Azevedo que defendeu no meu SCP, também lá esteve Jaguaré.
Mais surpreendido fiquei com a sua passagem pelo também meu Leça F.C.
Posteriormente, também defenderam as cores do Leça, pai e filho, Jaguaré, que, penso não terem qualquer afinidade familiar com o craque brasileiro, ou será que tinham?